Majjhima Nikaya 140
Dhatuvibhanga Sutta
A Análise dos Elementos
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1.Assim ouvi. Em certa
ocasião, o Abençoado estava perambulando pela região de Magadha e acabou
chegando em Rajagaha. Lá ele se dirigiu até o oleiro Bhaggava e lhe disse:
2. "Se não for
inconveniente para você, Bhaggava, eu ficarei por uma noite na sua
oficina." "Não é nenhum inconveniente para mim, venerável senhor,
porém há um errante que já está residindo lá. Se ele concordar, então fique por
quanto tempo quiser, venerável senhor."
3. Agora, o membro de um
clã com o nome de Pukkusati havia deixado a vida em família e partido para viver a
vida santa por sua fé no Abençoado, e naquela ocasião era ele quem já havia
ocupado a oficina do oleiro.[1] Então o Abençoado foi até Pukkusati e lhe disse: "Se não lhe for inconveniente, bhikkhu, eu
ficarei por uma noite na oficina".
"A oficina é espaçosa, amigo.[2] Que
o venerável fique pelo tempo que quiser."
4. Então o Abençoado entrou
na oficina do oleiro, arrumou uma cobertura de capim a um lado, sentou-se
cruzando as pernas, mantendo seu corpo ereto, colocando a atenção plena à sua
frente. Então o Abençoado passou a maior parte da noite sentado (em meditação)
e Pukkusati também passou a maior parte da noite sentado (em meditação).
Então o Abençoado pensou: "Esse membro
de um clã possui uma conduta que inspira confiança. E se eu o
questionasse?" Assim ele perguntou:
5. "Por dedicação a
quem, bhikkhu, você adotou a vida santa? Quem é o seu mestre? O Dhamma de quem
você professa?"[3]
"Existe, meu amigo, o contemplativo Gotama, um filho
dos Sakyas, que adotou a vida santa deixando um clã Sakya. Agora, acerca desse
contemplativo Gotama existe essa boa reputação: ‘Esse Abençoado é um arahant, perfeitamente iluminado, consumado no verdadeiro conhecimento e conduta,
bem-aventurado, conhecedor dos mundos, um líder insuperável de pessoas
preparadas para serem treinadas, mestre de devas e humanos, desperto,
sublime.’ Eu adotei a vida santa por dedicação a esse Abençoado. Esse Abençoado
é o meu mestre. É o Dhamma desse Abençoado que eu professo."
"Mas,
bhikkhu, onde está agora esse Abençoado – um arahant, perfeitamente iluminado?"
"Existe, meu amigo,
uma cidade nas terras do norte cujo nome é Savatthi. Lá é onde o Abençoado -
um arahant, perfeitamente iluminado – está agora."
"Mas, bhikkhu,
você já viu esse Abençoado antes? Vendo-o, você o reconheceria?"
"Não, amigo, eu nunca vi o Abençoado antes, e não o reconheceria se o
visse."
6. Então o pensamento
ocorreu ao Abençoado: "É por dedicação a mim que este membro de um clã
adotou a vida santa. E se eu lhe ensinasse o Dhamma?" Assim ele disse o
seguinte:
"Bhikkhu, eu lhe
ensinarei o Dhamma. Ouça e preste muita atenção ao que vou dizer."
"Sim, amigo,"
respondeu Pukkusati. O Abençoado disse o seguinte:
7. "Uma pessoa
consiste de seis elementos, seis bases de contato e dezoito tipos de examinação
mental e ela possui quatro fundamentos.[4] As
torrentes das concepções não arrastam aquele que se mantém sobre eles
[fundamentos] e quando as torrentes das concepções não o arrastam ele é chamado um sábio em paz.
A pessoa não deve negligenciar a sabedoria, deve preservar a verdade, deve
cultivar a renúncia e treinar para a paz. Esse é o sumário da análise dos seis
elementos.
8. "'Bhikkhu, uma
pessoa consiste de seis elementos.'[5] Assim
foi dito. Com referência a que foi dito isso? Há o elemento terra, o elemento
água, o elemento fogo, o elemento ar, o elemento espaço, o elemento consciência.
