As Dez Perfeições (Paramis)
Um Guia de Estudo compilado por Michael Beisert
Índice:
Origem das Perfeições (Paramis)
Nos primeiros séculos depois da morte do Buda, quando o Budismo se tornou uma religião popular, foi formalizada a idéia de que havia três caminhos para a iluminação, dos quais se poderia escolher: o caminho para a iluminação como um discípulo do Buda, (savaka), o caminho para a iluminação como um Buda “silencioso,” (pacceka-buddha), isto é, alguém que realiza a iluminação por si próprio, mas que não é capaz de ensinar o caminho da prática para os outros; e o caminho para a iluminação como um Buda perfeitamente iluminado, (samma sambuddho). De acordo com a definição desses caminhos, eles se constituem de perfeições, (paramis), de caráter, mas ainda existiam dúvidas com relação a quais perfeições seriam essas e como cada caminho diferiria um do outro. O Theravada, por exemplo, definiu dez perfeições e organizou a coleção do Jataka de tal modo que ela culminasse em dez histórias, cada uma ilustrando uma das perfeições. O Sarvastivada, por outro lado, definiu seis perfeições e assim organizou a sua coleção do Jataka.
Todos os Budistas concordavam que o terceiro caminho era muito mais longo, mas havia discordâncias quanto ao desenvolvimento das perfeições ao longo dos distintos caminhos, isto é, se elas seriam ou não quantitativamente ou qualitativamente diferentes. Em outras palavras, um Buda desenvolveria mais perfeições do mesmo tipo das de um arahant, ou ele desenvolveria perfeições de um tipo radicalmente diferente? Aqueles que acreditavam que as perfeições diferiam apenas quantitativamente puderam tomar os cânones Budistas mais antigos como seu guia para se tornarem um Buda, pois eles podiam simplesmente extrapolar as perfeições do caminho do arahant, seguindo basicamente o que estava descrito nesses cânones. No entanto, aqueles que buscavam se tornar um Buda, mas que acreditavam que as perfeições diferiam qualitativamente, tinham de fazer uma investigação fora dos cânones. As pessoas deste último grupo com freqüência praticavam uma forma de meditação que objetivava induzir visões de bodisatvas que praticavam o caminho para se tornar um Buda, juntamente com Budas de outros sistemas cósmicos. Esses Budas e Bodisatvas – esperava-se – iriam proporcionar informação privilegiada sobre o caminho completo para se tornar um Buda. Os ensinamentos que resultaram dessas visões foram bastante diversos. Mas só no século III da era Cristã, com o desenvolvimento da escola Yogacara, é que um esforço concentrado foi feito para compilar todos esses vários ensinamentos num corpo único – aquilo que agora conhecemos como o movimento Mahayana — porém as diferenças entre esses ensinamentos era tão grande que o Mahayana nunca alcançou uma verdadeira unidade.
Portanto, sob a perspectiva histórica, existem dois modos principais de seguir o caminho para se tornar um Buda: o que segue a orientação obtida nos cânones mais antigos, e aquele que segue as tradições desenvolvidas a partir das experiências de visionários do início da era Cristã. Os textos neste guia de estudo adotam a primeira abordagem.
Segundo um mal-entendido comum, a escola Theravada só ensina o caminho de um discípulo, (savaka), do Buda, mas uma rápida revisão da história do Theravada irá mostrar que muitos Theravadins tomaram os votos de bodisatva e adotaram a prática das dez perfeições descritas no Jataka. Como, para os arahants, essas perfeições diferem apenas em relação à quantidade, os Theravadins, que aspiram à condição de arahants, vêem essas perfeições como qualidades a serem desenvolvidas como parte da sua prática fora da meditação formal. Por exemplo, eles fazem donativos para desenvolver a perfeição da generosidade, participam de projetos habitacionais para desenvolver a perfeição da energia, e assim por diante.
Para aqueles que, no mundo moderno, se debatem com a questão de como praticar o Dhamma na vida diária, as perfeições proporcionam um modelo útil para o desenvolvimento de uma atitude proveitosa em relação às atividades rotineiras. De modo que, qualquer relacionamento ou atividade realizada de maneira sábia, cujo propósito principal seja o desenvolvimento das perfeições de um modo equilibrado, passa a fazer parte do caminho do Dhamma.
As perfeições também oferecem um dos poucos métodos confiáveis de medir as realizações na nossa vida. As “realizações” no âmbito dos relacionamentos e do trabalho tendem a se transformar em pó, mas as perfeições de caráter, uma vez desenvolvidas, são confiáveis e duradouras e nos conduzem para além das vicissitudes da vida diária. Por conseguinte, elas merecem receber alta prioridade na maneira como planejamos as nossas vidas. Esses dois fatos estão refletidos nas duas etimologias da palavra perfeição, (parami): elas nos atravessam para a outra margem, (param)[1];e elas são de importância primordial, (parama), na formulação do nosso propósito de vida.
Ajaan Thanissaro
O tema da Generosidade também está disponível em áudio
Sabemos que a segunda Nobre Verdade define a origem do sofrimento como cobiça e apego, o desejo desenfreado. Por causa disso, uma das principais práticas do Dhamma é chamada de Dana. Dana significa a prática da generosidade ou o ato de compartir com os outros. É um antídoto contra o apego, a esse agarrar-se com desespero às coisas, ao apego desmedido às nossas coisas. Encontramos essa cobiça e apego em todos os lugares. Agarramo-nos às nossas posses e não queremos nos soltar delas. O problema é que, quanto mais possuirmos, maior será o fardo. A prática da generosidade pode ser de grande ajuda, pois ela é um antídoto contra a mesquinharia. Além disso, o ato de compartilhar as nosas posses com os outros, ou o abandono do nosso egoísmo, ajuda a abrir as nossas mentes para o amor bondade e a compaixão. E estes são um antídoto contra o apego e o desejo.
A generosidade possui formas distintas. Pode-se dizer que existem três níveis de generosidade. O primeiro se chama dar com u’a mão. Com esse tipo de generosidade você dá porque as pessoas pedem ou porque você é pressionado a fazê-lo, ou ainda porque as pessoas estão olhando. Mas você continua segurando com u’a mão. Você, na verdade não quer dar e assim o faz com relutância. Digamos que um mendigo o importune. Para livrar-se dele, você lhe dá algo. Se você já esteve na Índia, provavelmente enfrentou situações em que os mendigos o seguem como uma sombra e não o abandonam até que finalmente você lhes dê algo. Essa é uma forma de generosidade, de compartir com os outros. Mas ela possui um valor limitado, porque o verdadeiro espírito imbuído no ato de dar é de realmente se soltar do que é doado, abandonar as coisas. Esse tipo de generosidade é abandono até certo ponto, e portanto, incompleto.
O segundo nível de generosidade é dar amistosamente. Quer dizer, você dá porque gosta de dar. Você se sente bem. Não é necessário pressão para que você o faça. Sempre que você vê alguém numa situação de necessidade, se você tem o suficiente para si mesmo, e possui o objeto da doação em dobro, você o dá com um sentimento de amizade. Se você tem duas bananas e alguém está com fome, você habitualmente dará uma. Essa é uma forma mais elevada de generosidade porque você não é pressionado a fazê-la - ela vem do seu próprio sentimento de amizade e você não está desesperado e firmemente agarrado às coisas.
O terceiro nível de generosidade é dar como um rei. Ao dar como um rei, você dá qualquer coisa em qualquer momento. Você dá a sua camisa. Você dá o seu último alimento para alguém que esteja com mais fome. Como não existe o pensamento precedendo a ação, você dá o melhor que tiver. Não existe nenhum apego, nem mesmo a idéia de um "eu" envolvido no ato generoso.
Bhante Yogavacara Rahula
[ Generosidade: Praticando o Dhamma no dia a dia]
“Certa
vez, Ananda, neste lugar havia uma cidade com um próspero e movimentado mercado
chamada Vebhalinga, com muitos habitantes e repleta de gente. Agora o Abençoado
Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, vivia próximo a Vebhalinga. Foi aqui,
na verdade, que o Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, tinha o
seu monastério, foi aqui, de fato, que o Abençoado Kassapa, um arahant,
perfeitamente iluminado, residia e orientava a Sangha dos bhikkhus.”
“Em Vebhalinga o Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, tinha como patrocinador, como seu principal patrocinador, um oleiro chamado Ghatikara.
“Agora,
o Rei Kiki de Kasi ouviu: ‘Parece que o Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, chegou em Benares e está no Parque do Gamo em
Isipatana.’ Assim ele mandou preparar um grande número de carruagens reais e
montando numa delas saiu de Benares com toda a pompa da realeza para ir ver
o Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado. Ele foi até onde a estrada permitia o acesso das
carruagens e depois desmontou da sua carruagem e seguiu a pé até onde estava o
Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado. Depois de cumprimentá-lo,
ele sentou a um lado e o Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado,
instruiu, motivou, estimulou e encorajou o Rei Kiki de Kasi com um discurso do
Dhamma.
“Com a
conclusão do discurso, o Rei Kiki de Kasi disse: ‘Venerável senhor, que o
Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, junto com a Sangha dos
bhikkhus concorde em aceitar a refeição de amanhã.’ O Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, concordou em silêncio. Então, sabendo que o Abençoado
Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, havia concordado, ele se levantou do
seu assento e depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita,
partiu.
Então,
quando a noite terminou, o Rei Kiki de Kasi fez com que fossem preparados vários
tipos de boa comida na sua própria residência – com arroz de primeira e muitos
tipos de molhos e de caril - e ele fez com que a hora fosse anunciada
para o Abençoado: ‘É hora, venerável
senhor, a refeição está pronta.’
“Então,
ao amanhecer, o Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, se vestiu e
tomando a sua tigela e o manto externo foi junto com a Sangha dos bhikkhus até
a residência do Rei Kiki de Kasi e sentou num assento que havia sido preparado.