Assim foi com referência a isso que foi dito: ‘Bhikkhu esta pessoa consiste de
seis elementos’.
9. "'Bhikkhu, uma
pessoa consiste de seis bases de contato.' Assim foi dito. Com referência a que
foi dito isso? Há a base de contato do olho, a base de contato do ouvido, a
base de contato do nariz, a base de contato da língua, a base de contato do
corpo e a base de contato da mente. Assim foi com referência a isso que foi
dito: ‘Bhikkhu esta pessoa consiste de seis bases de contato’.
10. "'Bhikkhu, uma pessoa
consiste de dezoito tipos de examinação mental.'[6] Assim foi dito. E com referência a que foi dito isso? Ao ver uma
forma com o olho, ele examina uma forma produtora de alegria, ele examina uma
forma produtora de tristeza, ele examina uma forma produtora de equanimidade.
Ao ouvir um som com o ouvido ... Ao cheirar um aroma com o nariz ... Ao
saborear um sabor com a língua ... Ao tocar um tangível com o corpo ... Ao
conscientizar um objeto mental com a mente, ele examina um objeto mental produtor de
alegria, ele examina um objeto mental produtor de tristeza, ele examina um
objeto mental produtor de equanimidade. Portanto, há seis tipos de examinação
com alegria, seis tipos de examinação com tristeza e seis tipos de examinação
com equanimidade. Assim foi com referência a isso que foi dito: ’Os dezoito
tipos de examinação mental devem ser compreendidos.’
11.
"'Bhikkhu, uma pessoa possui quatro fundamentos.’ Assim foi dito. Com
referência a que foi dito isso? Existe o fundamento da sabedoria, o fundamento
da verdade, o fundamento da renúncia, o fundamento da paz.[7]
Assim foi com referência a isso que foi dito: ‘Bhikkhu esta
pessoa possui quatro fundamentos.’
12."'Uma pessoa não
deve negligenciar a sabedoria, deve preservar a verdade, deve cultivar a
renúncia e deve treinar para a paz'[8] Assim
foi dito. Com referência a que foi dito isso?
13. “Como, bhikkhu, uma
pessoa não negligencia a sabedoria?[9] Há esses
seis elementos: o elemento terra, o elemento água, o elemento fogo, o elemento
ar, o elemento espaço e o elemento consciência.
14. “O que, bhikkhu, é o
elemento terra? O elemento terra pode ser interno ou externo. O que é o
elemento terra interno? Qualquer coisa interna que pertença à pessoa, que seja
sólida, solidificada e pela qual exista apego, isto é, cabelos, pêlos do corpo,
unhas, dentes, pele, carne, tendões, ossos, medula, rins, coração, fígado,
diafragma, baço, pulmões, intestino grosso, intestino delgado, conteúdo do
estômago, fezes ou qualquer outra coisa interna que pertença à pessoa, que seja
sólida, solidificada e pela qual exista apego: é chamada de elemento terra
interno. Agora, tanto o elemento terra interno como o elemento terra externo
são simplesmente elementos terra. E isso deve ser visto como na verdade é, com correta sabedoria:
‘Isso não é meu, isso não sou eu, isso não é o meu eu.’ Quando a pessoa vê
dessa forma, como na verdade é, com correta sabedoria, a pessoa fica desencantada
com o elemento terra e faz com que a mente fique desapegada em reação ao elemento terra.
15. “O que, bhikkhu, é o
elemento água? O elemento água pode ser interno ou externo. Qual é o elemento
água interno? Qualquer coisa interna que pertença à pessoa, que seja liquida,
aquosa e pela qual exista apego, isto é, bílis, fleuma, pus, sangue, suor,
gordura, lágrimas, óleo, saliva, muco, líquido sinovial, urina ou qualquer
outra coisa interna na pessoa, que seja liquida, aquosa e pela qual exista
apego: é chamada de elemento água interno. Agora, tanto o elemento água interno
como o elemento água externo são simplesmente elementos água. E isso deve ser
visto como na verdade é, com correta
sabedoria: ‘Isso não é meu, isso não sou eu, isso não é o meu eu.’ Quando a
pessoa vê dessa forma, como na verdade é, com correta sabedoria, a pessoa fica
desencantada com o elemento água e faz com que a mente fique desapegada em
reação ao elemento água.