Então, com as suas próprias mãos, o Rei Kiki de Kasi serviu e satisfez a Sangha
dos bhikkhus liderada pelo Buda com os vários tipos de alimentos. Quando o
Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado havia terminado de comer e
removeu a mão da sua tigela, o Rei Kiki de Kasi tomou um assento mais baixo e
disse para o Abençoado: ‘Venerável senhor, que o Abençoado aceite uma
residência minha para o retiro das chuvas em Benares; isso será benéfico para a
Sangha.’ – ‘Já basta, rei, minha residência para o retiro das chuvas já foi dada.’
“Uma
segunda e uma terceira vez o Rei Kiki de Kasi disse: ‘Venerável senhor, que o
Abençoado aceite uma residência minha para o retiro das chuvas em Benares; isso
será benéfico para a Sangha.’ – ‘Já basta, rei, minha residência para o retiro
das chuvas já foi dada.’
“O rei
pensou: ‘O Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado,
não aceita a residência que ofereço para o retiro das
chuvas em Benares,’ e ficou muito desapontado e triste.
“Então,
ele disse: ‘Venerável senhor, você tem um patrocinador melhor do que eu?’
“Eu
tenho, grande rei. Há uma cidade chamada Vebhalinga onde vive um oleiro chamado
Ghatikara. Ele é o meu patrocinador, meu principal patrocinador. Agora,
grande rei, você pensou: ‘O Abençoado
Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, não aceita a residência que ofereço
para o retiro das chuvas em Benares,’ e você está muito desapontado e triste,
mas o oleiro Ghatikara não é assim e não será assim. O oleiro Ghatikara buscou
refúgio no Buda, no Dhamma e na Sangha. Ele se abstém de matar seres vivos, de
tomar aquilo que não é dado, da conduta imprópria em relação aos prazeres
sensuais, da linguagem mentirosa, do vinho, álcool e outros embriagantes que
causam a negligência. Ele tem perfeita confiança no Buda, no Dhamma e na
Sangha e possui as virtudes apreciadas
pelos nobres. Ele está livre da dúvida com relação ao sofrimento, à origem do
sofrimento, à cessação do sofrimento e ao caminho que conduz à cessação do
sofrimento. Ele come apenas numa parte do dia, ele observa o celibato, ele é
virtuoso, de bom caráter. Ele deixou de lado as pedras preciosas e o ouro,
abandonou as pedras preciosas e o ouro, ele desistiu das pedras preciosas e do
ouro. Ele não cava o chão em busca de argila usando uma picareta com as
próprias mãos; a argila que sobra dos aterros ou aquela que foi deixada pelos
ratos, ele traz para casa num carrinho; ao terminar um pote ele diz: ‘Que
qualquer um que aprecie esses potes deixe um pouco de arroz ou feijão, ou lentilha,
e que leve o que lhe agradar,’ Ele
sustenta os seus pais cegos e envelhecidos. Tendo destruído os cinco primeiros
grilhões, ele é um daqueles que irá renascer espontaneamente [nas Moradas
Puras] e lá realizará o parinibbana sem nunca mais retornar daquele mundo.
“Em
certa ocasião, quando eu estava em Vebhalinga, pela manhã, me vesti e,
tomando a minha tigela e o manto externo, fui até os pais do oleiro Ghatikara e
perguntei: ‘Por favor, onde foi o oleiro?’ – ‘Venerável senhor, o seu
patrocinador saiu; mas tire arroz do caldeirão e molho da caçarola e coma.’
“Eu assim
fiz e fui embora. Então, o oleiro Ghatikara foi até os pais dele e perguntou:
‘Quem tirou arroz do caldeirão e molho da caçarola, comeu, e foi embora?’ –
‘Meu querido, o Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado.’
“Então, o
oleiro Ghatikara pensou: ‘É um ganho para mim, é um grande ganho para mim, que o
Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, conte comigo assim!’ E o
êxtase e a felicidade nunca o abandonaram durante quinze dias e os pais dele
por uma semana.
“Em
outra ocasião, quando eu estava em Vebhalinga, pela manhã, me vesti e,
tomando a minha tigela e o manto externo, fui até os pais do oleiro Ghatikara e
perguntei a eles: ‘Por favor, onde foi o oleiro?’ – ‘Venerável senhor, o seu
patrocinador saiu; mas tire mingau da panela e molho da caçarola e coma.’
“Eu assim
fiz e fui embora. Então o oleiro Ghatikara foi até os pais dele e perguntou:
‘Quem tirou mingau da panela e molho da caçarola, comeu, e foi embora?’ – ‘Meu
querido, o Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado.’
“Então, o
oleiro Ghatikara pensou: ‘É um ganho para mim, é um grande ganho para mim, que o
Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, conte comigo assim!’ E o
êxtase e a felicidade nunca o abandonaram durante quinze dias e os pais dele
por uma semana.
“Em
outra ocasião, quando eu estava em Vebhalinga a minha cabana estava com
goteiras. Então, me dirigi aos bhikkhus da seguinte forma: ‘Vão, bhikkhus, e
vejam se há alguma palha na casa do oleiro Ghatikara.’ – ‘Venerável senhor, não
há palha na casa do oleiro Ghatikara; há palha só na cobertura.’ – ‘Vão,
bhikkhus, e removam a palha da cobertura da casa do oleiro Ghatikara.’
“Eles
assim fizeram. Os pais do oleiro Ghatikara perguntaram aos bhikkhus: ‘Quem está
tirando a palha da cobertura?’ – ‘Irmã, a cabana do Abençoado Kassapa, um arahant,
perfeitamente iluminado, está com goteiras.’ – ‘Tomem-na, veneráveis senhores,
tomem-na, nós os abençoamos!’
“Então, o
oleiro Ghatikara foi até os pais dele e perguntou: ‘Quem removeu a palha da
cobertura?’ ‘Os bhikkhus assim fizeram, meu querido; a cabana do Abençoado
Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, está com goteiras.’
“Então, o
oleiro Ghatikara pensou: ‘É um ganho para mim, é um grande ganho para mim, que o
Abençoado Kassapa, um arahant, perfeitamente iluminado, conte comigo assim!’ E o
êxtase e a felicidade nunca o abandonaram durante quinze dias e os pais dele
por uma semana. Então, aquela casa permaneceu três meses completos tendo o céu
como cobertura, e mesmo assim, lá não entrou chuva.
Assim é o oleiro
Ghatikara.”
[ MN 81]
Leia também sobre a Generosidade no treinamento gradual – Caminho para a Liberdade.
O tema da Virtude também está disponível em áudio
Para o Budismo, a dignidade inata dos seres humanos não provém da nossa relação com um deus todo poderoso ou por sermos dotados de uma alma imortal. Provém particularmente da posição privilegiada da vida humana dentro do vasto espectro de seres sensientes. Longe de reduzir os seres humanos a frutos do acaso, o Buda ensina que o reino humano é um reino muito especial estando exatamente no centro espiritual do cosmos. O que faz com que a vida humana seja tão especial é a capacidade de escolha moral que os seres humanos têm, e que não é compartilhada por nenhum outro tipo de ser. Embora essa capacidade esteja inevitavelmente sujeita a fatores limitantes, nós sempre possuímos, no momento presente, uma margem de liberdade interna que nos dá o poder de mudarmos a nós mesmos e assim, mudar o mundo.
No entanto, a vida no reino humano está longe de ser aconchegante. Pelo contrário, ela é inconcebivelmente difícil e complexa, abundante em conflitos e ambigüidades morais, oferecendo um enorme potencial para ambos, o bem e o mal. Essa complexidade moral pode converter a vida humana numa luta verdadeiramente dolorosa, mas ela também faz do reino humano o terreno mais fértil para plantar as sementes da Iluminação. Durante a longa jornada das nossas vidas, são esses entroncamentos ambíguos e perturbadores que nos oferecem a oportunidade de escolha entre nos elevarmos aos píncaros da grandeza espiritual ou cairmos até as profundezas mais degradantes. As duas alternativas se nos apresentam a cada momento e a escolha entre uma e outra depende unicamente de nós.
Bhikkhu Bodhi
[ Dando Dignidade à Vida]
O Buda recomendou três critérios ao fazermos julgamentos morais. O primeiro podemos chamar de princípio da universalidade – agir em relação aos outros do mesmo modo que gostaríamos que eles agissem conosco. O segundo podemos chamar de princípio conseqüencial – para determinar se um comportamento é benéfico ou prejudicial é necessário avaliar as conseqüências tanto no agente como no paciente, ou seja, um comportamento que cause algum tipo de dano quer seja no agente ou no paciente deve ser evitado. O terceiro podemos chamar de princípio instrumental – um comportamento é benéfico se ele nos conduz para mais perto do objetivo ou prejudicial, se nos afasta dele. O objetivo último no Budismo é nibbana, um estado de pureza e paz mental, e tudo que conduz a esse objetivo será benéfico.
Essa abordagem utilitária em relação à ética fica ainda mais clara ao observarmos que o Buda usava com muito mais freqüência os termos ‘benéfico ou hábil’ e o seu oposto ‘prejudicial ou inábil’ no lugar de bom ou mal. Outro elemento importante na avaliação do comportamento é a intenção. Se uma ação está fundamentada em boas intenções, por exemplo, na generosidade e na compaixão, então, ela será considerada hábil. Portanto, avaliar o comportamento no Budismo requer mais do que simplesmente obedecer a certas regras ou mandamentos, exige que tenhamos plena consciência dos nossos pensamentos, palavras e ações, bem como dos nossos objetivos e aspirações.
Michael Beisert
[ ABC do Budismo]
“Chefes de família, existem três tipos de conduta corporal de acordo com o Dhamma, conduta íntegra. Existem quatro tipos de conduta verbal de acordo com o Dhamma, conduta íntegra. Existem três tipos de conduta mental de acordo com o Dhamma, conduta íntegra.
E quais, chefes de família, são os três tipos de conduta corporal de acordo com o Dhamma, conduta íntegra? É o caso em que alguém, abandonando tirar a vida de outros seres, se abstém de tirar a vida de outros seres; ele permanece com a sua vara e arma postas de lado, bondoso e gentil, compassivo com todos os seres vivos. Abandonando tomar o que não seja dado, ele se abstém de tomar o que não é dado; ele não toma, como se fosse um ladrão, os bens e propriedades de outros num vilarejo ou na floresta. Abandonando a conduta imprópria com relação aos prazeres sensuais, ele se abstém da conduta imprópria com relação aos prazeres sensuais; ele não se envolve sexualmente com quem está sob a proteção da mãe, do pai, dos irmãos, das irmãs, dos parentes, que possuem esposo, protegidas pela lei ou mesmo com quem esteja coroada de flores por um outro homem. Assim são os três tipos de conduta corporal de acordo com o Dhamma, conduta íntegra.
E quais, chefes de família, são os quatro tipos de conduta verbal de acordo com o Dhamma, conduta íntegra? É o caso em que alguém, abandonando a linguagem mentirosa, se abstém da linguagem mentirosa; tendo sido chamado para uma corte, uma reunião, um encontro com seus parentes, com a sua corporação, com a família real, se assim for questionado como testemunha: 'Então, bom homem, diga o que você sabe,' se ele não souber, dirá, 'Eu não sei'; se ele souber, dirá, 'Eu sei'; se ele não viu, dirá, 'Eu não vi'; se ele viu, dirá, 'Eu vi'. Assim, com plena consciência ele não conta mentiras em seu próprio benefício, pelo benefício de outros ou para obter algum benefício mundano insignificante. Abandonando a linguagem maliciosa, ele se abstém da linguagem maliciosa; o que ouviu aqui ele não conta ali para separar aquelas pessoas destas, ou, o que ouviu lá ele não conta aqui para separar estas pessoas daquelas; assim, ele reconcilia aquelas pessoas que estão divididas, promove a amizade, ele ama a concórdia, se delicia com a concórdia, desfruta da concórdia, diz coisas que criam a concórdia. Abandonando a linguagem grosseira, ele se abstém da linguagem grosseira. Ele diz palavras que são gentis, que agradam aos ouvidos, carinhosas, que penetram o coração, que são corteses, desejadas por muitos e que agradam a muitos. Abandonando a linguagem frívola, ele se abstém da linguagem frívola. Ele fala na hora certa, diz o que é fato, aquilo que é bom, fala de acordo com o Dhamma e a Disciplina; nas horas adequadas ele diz palavras que são úteis, racionais, moderadas e que trazem benefício. Assim são os quatro tipos de conduta verbal de acordo com o Dhamma, conduta íntegra.
E quais, chefes de família, são os três tipos de conduta mental de acordo com o Dhamma, conduta íntegra? É o caso em que alguém não é cobiçoso. Ele não cobiça as posses dos outros, pensando, 'Ah, que aquilo que pertence aos outros seja meu!' A sua mente não possui má vontade e as suas intenções estão isentas de raiva: 'Que esses seres possam estar livres da inimizade, aflição e ansiedade! Que eles vivam felizes!’ Ele tem entendimento correto e não vê as coisas de forma distorcida: ‘Existe aquilo que é dado e o que é oferecido e o que é sacrificado; existe fruto e resultado de boas e más ações; existe este mundo e o outro mundo; existe a mãe e o pai; existem seres que renascem espontaneamente; existem no mundo brâmanes e contemplativos bons e virtuosos que, após terem conhecido e compreendido diretamente por eles mesmos, proclamam este mundo e o próximo.’ Assim são os três tipos de conduta mental de acordo com o Dhamma, conduta íntegra.
[ MN 41]
Leia também sobre a Virtude no treinamento gradual – Caminho para a Liberdade.
Ao meditarmos, nos damos conta que os momentos mais felizes, aquelas situações nas quais chegamos mais próximo da real felicidade, acontecem quando sentimos contentamento. Descobrimos que na vida podemos ser felizes com muito pouco. Na verdade, quanto menos temos, mais felizes podemos ser. É por isso que o caminho da renúncia e do abandono supera o do desejo. Esse é o caminho da Terceira Nobre Verdade – a renúncia conduz à paz.
Pratique esse princípio na sua vida. Toda vez que houver algum sofrimento, é nesse ponto que você deve renunciar. Afinal, a que nos estamos apegando? Vamos abrir mão de algo, vamos nos soltar de algo, sentir contentamento. Assim que sentimos contentamento, o problema estará resolvido. Não precisamos pensar a respeito, é só estar em paz com o que quer que aconteça. Quem sabe, talvez alguém tenha sido contratado para me dar uma surra hoje. Está bem, eu posso aceitar isso. Qualquer coisa que nos aconteça, se estivermos familiarizados com o contentamento, então saberemos o caminho para a libertação do sofrimento.
Essa é a Terceira Nobre Verdade. Não pensemos nela, pratiquemo-la, soltemo-nos do desejo. Se alguma vez houver algum problema na meditação ou na nossa vida, ao invés de tentarmos outras soluções para superar o sofrimento, tentemos ‘A solução da Terceira Nobre Verdade’ – soltemo-nos daquilo, soltemo-nos do desejo. Novamente, estamos desejando algo e isso está causando sofrimento, então abandonemos isso. Investiguemos aquilo que desejamos, aquilo que realmente desejamos, saberemos o que está fazendo com que soframos. Abandonemos isso!
“Eu quero ter saúde” - abandone isso! Sinta contentamento por estar enfermo. “Está bem. Estou doente. Vamos ver quão enfermo posso ficar!” Esse tipo de atitude faz com que Mara fique realmente preocupado. Quando fazemos esse tipo de coisa, esta é a resposta que recebemos, “Deixe disso, não seja estúpido, você vai ficar ainda mais doente e vai doer ainda mais.” Vejamos quão enfermos podemos ficar. Esse é o tipo de contentamento que vai na direção oposta do desejo. Isso é o que é a libertação.
Ajaan Brahmavamso
[ Por Fim a Alegria de Saber Que Não Há Felicidade no Mundo]
Para abraçar o caminho espiritual inteiramente, ser capaz de nele crescer e percorrê-lo com uma sensação de segurança, é necessário renunciar. Renúncia não significa necessariamente raspar o cabelo ou vestir mantos. Renúncia significa abandonar todas as idéias e esperanças às quais a mente desejaria se apegar e reter, ter interesse e desejo de investigar. A mente deseja ter sempre mais do que quer que seja que esteja disponível. Se ela não consegue obter mais, ela então produz fantasias e imaginações e as projeta sobre o mundo. Isso nunca trará a verdadeira satisfação, paz interior, que apenas podem ser conquistadas por meio da renúncia. “Abandonar” é a palavra chave no caminho Budista, é a dissolução do desejo. É necessário compreender de uma vez por todas que “mais” não é “melhor.” É impossível chegar ao fim de “mais,” sempre há algo que está mais além. Mas com certeza é possível chegar ao fim de “menos,” que é uma abordagem muito mais inteligente.
Porque sentar isolado em meditação e arruinar as possibilidades de todas as oportunidades que o mundo oferece para o divertimento? Uma pessoa poderia viajar, dedicar-se a um trabalho desafiador, conhecer pessoas interessantes, escrever cartas ou ler livros, desfrutar um período agradável em algum outro lugar e realmente sentir-se tranqüila – ela poderia até mesmo encontrar um caminho espiritual distinto. Quando a meditação não alcança os resultados desejados, pode surgir o pensamento: “O que é que eu estou fazendo, porque estou fazendo isso, para que, qual o benefício disso tudo?” Então surge a idéia: “Eu na verdade não sou capaz de fazer isso muito bem, talvez eu devesse tentar outra coisa.”
O mundo reluz e promete tanto, mas nunca, nunca cumpre as suas promessas. Cada um de nós já experimentou inúmeras vezes as suas tentações e nenhuma delas trouxe real satisfação. A verdadeira satisfação, a plenitude da paz, sem faltar nada, a completa tranqüilidade desprovida de cobiça, não pode ser satisfeita no mundo. Não há nada que possa preencher os nossos desejos de forma completa e absoluta. Dinheiro, posses materiais, uma outra pessoa, embora essas coisas possam trazer alguma satisfação, no entanto, existe aquela dúvida incomodativa: “Talvez eu encontre alguma outra coisa, mais confortável, mais fácil, não tão exigente e acima de tudo algo novo.” Sempre, aquilo que é novo promete a satisfação.
A satisfação que estamos buscando não é o que podemos conseguir para rechear esta mente e corpo. O buraco é demasiado grande para ser preenchido. O único modo de encontrar satisfação é abandonar as expectativas e desejos em relação a tudo aquilo que ocorre na mente, sem deixar escapar nada. Então, não restará nada para ser preenchido.
Ayya Khema
[ Renúncia]
Obviamente que tentar praticar a meditação e ao mesmo tempo continuar mantendo os antigos desejos, gostos e desgostos, é, no mínimo, dificultar o caminho, se não torná-lo perigoso. A meditação implica em renúncia, e nenhuma prática terá êxito a não ser que a pessoa esteja, no mínimo, preparada para fazer esforços para refrear a cobiça e a raiva, controlar a luxúria e entender quando a delusão estiver obscurecendo o coração. Até que ponto a renúncia é adotada e se isso envolve mudanças externas (tal como tornar-se um monge ou monja), depende muito da pessoa e das suas circunstâncias, mas uma coisa é certa: a renúncia interna, caracterizada pela atitude de desistência dos eventos mentais inábeis e prejudiciais e da entrega aos prazeres corporais, são absolutamente essenciais.
Bhikkhu Khantipalo
[ Conselhos Práticos para Meditação]
Leia também sobre a Renúncia no treinamento gradual – Caminho para a Liberdade.