16. “O que, bhikkhu, é o
elemento fogo? O elemento fogo pode ser interno ou externo. Qual é o elemento
fogo interno? Qualquer coisa interna que pertença à pessoa, que seja fogo,
ardente e pela qual exista apego, isto é, aquilo pelo qual a pessoa é aquecida,
envelhece e é consumida, aquilo pelo qual o que é comido, bebido, consumido e
saboreado é digerido da maneira adequada ou qualquer outra coisa interna na
pessoa, que seja fogo, ardente e pela qual exista apego: é chamada de elemento
fogo interno. Agora, tanto o elemento fogo interno como o elemento fogo externo
são simplesmente elementos fogo. E isso deve ser visto como na verdade é, com correta sabedoria:
‘Isso não é meu, isso não sou eu, isso não é o meu eu.’ Quando a pessoa vê
dessa forma, como na verdade é, com correta sabedoria, a pessoa fica
desencantada com o elemento fogo e faz com que a mente fique desapegada em
relação ao elemento fogo.
17. “O que, bhikkhu, é o
elemento ar? O elemento ar pode ser interno ou externo. Qual é o elemento ar
interno? Qualquer coisa interna, que pertença à pessoa, que seja ar, arejada e
pela qual exista apego, isto é, ventos que sobem, ventos que descem, ventos no
estômago, ventos nos intestinos, ventos que percorrem o corpo, a inspiração e a
expiração ou qualquer outra coisa interna na pessoa que seja ar, arejada e pela
qual exista apego: é chamada de elemento ar interno. Agora, tanto o elemento ar
interno como o elemento ar externo são simplesmente elementos ar. E isso deve
ser visto como na verdade é, com correta
sabedoria: ‘Isso não é meu, isso não sou eu, isso não é o meu eu.’ Quando a
pessoa vê dessa forma, como na verdade é, com correta sabedoria, a pessoa fica
desencantada com o elemento ar e faz com que a mente fique desapegada em
relação ao elemento ar.
18. “O que, bhikkhu, é o
elemento espaço? O elemento espaço pode ser interno ou externo. Qual é o
elemento espaço interno? Qualquer coisa interna na pessoa, que seja espaço,
espacial e pela qual exista apego, isto é, os buracos das orelhas, as narinas,
a boca e a abertura através da qual tudo o que é comido, bebido, consumido e
saboreado, engolido e agrupado é excretado por baixo; ou qualquer outra coisa
interna na pessoa, que seja espaço, espacial e pela qual exista apego: é
chamada de elemento espaço interno. Agora, ambos, o elemento espaço interno e o
elemento espaço externo são simplesmente propriedades do espaço. E isso deve
ser visto como na verdade é, com correta
sabedoria: ‘Isso não é meu, isso não sou eu, isso não é o meu eu.’ Quando a
pessoa vê dessa forma, como na verdade é, com correta sabedoria, a pessoa fica
desencantada com o elemento espaço e faz com que a mente fique desapegada em
relação ao elemento espaço.
19. "Então resta
somente a consciência, purificada e luminosa.[10] O que a pessoa conscientiza com essa consciência? A pessoa conscientiza: ‘Isto é prazer’. A pessoa conscientiza: ‘Isto é
dor’. A pessoa conscientiza: ‘Isto é nem prazer, nem dor’. Na dependência de um
contato que é para ser sentido como prazer, surge a sensação de prazer.[11] Quando sente uma sensação de prazer, a
pessoa compreende que ‘Eu estou sentindo uma sensação de prazer’. A pessoa
compreende que ‘Com a cessação desse mesmo contato que é para ser sentido como
prazer, a sensação concomitante – a sensação de prazer que surgiu na
dependência do contato que é para ser sentido como prazer – cessa, é
silenciada.' Na dependência de um contato que é para ser sentido como dor ...