Ratthapala foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo, ele sentou a um lado e disse para o Abençoado: “Venerável senhor, tal como eu entendo o Dhamma ensinado pelo Abençoado, não é fácil viver em família e praticar a vida santa completamente perfeita, totalmente pura, como uma concha polida. Venerável senhor, eu desejo raspar o meu cabelo e barba, vestir os mantos de cor ocre e seguir a vida santa. Eu receberia a admissão na vida santa sob o Abençoado e a admissão completa.”
“Você foi autorizado pelos seus pais, Ratthapala, para deixar a vida em família e seguir avida santa?”
“Não, venerável senhor, eu não tenho a autorização dos meus pais.”
“Ratthapala, os Tathagatas não admitem na vida santa ninguém que não tenha a permissão dos seus pais.”
“Venerável senhor, eu farei com que meus pais me dêem a autorização para deixar a vida em família e seguir a vida santa.”
Então, Ratthapala levantou do seu assento e depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita, partiu. Ele foi até os seus pais e lhes disse: “Mãe e pai, tal como eu entendo o Dhamma ensinado pelo Abençoado, não é fácil viver em família e praticar a vida santa completamente perfeita, totalmente pura, como uma concha polida. Eu desejo raspar o meu cabelo e barba, vestir os mantos de cor ocre e seguir a vida santa. Dêem-me a sua permissão para que eu deixe a vida em família e siga a vida santa.”
Quando ele disse isso, os pais dele responderam: “Querido Ratthapala, você é o nosso único filho, amado e querido. Você foi educado com conforto, cresceu com conforto; você nada conhece do sofrimento, querido Ratthapala. Mesmo se você morresse nós o deixaríamos ir contra nossa vontade, então como poderíamos dar a nossa permissão para que você deixe a vida em família e siga a vida santa enquanto você ainda está vivo?”
Uma segunda vez ... Uma terceira vez Ratthapala disse para os seus pais: “Mãe e pai ... Dêem-me a sua permissão para que eu deixe a vida em família e siga a vida santa.”
Pela terceira vez os seus pais responderam: “Querido Ratthapala ... como poderíamos dar a nossa permissão para que você deixe a vida em família e siga a vida santa enquanto você ainda está vivo?”
Então, por não ter recebido a permissão dos pais para seguir a vida santa, Ratthapala se deitou no chão e disse: “Exatamente aqui morrerei ou receberei a admissão na vida santa.”
Então os pais de Ratthapala disseram: “Querido Ratthapala, você é o nosso único filho, amado e querido. Você foi educado com conforto, cresceu com conforto; você nada conhece do sofrimento, querido Ratthapala. Levante-se, querido Ratthapala, coma, beba e divirta-se. Ao comer, beber e se divertir, você poderá ser feliz desfrutando dos prazeres sensuais e realizar méritos. Nós não permitiremos que você deixe a vida em família e siga a vida santa. Mesmo se você morresse nós o deixaríamos ir contra nossa vontade, então como poderíamos dar a nossa permissão para que você deixe a vida em família e siga a vida santa enquanto você ainda está vivo?” Quando isso foi dito, Ratthapala permaneceu em silêncio.
Uma segunda vez ... Uma terceira vez os pais de Ratthapala disseram: “Querido Ratthapala ... como poderíamos dar a nossa permissão para que você deixe a vida em família e siga a vida santa enquanto você ainda está vivo?” Pela terceira vez Ratthapala permaneceu em silêncio.
Então os pais de Ratthapala foram até os amigos dele e disseram: “Estimados amigos, Ratthapala está deitado no chão, depois de dizer: ‘Exatamente aqui morrerei ou receberei a admissão na vida santa.’ Venham, estimados amigos, vão até Ratthapala e digam: ‘Amigo Ratthapala, você é o único filho ... Levante-se, amigo Ratthapala, coma, beba e divirta-se ... como seus pais poderiam dar-lhe a permissão deles para que você deixe a vida em família e siga a vida santa enquanto você ainda está vivo?'"
Então, os amigos de Ratthapala foram até ele e disseram: “Amigo Ratthapala, você é o único filho, amado e querido. Você foi educado com conforto, cresceu com conforto; você nada conhece do sofrimento, amigo Ratthapala. Levante-se, amigo Ratthapala, coma, beba e divirta-se. Ao comer, beber e se divertir, você poderá ser feliz desfrutando dos prazeres sensuais e realizar méritos. Os seus pais não permitirão que você deixe a vida em família e siga a vida santa. Mesmo se você morresse eles o deixariam ir contra a vontade, então como poderiam eles dar permissão para que você deixe a vida em família e siga a vida santa enquanto você ainda está vivo?” Quando isso foi dito, Ratthapala permaneceu em silêncio.
Uma segunda vez ... Uma terceira vez os amigos de Ratthapala lhe disseram: “Amigo Ratthapala ... como poderiam eles dar permissão para que você deixe a vida em família e siga a vida santa enquanto você ainda está vivo?” Pela terceira vez Ratthapala permaneceu em silêncio.
Então os amigos de Ratthapala foram até os pais dele e disseram: “Mãe e pai, Ratthapala está deitado no chão, depois de dizer: ‘Exatamente aqui morrerei ou receberei a admissão na vida santa.’ Agora, se vocês não derem a permissão para que ele deixe a vida em família e siga a vida santa, ele irá morrer ali. Mas se vocês derem a permissão, vocês irão vê-lo depois quando ele estiver seguindo a vida santa. E se ele não apreciar a vida santa, o que mais poderá ele fazer além de voltar para cá? Portanto, dêem a ele permissão para que deixe a vida em família e siga a vida santa.”
“Então, estimados amigos, nós damos a nossa permissão para que Ratthapala deixe a vida em família e siga a vida santa. Mas, seguindo a vida santa, ele terá de nos visitar.”
Então os amigos de Ratthapala foram até ele e disseram: “Levante-se, amigo Ratthapala. Os seus pais deram a permissão para que você deixe a vida em família e siga a vida santa. Mas, seguindo a vida santa, você terá de visitá-los.”
Ratthapala então se levantou e depois de haver recuperado as forças, ele foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentou a um lado e disse: “Venerável senhor, eu tenho a permissão dos meus pais para deixar a vida em família e seguir a vida santa. Que o Abençoado me conceda a admissão na vida santa.” Então, Ratthapala recebeu a admissão na vida santa sob o Abençoado e a admissão completa.
[MN 82]
Os discípulos do Buda receberam essa prática do Mestre e se empenharam com perseverança resoluta. Assim, eles alcançaram o despertar ao qual aspiravam.
Como eles se empenhavam? Do mesmo modo que um homem que quisesse acender um fogo com um graveto, como nos tempos passados. Ele esfregava dois gravetos um contra o outro e o calor era produzido. Depois de um certo tempo, os gravetos produziriam tanto calor que o fogo poderia ser acendido. Portanto, se alguém quisesse acender um fogo dessa forma e esfregasse dois gravetos de madeira um contra o outro, ele contaria: “Uma esfregada, duas esfregadas, três esfregadas...”?
Discípulo: Não, senhor, desse modo não iria funcionar.
Sayadaw: Como ele deveria fazer então?
D: Ele deveria esfregá-los de forma contínua até obter uma chama.
S: Sim, quando naqueles tempos eles precisavam acender um fogo essa era a única forma de fazê-lo. Eles precisavam esfregar com forte determinação e sem interrupção. Agora, se alguém esfregasse dois gravetos de madeira dessa forma, quanto tempo demoraria para acender o fogo?
D: Quando estiver quente o suficiente, o fogo irá começar, senhor.
S: Isso demora muito?
D: Não muito tempo, senhor.
S: Não, se essa pessoa trabalhar com determinação, não irá demorar muito tempo. É exatamente o mesmo com essa nossa prática. Você quer fogo. Você sabe que se esfregar dois gravetos de madeira irá obter fogo. Agora, se você contar, “Uma esfregada, duas esfregadas...” irá ficar um pouco quente. E então você descansa um pouco. Você irá acender o fogo?
D: Não, senhor.
S: OK, então você começa outra vez, uma duas, três vezes...e mais uma vez o calor é produzido. Então você se deita novamente para descansar. Você irá acender o fogo?
D: Não, senhor.
S: E se você continuar agindo assim durante um mês inteiro?
D: Não iremos obter fogo.
S: E se você continuar agindo assim durante todo um ano?
D: Apenas irá esquentar, senhor, mas não haverá fogo.
S: Agora, e se você trabalhasse dessa forma durante cem anos?
D: Apenas irá esquentar, senhor.
S: Nesse caso, esses dois gravetos não contêm fogo?
D: Contêm fogo, senhor, mas o esforço e a perseverança não são suficientes.
S: É o mesmo com a sua tarefa. Vocês têm que trabalhar como a pessoa que quer obter fogo, sem descanso. Em pouco tempo irá ficar quente e depois, sem tardar muito, o fogo irá acender. Somente então vocês poderão usar o fogo como quiserem. Vocês devem todos se esforçar para realizar a aspiração pelo despertar. Vocês receberam os ensinamentos do Buda. Agora vocês têm que se empenhar de modo que o seu esforço seja igual ao daqueles sábios do passado que alcançaram o objetivo. Os ensinamentos do Buda são o único caminho para eliminar o sofrimento, e vocês só poderão praticá-los quando um Buda tiver surgido e enquanto os ensinamentos dele estiverem disponíveis. Quando os ensinamentos de um Buda não estiverem mais disponíveis, vocês não serão capazes de realizar a aspiração de alcançar Nibbana.
Quando um Buda surge no mundo, a conduta correta (carana) e o entendimento (vijja) que conduzem ao fim do sofrimento são expostos. Se você aproveitar essa oportunidade e colocá-los em prática, você se tornará perfeito. A conduta correta também pode ser praticada quando os ensinamentos do Buda não estiverem disponíveis, mas o insight ou o entendimento não estarão disponíveis.
Webu Sayadaw
[ Acender o Fogo]
Então, o Abençoado disse para os bhikkhus: “Dessa forma, bhikkhus, eu os encorajo: todas as coisas condicionadas estão sujeitas à dissolução. Esforçem-se pelo objetivo com diligência”. Essas foram as últimas palavras do Tathagata.
[DN 16]
“E o que, bhikkhus, é a faculdade da energia? Neste caso, bhikkhus, o nobre discípulo permanece com a sua energia desperta para o abandono de qualidades mentais prejudiciais e para a obtenção de qualidades mentais benéficas; ele é decidido, firme no seu esforço, sem se esquivar das suas responsabilidades com relação ao cultivo de qualidades mentais benéficas. Ele é zeloso para que não surjam estados ruins e prejudiciais que ainda não surgiram e ele se aplica, estimula a sua energia, empenha a sua mente e se esforça. Ele é zeloso em abandonar estados ruins e prejudiciais que já surgiram e ele se aplica, estimula a sua energia, empenha a sua mente e se esforça. Ele é zeloso para que surjam estados benéficos que ainda não surgiram e ele se aplica, estimula a sua energia, empenha a sua mente e se esforça. Ele é zeloso para que haja a continuidade, o não desaparecimento, o fortalecimento, o incremento e a realização através do desenvolvimento de estados benéficos que já surgiram e ele se aplica, estimula a sua energia, empenha a sua mente e se esforça. Essa é chamada a faculdade da energia.
[ SN XLVIII.10]
Agora, quando o esforço e a persistência estão presentes em nós, então a energia também terá que estar presente. Porque? Quando você aplica esforço e persistência em relação a algo, inevitavelmente surgirão obstáculos no seu caminho. Se você for realmente persistente, esses obstáculos irão desaparecer, o que significa que você também esteve utilizando a energia. Se você tiver esforço sem energia, não irá a lugar nenhum. Se você tiver persistência, significa que o seu esforço também tem energia. Dessa forma, devemos considerar que o esforço vem primeiro e a energia em seguida. Uma vez que essas qualidades estejam constantemente atuando em sincronia dentro de você então, não importa quão profundos ou distantes os seus objetivos sejam, o Buda previu que você irá alcançá-los de acordo com as suas expectativas. Por isso ele disse, como um meio de assegurar que faremos o esforço adequado, Viriyena dukkhamacceti: é através do esforço e persistência que as pessoas obtêm a libertação do mundo e realizam nibbana. Esforço e persistência são as nossas raízes, ou a força magnética que irá nos puxar em direção a nibbana.
Ajaan Lee Dhammadharo
[ Consciência]
Há dois tipos de energia:
Energia corporal (kayika-viriya)
Energia mental ( cetasika-viriya)
Há dois graus de habilidade com relação à energia:
Energia comum (Pakati-viriya)
e
Energia desenvolvida através da meditação (Bhavana-viriya)
A energia corporal é evidente através da necessidade de menos horas de sono e do vigor e dinamismo físico. A energia mental é o entusiasmo alerta e a aguçada atenção ao objeto da meditação. Para que um trabalho seja bem sucedido ele depende sempre de um experto. Se ele for executado sem energia real, ele acabará dominando a pessoa e nenhum resultado concreto será obtido; dias e meses se arrastarão e o desgosto pelo trabalho surgirá, levando à preguiça. Com a preguiça, o progresso no trabalho é reduzido, surgindo então a idéia enganosa de que é melhor mudar o trabalho ou abandoná-lo por completo.
No treinamento meditativo, o rápido sucesso é obtido apenas por aquele dotado de ambas as energias, a corporal e a mental. A energia desenvolvida na meditação é capaz de superar o torpor e a preguiça. A mente então se entusiasma e se deleita em permanecer com o objeto de meditação no qual foi aplicada a atenção vigorosa! Essa é a energia desenvolvida com a meditação.
Ledi Sayadaw
[The requisites of Enlightenment]
“Energia é o estado daquele que é vigoroso. A sua característica é o impulso entusiástico e vigoroso para realizar o esforço. A sua função é consolidar os estados que surgem simultaneamente. A sua manifestação é um estado de não-colapso de tudo aquilo que é benéfico. A condição de proximidade da energia é um senso de urgência, (samvega), ou qualquer coisa que estimule e instigue a energia. Foi dito pelo Abençoado que aquele que é estimulado e instigado pela energia se empenha e se esforça do modo apropriado. Isso conduz ao êxito! Estimulada da forma correta a energia deve ser vista como a raiz de todas as realizações.
[Visuddhimagga XIV 137]
“Majestade, como um homem que reforça a parede de uma casa, que estava prestes a cair, com um pedaço de madeira, e estando assim reforçada aquela casa não irá desmoronar. Da mesma forma, majestade, a energia tem a característica de reforçar e consolidar o vigor. Com a energia, os estados benéficos não são perdidos.”
[Milindapañha 36]
“Existem cinco fatores para o esforço. Quais cinco? Aqui um bhikkhu tem fé, ele deposita fé na iluminação do Tathagata assim: “Esse Abençoado é um arahant, perfeitamente iluminado, consumado no verdadeiro conhecimento e conduta, bem-aventurado, conhecedor dos mundos, um líder insuperável de pessoas preparadas para serem treinadas, mestre de devas e humanos, desperto, sublime.”
“Então, ele se vê livre de enfermidades e aflições, possuindo uma boa digestão, que não é nem demasiado fria nem demasiado quente, mas média e capaz de suportar a tensão do esforço.
“Então, ele é honesto e sincero, e se mostra como ele na verdade é para o Mestre e os seus companheiros na vida santa.
“Então, ele é energético no abandono dos estados prejudiciais e no empenho pelos estados benéficos, decidido, dedicando-se ao esforço com firmeza e perseverando no cultivo de estados benéficos.
“Então, ele é sábio; ele possui a completa compreensão da origem e cessação, que é nobre e penetrante, conduzindo à completa destruição do sofrimento. Esses são os cinco fatores para o esforço.
[ MN 85]
Leia também sobre a Energia nos Conselhos Práticos para Meditação.
"É através da adversidade que a tolerância de uma pessoa pode ser conhecida e somente após um longo período de tempo, não um período curto; por alguém que seja atento, não por alguém que seja desatento; por alguém que tenha sabedoria, não por alguém que não tenha sabedoria. Assim foi dito e em referência a que foi dito isto?
"É o caso em que um indivíduo, sofrendo a perda de parentes, perda de riqueza ou perda por doença, não reflete: 'Assim é a convivência no mundo. Assim é quando se tem uma identidade pessoal [atta-bhava, literalmente “estado do eu"]. Quando se vive no mundo, quando se tem uma identidade pessoal, essas oito condições mundanas revolvem acompanhando o mundo e o mundo revolve acompanhando essas oito condições mundanas: ganho e perda, fama e má reputação, elogio e crítica, alegria e tristeza.’ Sofrendo a perda de parentes, perda de riqueza ou perda por doença, ele fica triste, sofre e se lamenta, bate no peito, fica perturbado. E então, existe o caso em que um indivíduo, sofrendo a perda de parentes, perda de riqueza ou perda por doença, reflete: ‘Assim é a convivência no mundo. Assim é como se tem uma identidade pessoal. Quando se vive no mundo, quando se tem uma identidade pessoal, essas oito condições mundanas revolvem acompanhando o mundo e o mundo revolve acompanhando essas oito condições mundanas: ganho e perda, fama e má reputação, elogio e crítica, alegria e tristeza.’ Sofrendo a perda de parentes, perda de riqueza ou perda por doença, ele não fica triste, sofre ou lamenta, não bate no peito ou fica perturbado.
[ AN IV.192]
Então, ao amanhecer, o venerável Angulimala se vestiu e tomando a tigela e manto externo, foi para Savathi para esmolar alimentos. Agora, naquela ocasião, alguém jogou uma pedra e atingiu o corpo do venerável Angulimala, outra pessoa jogou um pau e atingiu o corpo dele e outra pessoa jogou um pedaço de cerâmica e atingiu o corpo dele. Então, com o sangue jorrando da sua cabeça cortada, com a sua tigela quebrada e com o seu manto externo rasgado, o venerável Angulimala foi até o Abençoado. O Abençoado o viu chegando à distância e lhe disse: “Agüente, brâmane! Agüente, brâmane! Você está experimentando aqui e agora o resultado de ações pelas quais você poderia ser torturado no inferno durante muitos anos, por muitas centenas de anos, por muitos milhares de anos.”
[ MN 86]
Dentre as perfeições que culminam no próprio benefício
nenhuma é melhor que a paciência.
Quando uma pessoa dotada de força
pacientemente tolera alguém mais fraco,
eles chamam isso de suprema paciência;
o mais fraco tem de ser sempre paciente.
[ SN XI.5]
Impurezas que devem ser abandonadas com a paciência:
“Quais impurezas, bhikkhus, devem ser abandonadas com a paciência? Neste caso um bhikkhu, refletindo de maneira sábia, agüenta o frio e o calor, fome e sede, o contato com moscas, mosquitos, vento, sol e criaturas rastejantes; ele agüenta palavras ditas de forma grosseira, desagradável e sensações no corpo que são dolorosas, penetrantes, torturantes, desagradáveis, perigosas e que ameaçam a vida. Enquanto que impurezas, aflição e febre podem surgir naquele que não agüenta essas coisas, não existem impurezas, aflição e febre naquele que as agüenta. Essas são chamadas as impurezas que devem ser abandonadas com a paciência.
[ MN 2]
Leia também sobre a Paciência nos Conselhos Práticos para Meditação.
O tema do Amor Bondade também está disponível em áudio
O ódio, deveras, nunca, até agora, dissipou o ódio. Só o amor dissipa o ódio. O ódio só leva à vingança e a vingança leva a mais ódio. Um ciclo de sofrimento é colocado em movimento e pode continuar indefinidamente. Muitos lugares no mundo hoje são uma triste evidência dessa verdade.