Na dependência de um contato que é para ser sentido nem como prazer nem como
dor, surge a sensação nem de prazer nem de dor. Quando sente uma sensação nem
de prazer nem de dor, a pessoa compreende que ‘Eu estou sentindo uma sensação
nem de prazer nem de dor’. A pessoa compreende que ‘Com a cessação desse
mesmo contato que é para ser sentido como nem prazer, nem dor, a sensação
concomitante – a sensação nem de prazer nem de dor que surgiu na dependência do
contato que é para ser sentido nem como prazer nem como dor – cessa, é
silenciada.'
"Bhikkhu, assim como
do contato e fricção de dois gravetos, o calor é gerado e o fogo aparece e da
separação e disjunção desses mesmos gravetos, o calor concomitante cessa, é
silenciado; da mesma forma na dependência de um contato que é para ser sentido
como prazer, surge a sensação de prazer … Na dependência de um contato que é
para ser sentido como dor ... Na dependência de um contato que é para ser
sentido nem como prazer nem como dor, surge uma sensação nem de prazer nem de
dor ... A pessoa compreende que ‘Com a cessação desse contato que é para ser
sentido nem como prazer nem como dor, a sensação concomitante ... cessa, é
silenciada.'
20. "Então resta
somente a equanimidade, purificada e luminosa, flexível, maleável e luminosa.[12] Suponha, bhikkhu, que um ourives habilidoso
ou seu aprendiz preparasse uma fornalha, aquecesse um cadinho, e tomando ouro
com um par de tenazes, o colocasse no cadinho. Ele sopraria periodicamente,
borrifaria água periodicamente, examinaria periodicamente. Esse ouro se
tornaria purificado, bem refinado, perfeitamente puro, sem defeitos, livre de
impurezas, flexível, maleável e luminoso. Então, qualquer ornamento que o ourives queira fazer,
quer seja uma diadema, brincos, um colar ou uma corrente, o ouro serviria aos
seus propósitos. Da mesma forma, bhikkhu, resta
somente equanimidade: purificada e luminosa, flexível, maleável e luminosa.
21. “Ele compreende que:
‘Se eu fosse direcionar esta equanimidade assim purificada e luminosa, para a
base do espaço infinito e conseqüentemente desenvolver a mente dessa forma, então
essa minha equanimidade, suportada por essa base, apegando-se a ela,
permaneceria ali por muito tempo.[13] Ele
compreende que: ‘Se eu fosse direcionar esta equanimidade assim purificada e
luminosa, para a base da consciência infinita … a base do nada … a base da nem
percepção nem não percepção, e conseqüentemente desenvolver a mente dessa
forma, então essa minha equanimidade, suportada por essa base, apegando-se a
ela, permaneceria ali por muito tempo.'
22. “Ele
compreende que: ‘Se eu fosse direcionar esta equanimidade assim purificada e
luminosa, para a base do espaço infinito e conseqüentemente desenvolver a mente
dessa forma, isso seria condicionado.[14] Se
eu fosse direcionar esta equanimidade assim purificada e luminosa, para a base
da consciência infinita … a base do nada … a base da nem percepção nem não
percepção, e conseqüentemente desenvolver a mente dessa forma, isto seria
condicionado.’ Ele não forma nenhuma condição ou não gera nenhuma volição com o propósito
de ser/existir ou não ser/existir.[15] Já
que ele não forma nenhuma condição ou não gera nenhuma volição com o propósito de
ser/existir ou não ser/existir, ele não se apega a nada neste mundo. Não se
apegando, ele não fica agitado. Sem estar agitado, ele realiza Nibbana. Ele
compreende que ‘O nascimento foi destruído, a vida santa foi vivida, o que
deveria ser feito foi feito, não há mais vir a ser a nenhum estado.'[16]
23.