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A mais importante fonte de metta, e essa pode ser uma surpresa, é a prática da atenção plena. A atenção plena está intimamente ligada a metta e possui até um aspecto de metta dentro de si. Pois, estar com atenção plena é estar completamente aberto e receptivo a qualquer coisa presente. Um ditado Zen Chinês compara a atenção plena a um anfitrião que está recebendo amigos em casa para uma reunião. O anfitrião fica na porta e cumprimenta cada convidado conforme eles entram e se despede de cada um deles quando partem, com total atenção, um após o outro. Não há preferência por um em relação ao outro, antipatia por um ou outro. Há apenas o interesse genuíno e a atenção para com quem quer que seja que cruze a porta.
A atenção total é uma grande dádiva. Quando você dá para alguém a sua total atenção, você está-lhe oferecendo respeito. Proporcionar atenção incondicional a outrem é aceitar aquela pessoa totalmente e reconhecer o seu valor. Nesse momento de completa atenção, um profundo vínculo humano é sentido. A outra pessoa sente esse interesse compassivo e provavelmente irá corresponder.
Com o tempo, a prática da atenção plena muda os antigos modos de percepção. Pois num momento de atenção plena, as memórias e o condicionamento passado são postos de lado. Cada momento de atenção plena é um momento de pureza no qual, por aquele instante, vemos com novos olhos a maravilha e a beleza daquilo que aqui está.
Sarah Doering
[ Neste Mundo, o Ódio nunca, até agora, dissipou o Ódio ]
“Bhikkhus, certa vez no passado, um acrobata, tendo levantado um poste de bambu, se dirigiu ao seu ajudante, Medakathalika: ‘Venha, estimado Medakathalika, suba nos meus ombros e fique em pé sobre o poste de bambu.’ Tendo respondido, ‘Sim, mestre,’ o aprendiz Medakathalika subiu sobre os ombros dele e ficou em pé no poste de bambu. O acrobata então disse para o aprendiz Medakathalika: ‘Você agora me proteja, estimado Medakathalika, e eu o protegerei. Assim, guardando um ao outro, protegendo um ao outro, mostraremos nossa arte, receberemos nossa recompensa e com segurança desceremos do poste de bambu.’ Quando isso foi dito o aprendiz Medakathalika respondeu: ‘Esse não é o modo de fazer isso, mestre. Você se proteje, mestre, e eu me protegerei. Assim, com cada um guardado e protegido, nós mostraremos a nossa arte, receberemos a nossa recompensa e com segurança desceremos do poste de bambu.’
“Esse é o método nesse caso,” o Abençoado disse. “É exatamente aquilo que o aprendiz Medakathalika disse para o seu mestre. ‘Eu me protegerei,’ bhikkhus: assim devem ser praticados os fundamentos da atenção plena. ‘Eu protegerei os outros,’ bhikkhus: assim devem ser praticados os fundamentos da atenção plena. Protegendo a si mesmo, bhikkhus, ele protege os outros; protegendo os outros, ele protege a si mesmo.
“E como é, bhikkhus, que protegendo a si mesmo, ele protege os outros? Através da perseverança, desenvolvimento e cultivo dos quatro fundamentos da atenção plena. É desse modo que protegendo a si mesmo, ele protege os outros.
“E como é, bhikkhus, que protegendo os outros, ele protege a si mesmo? Através da paciência, não fazendo o mal, através de uma mente com amor bondade e compaixão. É desse modo que protegendo os outros, ele protege a si mesmo.
“‘Eu protegerei a mim mesmo,’ bhikkhus: assim devem ser praticados os fundamentos da atenção plena. ‘Eu protegerei os outros,’ bhikkhus: assim devem ser praticados os fundamentos da atenção plena. Protegendo a si mesmo, bhikkhus, ele protege os outros; protegendo os outros, ele protege a si mesmo.”
[ SN XLVII.19 ]
O tipo de amor bondade que queremos cultivar não é o amor comum tal como é entendido no uso diário. Quando você diz, por exemplo, "eu amo tal pessoa" ou "tal coisa", o que você realmente está querendo dizer é que você deseja a aparência, comportamento, idéias, tom da voz ou a atitude em geral daquela pessoa, em relação a você particularmente, ou em relação à vida de forma geral. Se aquela pessoa mudar as coisas pelas quais você a deseja, você poderá decidir que não a ama mais. Se as preferências, caprichos e fantasias das pessoas mudarem, elas não mais dirão "eu amo tal pessoa". Nessa dualidade de amor-ódio você ama uma pessoa e odeia outra. Você ama agora e odeia depois. Você ama quando quiser e odeia quando quiser. Você ama quando tudo está bem e sem problemas e odeia quando alguma coisa dá errado no relacionamento entre você e a outra pessoa. Se o seu amor muda dessa forma de tempos em tempos, de lugar em lugar e de situação para situação, então o que você chama de "amor" não é metta mas sim desejo, cobiça ou luxúria - de nenhuma forma isso é amor.
O tipo de amor bondade que queremos cultivar através da meditação não possui um oposto ou um motivo velado. Assim, a dicotomia amor-ódio não se aplica ao amor bondade cultivado através da sabedoria ou da atenção plena, pois ele nunca irá se transformar em ódio à medida que as circunstâncias mudarem. O verdadeiro amor bondade é uma faculdade natural que está oculta sob o amontoado de desejo, raiva e ignorância. Ele não pode ser dado. Nós precisamos encontrá-lo dentro de nós mesmos e cultivá-lo com a atenção plena. A atenção plena o descobre, cultiva e mantém. A consciência do "eu" (ahankara) se dissolve com a atenção plena e o seu lugar é tomado pelo amor bondade isento de egoísmo.
Por causa do nosso egoísmo odiamos algumas pessoas. Queremos viver de certo jeito, queremos fazer certas coisas ao nosso modo, perceber as coisas de uma forma particular; e não de outro jeito. Se outras pessoas não concordarem com as nossas opiniões, nossos jeitos e nossos estilos, não só as odiaremos, mas também nos tornaremos tão cegos e irracionais, devido à falta de atenção plena, que poderemos chegar ao ponto de negar-lhes o direito à vida.
Bhante Henepola Gunaratana
[ Meditação de Metta (Amor bondade)]
O amor bondade pode ser desenvolvido gradualmente a cada dia como parte da prática de meditação, mas para ser realmente eficaz, ele precisa se mostrar na vida diária da pessoa. Ele torna a vida mais fácil transformando as pessoas que antes eram antipáticas e odiadas em indiferentes, inicialmente, mas depois, à medida que a prática vai se fortalecendo, em objetos para o surgimento do amor bondade. É o remédio do Buda para a enfermidade da raiva e da antipatia. Finalmente, o amor bondade tem dois inimigos: o "próximo", que é o apego sensual, com freqüência denominado de "amor" de forma incorreta, enquanto que o inimigo "distante" do seu desenvolvimento é a raiva. No desenvolvimento do amor bondade é necessário tomar cuidado com os dois.
Bhikkhu Khantipalo
[ Conselhos Práticos para Meditação ]
“Então, com o coração pleno de amor bondade, ele permanece permeando o primeiro quadrante com a mente imbuída de amor bondade, da mesma forma o segundo, da mesma forma o terceiro, da mesma forma o quarto; assim, acima, abaixo, em volta e em todos os lugares, para todos bem como para si mesmo, ele permanece permeando o mundo todo com a mente imbuída de amor bondade, abundante, transcendente, imensurável, sem hostilidade e sem má vontade.
“Como se um poderoso trompetista fizesse com pouca dificuldade uma proclamação aos quatro quadrantes, da mesma forma através desta meditação, Vasettha, através desta libertação da mente através do amor bondade ele não deixa nada sem ser tocado, nada no reino da sensualidade sem ser tocado.
[ DN 13]
Tal qual uma mãe, colocando em risco a própria vida,
ama e protege o seu filho, o seu único filho,
da mesma forma, abraçando todos os seres,
cultive um coração sem limites.
Com amor bondade para todo o universo,
cultive um coração sem limites:
Acima, abaixo e em toda a volta,
desobstruído, livre da raiva e da inimizade.
Quer seja parado, andando,
sentado, ou deitado,
sempre que estiver desperto,
cultive essa atenção plena:
a isto se denomina uma morada divina
no aqui e agora.
[ Snp I.8]
O tema da Sabedoria também está disponível em áudio
Três tipos de sabedoria:
baseada no estudo [audição], (sutamaya-pañña)
baseada no pensamento, (cintamaya-pañña)
baseada no desenvolvimento da mente [meditação], (bhavanamaya-pañña).
[ DN 33]
Combinar o estudo e a prática como parte da estrutura da fé Budista é uma abordagem que ressoa a própria tradição Budista. Muitas formulações nos textos enfatizam a importância de combinar essas duas asas do caminho Budista num equilíbrio saudável. Uma, encontrada nos suttas, diz que quando uma pessoa adquire fé, ela deve se aproximar de um mestre para aprender a doutrina. Tendo ouvido a doutrina, ela a retém na mente; aí, ela deve dominá-la verbalmente para imprimi-la com firmeza na mente; em seguida, ela examina o significado para ver como os ensinamentos se relacionam com a própria experiência individual, como eles se aplicam à própria vida. Por fim, ela se esforça para concretizar os ensinamentos e quando a prática amadurecer, ela enxergará a verdade última por ela mesma. Outra, num esquema mais simples, encontrada nos comentários Budistas, fala das três principais pilastras no desenvolvimento do caminho: estudo, prática e realização. Primeiro a pessoa estuda a doutrina, depois a coloca em prática e por fim realiza a verdade.
Ambas as formulações sugerem que o estudo do Dharma é a base para a prática e a realização. Quanto de estudo é necessário irá variar de pessoa para pessoa e de uma tradição para outra. Não pode haver regras rígidas e imutáveis que se apliquem a todos. Sem dúvida, algumas pessoas podem praticar de modo eficaz e obter sucesso com o mínimo de conhecimento doutrinário. Outras precisam de mais conhecimento, enquanto que outras, ainda, terão a inclinação natural de estudar o Dharma de forma ampla e profunda. Isto poderá auxiliar na própria prática delas e torná-las mais eficientes no ensino do Dharma. Portanto, o conhecimento amplo do Dharma, quando apoiado pela fé e conectado com a prática, tem valor porque ele não só amplia a própria compreensão como acentua a eficácia como mestre. O estudo em si também pode se tornar um empreendimento inspirador e que enaltece, abrindo os próprios olhos para a vastidão e profundidade do domínio do Dharma.