"Se ele sente uma sensação de prazer,[17] ele
compreende: ‘É impermanente; não há que agarrá-la; não existe prazer nela’. Se
ele sente uma sensação de dor, ele compreende: ‘É impermanente; não há que
agarrá-la; não existe prazer nela’. Se ele sente uma sensação nem de prazer nem
de dor, ele compreende: ‘É impermanente; não há que agarrá-la; não existe
prazer nela’.
24. "Se ele sente uma
sensação de prazer, ele a sente com imparcialidade; Se ele sente uma sensação de dor, ele a sente
com imparcialidade; Se ele sente uma sensação nem de prazer nem de dor, ele a
sente com imparcialidade. Quando ele sente uma sensação que dá um fim ao corpo,
ele compreende: ‘Eu estou sentindo uma sensação que dá um fim ao corpo.’ Quando ele sente uma
sensação que dá um fim à vida, ele
compreende: ‘Eu estou sentindo uma sensação que dá um fim à vida.’ [18] Ele compreende: ‘Com a dissolução do corpo,
com o fim da vida, tudo que é sentido, não sendo deleitado, irá esfriar
exatamente ali.’ [19] Bhikkhu, é igual a uma
lamparina que queima por força do óleo e do pavio, e se o óleo e o pavio
acabam, a chama se extingue por falta de combustível; da mesma forma quando ele
sente uma sensação que dá um fim ao corpo ... uma sensação que dá um fim à
vida, ele compreende: ‘Eu estou sentindo uma sensação que dá um fim à vida.’
Ele compreende: ‘Com a dissolução do corpo, com o fim da vida, tudo que é
sentido, não sendo deleitado, irá esfriar exatamente ali.’
25. “Portanto um bhikkhu,
possuindo essa sabedoria, possui o supremo fundamento da sabedoria. Pois isso,
bhikkhu, é a nobre sabedoria suprema, isto é, o conhecimento da destruição de
todo o sofrimento. [20]
26. "A sua libertação, estando fundamentada na verdade, é inabalável.
Pois é falso, bhikkhu, aquilo que possui uma natureza enganosa e é verdadeiro
aquilo que possui uma natureza não enganosa - Nibbana. Portanto, um bhikkhu,
possuindo essa verdade possui o supremo fundamento da verdade. Pois isso,
bhikkhu, é a nobre verdade suprema, isto é, Nibbana, que possui uma natureza
não enganosa.
27. “Antes, quando ele era
ignorante, ele adquiriu e desenvolveu aquisições; [21] agora ele as abandonou, cortou pela raiz, fez como com um tronco
de palmeira eliminando-as de tal forma que não estarão mais sujeitas a um
futuro surgimento. Portanto um bhikkhu possuindo essa renúncia possui o supremo
fundamento da renúncia. Pois isso, bhikkhu, é a nobre renúncia suprema, isto é
a renúncia a todas as aquisições.
28. “Antes, quando ele era
ignorante, ele experimentou a cobiça, desejo e paixão; agora ele os abandonou, cortou pela raiz, fez
como com um tronco de palmeira eliminando-os de tal forma que não estarão mais
sujeitos a um futuro surgimento. Antes, quando ele era ignorante, ele
experimentou a raiva, má vontade e ódio; agora ele os abandonou, cortou pela
raiz, fez como com um tronco de palmeira eliminando-os de tal forma que não
estarão mais sujeitos a um futuro surgimento. Antes, quando ele era ignorante,
ele experimentou a ignorância e a delusão;
agora ele os abandonou, cortou pela raiz, fez como com um tronco de
palmeira eliminando-os de tal forma que não estarão mais sujeitos a um futuro
surgimento. Portanto um bhikkhu possuindo essa paz possui o supremo fundamento
da paz. Pois isso, bhikkhu, é a nobre paz suprema, isto é a pacificação da
cobiça, raiva e delusão.
29. “Assim foi com
referência a isso que foi dito: ‘Ele não deve negligenciar a sabedoria, deve
preservar a verdade, deve cultivar a renúncia e deve treinar para a paz.’
30. “As torrentes das
concepções não arrastam aquele que se mantém sobre eles (fundamentos) e quando
as torrentes das concepções não o arrastam ele é chamado um sábio em paz.’ [22] Assim foi dito. E com referência a que foi
dito isso?