Bhikkhu Bodhi
[ Aprendendo com o Buda ]
Dukkha deve ser visto como aquilo que na verdade é, isto é, o melhor ponto de início para a nossa jornada espiritual. A menos que tenhamos conhecido, tenhamos visto dukkha, não teremos motivo para praticar. Se não tivermos reconhecido a abrangência de dukkha, não teremos interesse de nos livrar das suas garras.
A origem dependente transcendente começa com a consciência e conhecimento do inescapável sofrimento da condição humana. Ao refletir sobre isso, não mais tentaremos encontrar uma saída através de intentos mundanos, seja através da obtenção de mais informações ou conhecimentos ou de mais riqueza, ou mais posses, ou mais amigos. Ao ver dukkha como uma condição da qual não se pode escapar, atada à existência, não nos sentimos mais oprimidos por ela. É certo que existem trovões e relâmpagos, assim não tentamos negar o tempo. Tem que haver trovões, relâmpagos e chuva, para que possamos cultivar alimentos.
Com dukkha é o mesmo. Sem isso, a condição humana não existiria. Não haveria renascimento, envelhecimento e morte. Ao ver dukkha dessa forma, a nossa resistência se desfaz. No momento em que não houver mais repulsa em relação a dukkha, o sofrimento diminuirá muito. É a nossa resistência que cria o desejo de nos livrarmos de dukkha, o que só faz com que ele piore.
Ayya Khema
[ Dukkha para Conhecimento e Visão ]
Podemos aprender o Dhamma da natureza das árvores, por exemplo. Uma árvore nasce devido a causas e cresce seguindo o curso da natureza. Nisso, a árvore está nos ensinando o Dhamma, porém não o entendemos. No seu devido tempo, ela cresce até que brotos, flores e frutos apareçam. Tudo que vemos é a aparência das flores e frutos, somos incapazes de interiorizar e contemplar isso. Por isso não sabemos que a árvore está nos ensinando o Dhamma. O fruto aparece e nós simplesmente o comemos sem investigar: doce, azedo ou salgado, é a natureza da fruta. E esse Dhamma é o ensinamento da fruta. Dando seguimento, as folhas envelhecem. Elas ficam murchas, morrem e depois caem das árvores. Tudo que vemos é que as folhas caíram. Nós pisamos nelas, varremo-las e isso é tudo. Nós não investigamos a fundo, por isso não sabemos que a natureza está-nos ensinando. Mais tarde, as novas folhas brotam e nós vemos somente isso, sem levar o assunto mais adiante. Nós não trazemos essas coisas para dentro das nossas mentes para contemplá-las.
Se pudermos trazer tudo isso para dentro e investigar, veremos que o nascimento de uma árvore e o nosso próprio nascimento não têm diferença. Este nosso corpo nasce e existe dependendo de condições, dos elementos terra, água, ar e fogo. Tendo a sua comida, ele crescerá e crescerá. Todas as partes do corpo mudam e fluem de acordo com a sua natureza. Não existe diferença em relação à árvore; cabelo, unhas, dentes e pele - tudo muda. Se entendermos as coisas da natureza, então entenderemos a nós mesmos.
Ajaan Chah
[ Abrindo o Olho do Dhamma ]
“E o que, bhikkhus, é entendimento incorreto? 'Não existe nada que é dado, nada que é oferecido, nada que é sacrificado; não existe fruto ou resultado de ações boas ou más; não existe este mundo nem outro mundo; não existe mãe, nem pai; nenhum ser que renasça espontaneamente; não existem no mundo brâmanes nem contemplativos bons e virtuosos que, após terem conhecido e compreendido diretamente por eles mesmos, proclamam este mundo e o próximo.' Isto é entendimento incorreto. [2]
“E o que, bhikkhus, é entendimento correto? Entendimento correto, eu digo, tem duas partes: existe o entendimento correto que está sujeito às impurezas, que participa dos méritos, amadurece onde existe apego; e existe o entendimento correto que é nobre, imaculado, supramundano, um elemento do caminho.
“E o que, bhikkhus, é o entendimento correto que está sujeito às impurezas, que participa dos méritos, amadurece onde existe apego? ‘Existe aquilo que é dado e o que é oferecido e o que é sacrificado; existe fruto e resultado de boas e más ações; existe este mundo e o outro mundo; existe a mãe e o pai; existem seres que renascem espontaneamente; existem no mundo brâmanes e contemplativos bons e virtuosos que, após terem conhecido e compreendido diretamente por eles mesmos, proclamam este mundo e o próximo.’ Esse é o entendimento correto que está sujeito às impurezas, que participa dos méritos, amadurece onde existe apego.
“E o que, bhikkhus, é o entendimento correto que é nobre, imaculado, supramundano, um elemento do caminho? A sabedoria, a faculdade da sabedoria, o poder da sabedoria, o fator da iluminação da investigação dos fenômenos, o entendimento correto como elemento do caminho na mente daquele que é nobre, cuja mente é imaculada, que possui o nobre caminho e está desenvolvendo o nobre caminho: esse é o entendimento correto que é nobre, imaculado, supramundano, um elemento do caminho.
[MN 117]
“E o que, bhikkhus, é a faculdade da sabedoria? Neste caso, bhikkhus, o nobre discípulo é sábio; ele possui a completa compreensão da origem e da cessação, que é nobre e penetrante, que conduz ao fim do sofrimento. Ele compreende como na verdade é que: ‘Isto é sofrimento … Esta é a origem do sofrimento … Esta é a cessação do sofrimento … Esse é o caminho da prática que conduz à cessação do sofrimento.’ Essa é chamada a faculdade da sabedoria.
[ SN XLVIII.10]
“Há, bhikkhus, qualidades mentais que são hábeis e inábeis, benéficas e prejudiciais, superiores e inferiores, claras e escuras com as suas contrapartidas: dar com freqüência atenção com sabedoria para isso, esse é o alimento para o surgimento da investigação dos fenômenos como um fator da iluminação que ainda não surgiu ou para o crescimento e incremento da investigação dos fenômenos como fator da iluminação, uma vez que esta tenha surgido.
[ SNXLVI.51]
"Ele me mostrou a luminosidade do mundo."
Assim foi como meu mestre, Ajaan Fuang, certa vez descreveu o seu débito para com o seu mestre, Ajaan Lee. As suas palavras me pegaram de surpresa. Eu havia começado a estudar com ele fazia pouco tempo, recém-saído da escola onde havia aprendido que os Budistas sérios adotavam uma visão negativa, pessimista do mundo. No entanto, aqui se encontrava um homem que havia entregado a sua vida à prática dos ensinamentos do Buda, falando da luminosidade do mundo. É claro que por "luminosidade" ele não estava se referindo aos prazeres das artes, comida, viagens, esportes, vida em família ou qualquer uma das demais seções do jornal de Domingo. Ele se referia a uma felicidade mais profunda que vem de dentro.
Você provavelmente ouviu o rumor de que "a vida é sofrimento" como sendo o primeiro princípio do Budismo, a primeira nobre verdade do Buda. É um rumor com boas credenciais, disseminado por acadêmicos de respeito e mestres do Dhamma, mas apesar disso é um rumor. A verdade sobre as nobres verdades é muito mais interessante. O Buda ensinou quatro verdades - não uma - a respeito da vida: existe o sofrimento, existe uma causa para o sofrimento, existe um fim para o sofrimento e existe um caminho de prática que dá um fim ao sofrimento. Essas verdades, tomadas em conjunto, estão muito longe de serem pessimistas. Elas são uma abordagem prática para solucionar um problema - a maneira como um médico encara uma enfermidade ou um mecânico, um motor defeituoso. Você identifica um problema e investiga as suas causas. Depois, então, você dá um fim ao problema eliminando as suas causas.
O que é especial na abordagem do Buda é que o problema que ele ataca é o sofrimento humano na sua totalidade, e a solução que ele oferece é algo que os seres humanos podem fazer por si mesmos. Da mesma forma como um médico que conhece a cura infalível para o sarampo não teme o sarampo, o Buda não teme nenhum aspecto do sofrimento humano. E, tendo experimentado a felicidade que é completamente não condicionada, ele não teme apontar o sofrimento e estresse inerentes em lugares que a maioria de nós não consegue ver - nos prazeres condicionados aos quais nos apegamos.
Thanissaro Bhikkhu
[ A Vida não é apenas Sofrimento]
O Buda viu que o prazer e a felicidade dos prazeres comuns não são duradouros. Ele queria o prazer e a felicidade, que não tivesse um desenvolvimento igual ao dos prazeres mundanos, que é aquilo que a maioria das pessoas querem. Foi por isso que ele abandonou a sua família e amigos para viver isolado. Ele disse para si mesmo, ‘Eu vim só quando nasci e irei só quando morrer. Ninguém me contratou para nascer e ninguém irá me contratar para morrer, então não devo nada a ninguém. Não há ninguém a quem eu deva temer. Se em todas as minhas ações, houver alguma que seja correta do ponto de vista do mundo, mas incorreta do ponto de vista da verdade – e incorreta do ponto de vista do meu coração – não existe nada que faça com que eu queira realizá-la.’
Então ele se perguntou: ‘Agora que nasci como um ser humano, qual é a coisa mais sublime que você deseja neste mundo?’ Ele então formulou as seguintes condições para a resposta: ‘Ao responder você tem de ser verdadeiramente honesto e sincero com você mesmo. E uma vez que você tiver respondido, você terá de manter a sua resposta como uma lei imutável na qual você tenha afixado o seu selo, sem permitir que um segundo selo seja afixado por cima. Então o que você quer, e como você quer isso? Você tem de dar uma resposta honesta, entendeu? Eu não aceitarei nada falso. E uma vez que você tiver respondido, você tem de permanecer fiel à sua resposta. Não traia a si mesmo.’