31.
“Bhikkhu, 'Eu sou’ é uma concepção; 'Eu sou isto' é uma concepção; 'Eu serei’ é
uma concepção. 'Eu não serei' é uma concepção; 'Eu possuirei forma' é uma
concepção; 'Eu não possuirei forma' é uma concepção; 'Eu serei perceptivo' é
uma concepção; 'Eu serei não perceptivo' é uma concepção; 'Eu serei nem
perceptivo, nem não perceptivo' é uma concepção. A concepção é uma enfermidade,
a concepção é um câncer, a concepção é uma flecha. Superando todas as
concepções, se diz que ele é um sábio em paz. E um sábio em paz não nasce, não
envelhece, não morre, não é agitado e está livre de desejos. Pois não existe
nada presente nele pelo qual ele possa renascer.[23] Não nascendo, como poderá envelhecer? Não envelhecendo, como
poderá morrer? Não morrendo, como ficará agitado? Não ficando agitado, o que
irá desejar?
32. “Portanto foi com
referência a isso que foi dito: 'As torrentes das concepções não arrastam
aquele que se mantém sobre eles [fundamentos] e quando as torrentes das
concepções não o arrastam ele é chamado
um sábio em paz.’ Bhikkhu, mantenha presente na sua mente esta breve análise
dos seis elementos."
33. Após o que Pukkusati pensou: "Certamente o Mestre está comigo! Certamente o Abençoado
está comigo! Certamente, o Iluminado está comigo!" Erguendo-se do seu
assento, arrumando seu manto sobre um ombro, e curvando-se com a sua cabeça aos
pés do Abençoado, ele disse, "Venerável senhor, uma transgressão foi
cometida por mim, em que como um tolo, confuso e atrapalhado em assumir que era
adequado dirigir-me ao Abençoado como ‘amigo’. Venerável senhor, que o
Abençoado perdoe a minha transgressão, de forma que eu possa me conter no
futuro."
"Com certeza, bhikkhu,
uma transgressão foi cometida por você, em que como um tolo, confuso e
atrapalhado em assumir que era adequado dirigir-se a mim como ‘amigo’. Porém
como você vê a sua transgressão como tal e a corrige de acordo com o Dhamma,
nós o perdoamos. Pois é motivo para crescer na Disciplina do Abençoado quando
vendo uma transgressão, a pessoa faz a correção de acordo com o Dhamma e exerce
contenção no futuro."
34. “Venerável senhor, eu
receberia a admissão completa sob o Abençoado.”
“Mas os seus mantos e tigela
estão completos?”
“Venerável senhor, meus mantos e tigela não estão completos.”
“Bhikkhu, os Tathagatas não dão admissão completa para aqueles cujos mantos e
tigela não estão completos.”
35. Então Pukkusati,
tendo ficado satisfeito e contente com as palavras do Abençoado, levantou-se do
seu assento e depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita, saiu
em busca de mantos e uma tigela. Então, enquanto ele procurava pelos mantos e
tigela, uma vaca descontrolada o matou.
36. Então um grande número
de bhikkhus foram até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentaram a um lado
e disseram: "Venerável senhor, o membro de um clã Pukkusati, a quem o
Abençoado instruiu com um ensino sumário, morreu. Qual o seu destino? Qual o
seu percurso futuro?"
"Bhikkhus, o membro de
um clã Pukkusati era sábio. Ele praticava de acordo com o Dhamma e não me
causou problemas na interpretação do Dhamma. Com a destruição dos cinco
primeiros grilhões, ele renasceu espontaneamente (nas Moradas Puras) e lá irá
realizar o parinibbana sem nunca mais retornar desse mundo." [24]
Isso foi o
que o Abençoado disse. Os bhikkhus
ficaram satisfeitos e contentes com as palavras do Abençoado.
Notas:
[1] De acordo com MA, Pukkusati havia sido rei em Gandhara, com a capital em Takkasila, e ele fez
amizade com o rei Bimbisara de Magadha através de mercadores que viajavam entre
os dois reinos para comerciar. Em uma troca de presentes Bimbisara enviou a
Pukkusati folhas de ouro nas quais haviam sido gravadas descrições das Três Jóias e
ensinamentos do Dhamma, entre eles a prática da atenção plena na respiração.
Quando Pukkusati leu as inscrições, ele sentiu uma
imensa alegria e felicidade, e decidiu praticar a atenção plena na respiração, depois disso renunciando ao mundo.
Sem tomar uma ordenação formal,
ele raspou a cabeça, vestiu mantos de cor ocre e deixou o palácio. Ele foi para
Rajagaha com a intenção de encontrar o Buda que naquela ocasião se encontrava
em Savathi, distante cerca de 500 quilômetros. O Buda viu Pukkusati com os seus
poderes de clarividência e vendo nele a capacidade de alcançar os caminhos supramundanos
e os seus frutos, viajou sozinho a pé até Rajagaha para encontrá-lo. Para
evitar ser reconhecido, por um ato da sua vontade, o Buda escondeu os seus
atributos físicos especiais tais como as marcas de um Grande Homem e apareceu
tal como um monge errante comum. Ele chegou na cabana do oleiro pouco tempo
depois que Pukkusati havia chegado, com a intenção de partir para Savathi no
próximo dia para se encontrar com o Buda. [Retorna]
[2] Pukkusati, sem saber que quem havia chegado era o Buda, emprega o
termo familiar “avuso” para dirigir-se a ele. [Retorna]
[3] MA: O Buda faz essas perguntas apenas como uma forma de iniciar a
conversa pois ele já sabia que Pukkusati havia seguido a vida santa por conta própria.
[Retorna]
[4] MA: Já que Pukkusati havia realizado a prática preliminar do caminho
e era capaz de alcançar o quarto jhana através da atenção plena na respiração,
o Buda iniciou diretamente com um discurso acerca da meditação de insight,
expondo o vazio último que é o fundamento para o estado de arahant. [Retorna]
[5] MA: Aqui o Buda explica o que na verdade não existe através daquilo
que na verdade existe; pois os elementos na verdade existem mas a pessoa na
verdade não existe. Este é o significado: “Aquilo que você percebe como sendo
uma pessoa consiste de seis elementos. Em última instância não existe uma
pessoa. ‘Pessoa’ é um mero conceito”. [Retorna]
[6] Como no MN 137.8. [Retorna]
[7] Paññadhitthana, saccadhitthana, cagadhitthana, upasamadhitthana.
Nanamoli havia originalmente interpretado adhitthana como “determinação”
e depois a substituiu com ”modo de expressão”, nenhuma das quais parece
adequada neste contexto. MA interpreta a palavra com patittha, que
claramente quer dizer fundamento e explica o significado da frase da seguinte
forma: “Esta pessoa, que consiste dos seis elementos, das seis bases de contato
e dos dezoito tipos de examinação mental – quando ela se afasta deles e alcança
o estado de arahant, a realização suprema, ela assim o faz estabelecida sobre
esses quatro fundamentos”. Os quatro fundamentos serão elucidados
individualmente na seqüência, versos 12-29. [Retorna]
[8] MA: Desde o início a pessoa não deve negligenciar a sabedoria
originada da concentração e insight de modo a penetrar a sabedoria do fruto do
estado de arahant. A pessoa deve preservar a linguagem que corresponda à
verdade de forma a realizar Nibbana, a verdade última. A pessoa deve cultivar o
abandono de todas as contaminações de forma a abandonar todas as contaminações
através do caminho de arahant. Desde o início a pessoa deve treinar a
pacificação de todas as contaminações de forma a pacificar as contaminações
através do caminho de arahant. [Retorna]
[9] MA: Não negligenciar a sabedoria é explicado através da meditação
dos elementos. Neste caso a análise dos elementos é idêntica ao do MN 28.6, 11, 16, 21 e MN 62.8-12.