Quando ele teve certeza da resposta, ele disse para si mesmo, ‘Eu quero apenas a felicidade e o prazer mais sublimes e seguros: a felicidade que não se transformará em alguma outra coisa. Fora disso, não quero mais nada do mundo.’
Uma vez dada essa resposta, ele se ateve a ela firmemente. Ele não permitiu que nada que pudesse causar o mínimo de dor ou distração no seu coração pudesse ali afixassar-se como uma mácula. Ele manteve um esforço persistente com toda a sua força para descobrir a verdade, sem recuar, até que finalmente ele despertou para essa verdade: a realidade da Libertação.
Ajaan Lee Dhammadharo
[The Honest Truth]
“Se uma pessoa possui fé, Bharadvaja, ela preserva a verdade quando ela diz: ‘Minha fé é assim’; mas ela ainda não chega a esta conclusão definitiva: ‘Somente isso é verdadeiro, todo o restante é falso.’ Dessa forma, Bharadvaja, ocorre a preservação da verdade; dessa forma ela preserva a verdade; dessa forma nós descrevemos a preservação da verdade. Mas até esse ponto não existe a descoberta da verdade.
“Se uma pessoa prefere algo... se ela aceita uma tradição ... se ela chega a uma conclusão baseada na razão ... se ela aceita alguma idéia, ela preserva a verdade quando ela diz: ‘Eu prefiro isso ... aceito esta tradição oral ... cheguei a esta conclusão baseado na razão ... aceito esta idéia’; mas ela ainda não chega a esta conclusão definitiva: ‘Somente isso é verdadeiro, todo o restante é falso.’ Dessa forma, Bharadvaja, ocorre a preservação da verdade; dessa forma ela preserva a verdade; dessa forma nós descrevemos a preservação da verdade. Mas até esse ponto não existe a descoberta da verdade.”
“Dessa forma, Mestre Gotama, ocorre a preservação da verdade; dessa forma uma pessoa preserva a verdade; dessa forma nós reconhecemos a preservação da verdade. Mas de que forma, Mestre Gotama, ocorre a descoberta da verdade? De que forma uma pessoa descobre a verdade? Nós perguntamos ao Mestre Gotama sobre a descoberta da verdade.”
“Aqui, Bharadvaja, um bhikkhu pode estar vivendo na dependência de algum vilarejo ou cidade. Então, um chefe de família, ou o filho de um chefe de família, vai até ele e o examina em relação a três tipos de estados: em relação aos estados baseados na cobiça, em relação aos estados baseados na raiva e em relação aos estados baseados na delusão: ‘Nesse venerável existe algum estado baseado na cobiça ... na raiva ... na delusão, de tal forma que, com a mente obcecada por esse estado e apesar de não saber, ele possa dizer, “Eu sei,” ou sem ver, ele possa dizer, “Eu vejo,” ou ele possa incitar os outros a agirem de forma a causar o próprio dano e sofrimento por muito tempo?’ Ao examiná-lo, ele chega à conclusão: ‘Não existem estados baseados na cobiça ... na raiva ... na delusão neste venerável. O comportamento corporal e o comportamento verbal deste venerável não são aqueles de alguém afetado pela cobiça ... pela raiva ... pela delusão. E o Dhamma que este venerável ensina é profundo, difícil de ser visto e difícil de ser compreendido, pacífico, sublime, que não pode ser alcançado pelo mero raciocínio, sutil, para ser experimentado por um sábio. Este Dhamma não pode ser facilmente ensinado por alguém afetado pela cobiça ... pela raiva ... pela delusão.’
“Ao tê-lo examinado e visto que ele está purificado de estados baseados na delusão, então ele deposita fé nele; cheio de fé ele o visita e o homenageia; tendo homenageado, ele lhe dá ouvidos; ao dar ouvidos, ele ouve o Dhamma; tendo ouvido o Dhamma, ele o memoriza e examina o significado dos ensinamentos que ele memorizou; ao examinar o significado, ele aceita esses ensinamentos com base na reflexão; ao obter a aceitação desses ensinamentos baseado na reflexão, a aspiração brota; quando a aspiração brotou, ele aplica a sua vontade; tendo aplicado a sua vontade, ele examina cuidadosamente; tendo examinado cuidadosamente, ele se esforça; esforçando-se com firmeza, ele compreende a verdade última e a vê, penetrando-a com sabedoria. Dessa forma, Bharadvaja, ocorre a descoberta da verdade; dessa forma uma pessoa descobre a verdade; dessa forma descrevemos a descoberta da verdade.
[ MN 95]
“Portanto, um bhikkhu, possuindo essa sabedoria, possui o supremo fundamento da sabedoria. Pois isso, bhikkhu, é a sabedoria nobre suprema, isto é, o conhecimento da destruição de todo o sofrimento.
"A sua libertação, estando fundamentada na verdade, é inabalável. Pois é falso, bhikkhu, aquilo que possui uma natureza enganosa e é verdadeiro aquilo que possui uma natureza não enganosa - Nibbana. Portanto, um bhikkhu, possuindo essa verdade, possui o supremo fundamento da verdade. Pois isso, bhikkhu, é a verdade nobre suprema, isto é, Nibbana, que possui uma natureza não enganosa.
[ MN 140]
Nosso velho amigo dukkha surge na mente como insatisfação causada por todos os tipos de estímulos. Pode ser disparado pelo desconforto corporal, mas mais freqüentemente é causado pelas próprias aberrações e convulsões da mente. A mente cria dukkha e é por isso que realmente precisamos vigiar e cuidar das nossas mentes.
A nossa própria mente pode fazer com que sejamos felizes, a nossa própria mente pode fazer com que sejamos infelizes. Não existe nenhuma pessoa ou coisa em todo o mundo que possa fazer isso por nós. Todas as ocorrências funcionam para nós como estímulos que constantemente nos pegam de surpresa. Por conseguinte, precisamos desenvolver uma atenção intensa em relação aos nossos momentos mentais.
Dukkha é criado por nós mesmos e perpetuado por nós mesmos. Se formos sinceros no nosso desejo de eliminá-lo, temos de observar a mente com cuidado, para obter o insight daquilo que realmente está ocorrendo no nosso íntimo. O que nos está estimulando? Existem inúmeros estímulos, mas existem apenas duas reações. Uma é a equanimidade e a outra é o desejo.
Ayya Khema
[ Para Controlar a própria Mente]
Se cortarmos um tronco de árvore e o jogarmos num rio e ele não afundar ou apodrecer, nem ficar preso nas margens do rio, esse tronco irá com certeza chegar ao mar. A nossa prática é igual. Se você praticar de acordo com o caminho estabelecido pelo Buda, seguindo-o com rigor, você irá transcender duas coisas. Quais duas? Exatamente os dois extremos que o Buda disse não ser o caminho do verdadeiro meditador - entregar-se ao prazer e entregar-se à dor. Essas são as duas margens no rio. Uma das margens do rio é a raiva, a outra a cobiça. Ou você pode dizer que uma margem é a felicidade e a outra a infelicidade. O "tronco" é a mente. À medida que "fluir rio abaixo" ela irá experimentar a felicidade e a infelicidade. Se a mente não se apegar a essa felicidade ou infelicidade, chegará ao "oceano" de Nibbana. Você deve ver que não existe nada além de felicidade e infelicidade surgindo e desaparecendo. Se você não "ficar preso" nessas coisas, então você estará no caminho de um verdadeiro meditador.
Esse é o ensinamento do Buda. Felicidade, infelicidade, cobiça e raiva simplesmente existem na Natureza de acordo com a invariável lei da natureza. A pessoa sábia não os segue ou estimula, ela não se apega a eles. Essa é a mente que não se entrega ao prazer e não se entrega à dor. É a prática correta. E como aquele tronco de madeira irá finalmente chegar ao oceano, assim também a mente que não se apega a esses dois extremos irá inevitavelmente alcançar a paz.
Ajaan Chah
["> Entendimento Correto - O Lugar da Equanimidade]
“E o que, bhikkhus, é a equanimidade mundana? Existem esses cinco elementos do prazer sensual: formas conscientizadas através do olho... tangíveis conscientizados através do corpo que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostados, conectados com o desejo sensual e que provocam a cobiça. É a equanimidade que surge na dependência desses cinco elementos do prazer sensual que é chamada de ‘equanimidade mundana.’
“E o que, bhikkhus, é a equanimidade não mundana? Com o completo desaparecimento da felicidade, um bhikkhu entra e permanece no quarto jhana, que possui nem felicidade nem sofrimento, com a atenção plena e a equanimidade purificadas. Isso é chamado de ‘equanimidade não mundana.’
“E o que, bhikkhus, é a equanimidade não mundana ainda maior? Quando um bhikkhu que se libertou das impurezas revisa a sua mente livre da cobiça, livre da raiva, livre da delusão, então surge a equanimidade. Isso é chamado de ‘equanimidade não mundana ainda maior.’
[ SN XXXVI.31]
[1] Esta é uma imagem que com freqüência aparece nos textos Budistas. O caminho Budista é comparado com a travessia de um rio, no qual esta margem é samsara e a outra margem é nibbana. [Retorna]
[2] Esta é uma doutrina moral materialista niilista que nega a vida após a morte e a conseqüência de kamma. “Não existe nada que é dado” significa que não existe fruto da generosidade; “não existe este mundo, nem outro mundo” significa que não existe renascimento neste mundo, nem num outro mundo; “não existe mãe, nem pai” significa que não existe fruto da boa conduta ou má conduta em relação à mãe e ao pai. O enunciado sobre contemplativos e brâmanes nega a existência de Budas e arahants. [Retorna]
Revisado: 16 Abril 2013
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