[Retorna]
[10] MA: Este é o sexto elemento, que “resta” no sentido de que ainda
falta ser explicado pelo Buda e penetrado por Pukkusati. Aqui é explicado como
a consciência que realiza o trabalho da contemplação de insight dos
elementos. Sob o título de consciência, também é introduzida a contemplação das
sensações. [Retorna]
[11] Este trecho mostra a condicionalidade da sensação e a sua
impermanência através da cessação da sua condição. [Retorna]
[12] MA identifica isto como sendo a equanimidade do quarto jhana. De
acordo com MA, Pukkusati já tinha alcançado o quarto jhana e lhe tinha um forte
apego. O Buda inicialmente elogia essa equanimidade para inspirar confiança em
Pukkusati, então gradualmente ele o conduz às realizações imateriais e a alcançar
os caminhos supramundanos e os seus frutos. [Retorna]
[13] O sentido é: se ele alcança a base de espaço infinito e falece
estando ainda apegado a ela, ele renasce no mundo correspondente e
vive ali pelo período de 20.000 éons. Nos três mundos imateriais superiores o período de vida é
respectivamente de 40.000, 60.000 e 84.000 éons. [Retorna]
[14] MA: Isto é dito de forma a mostrar o perigo das realizações imateriais.
Por esta frase, “Isso seria condicionado,” ele mostra que: “Apesar de que ali o
período de vida são 20.000 éons, isso é condicionado, fabricado,
composto. Dessa forma é impermanente, instável, que não dura, transitório. Está
sujeito ao falecimento, rompimento e dissolução; está envolvido com o
nascimento, envelhecimento e morte, enraizado no sofrimento. Não é um abrigo,
um lugar seguro, um refúgio. Tendo falecido ali na condição de mundano, ainda
assim ele poderá renascer num dos quatro estados de privação.” [Retorna]
[15] So n’eva abhisankharoti nabhisancetayati bhavaya va vibhavaya. Os
dois verbos sugerem a noção da volição como aquilo que mantém a continuidade
da existência condicionada. Cessando a volição de ser ou de não ser, mostra
a extinção do desejo pela existência eterna e pela aniquilação, culminando no
estado de arahant. Veja também o It.49. [Retorna]
[16] MA diz que neste ponto Pukkusati havia penetrado três caminhos e
frutos, tornando-se um ‘que não retorna’. Ele se deu conta de que o seu mestre
era o próprio Buda, mas ele não podia expressar o que havia compreendido pois o
Buda ainda continuava com o discurso. [Retorna]
[17] Este trecho mostra o arahant permanecendo no elemento Nibbana com algum
resíduo restante (dos fatores da existência condicionada, sa-upadisesa
nibbanadhatu). Embora ele continue experimentando sensações, ele está livre
da cobiça por sensações prazerosas, da aversão por sensações dolorosas e da
ignorância em relação a sensações neutras. [Retorna]
[18] Isto é, ele continua a experimentar as sensações enquanto o corpo
com as suas faculdades vitais existir, mas não além disso. [Retorna]
[19] Isto se refere ao elemento Nibbana sem deixar nenhum resíduo (anupadisesa
nibbanadhatu) – a cessação de toda a existência condicionada. [Retorna]
[20] Isto completa a explicação do primeiro fundamento, que teve início
no verso 13. MA diz que o conhecimento da destruição de todo o sofrimento é a
sabedoria que pertence ao fruto do estado de arahant. [Retorna]
[21] MA menciona quatro tipos de aquisições (upadhi) – os
agregados, as contaminações, as formações volitivas, os prazeres sensuais. [Retorna]
[22] As “torrentes das concepções” (mannussava), como será
mostrado no parágrafo seguinte, são pensamentos e noções que se originam das
três fontes das concepções - desejo, presunção e idéias. O “sábio em paz” (muni
santo) é o arahant. [Retorna]
[23] Aquilo que não está presente nele é o desejo por ser, que conduz
aqueles que não o erradicaram de regresso a um novo nascimento após a morte. [Retorna]
[24] MA diz que ele renasceu na Morada Pura denominada Aviha e realizou
o estado de arahant tão pronto ali renasceu. [Retorna]
Revisado: 16 Abril 2013
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