Acender o Fogo
Por
Venerável Webu Sayadaw
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WEBU SAYADAW: Vocês tomaram
os preceitos de virtude, agora pratiquem-nos. Somente quando a sua prática dos
preceitos de virtude (sila) for
aperfeiçoada, vocês poderão satisfazer a aspiração pelo Despertar. Tendo se
aperfeiçoado dentro dos preceitos de virtude, vocês devem realizar várias
outras práticas meritórias e essas irão conduzí-los ao pináculo e à realização
das suas aspirações.
Os ensinamentos do Buda
estão entesourados no Tipitaka. Esses ensinamentos não foram dados pelo Buda
apenas para serem pregados e estudados. Vocês são pessoas boas, e devem
praticar os ensinamentos com esforço inquebrantável a partir do momento em que
os receberam de forma a escapar deste sofrimento.
Não se deixem confundir
pelos ensinamentos. Não precisamos saber muitas técnicas, apenas uma, que deveremos
compreender com clareza. Se estabelecermos uma técnica com esforço concentrado
e eliminarmos todas as dúvidas, então, sem perguntar a mais ninguém,
encontraremos as respostas.
Escolha uma técnica e
pratique com tenacidade. Se você focar a sua mente no pequeno ponto onde o ar
toca ao inspirar e expirar, então não existirá a cobiça nem a aversão, nem a delusão, e com a
ausência delas, você estará de imediato sem sofrimento.
Assim, por um breve momento
a sua mente estará pura. Agora, se nesse instante surgisse o seu último momento
de consciência e você morresse, haveria alguma coisa com a qual se preocupar ou
temer?
Os benefícios que se
acumulam desta prática não duram apenas um breve momento ou por uma vida. Esse
breve momento de pureza irá trazer benefícios pelo restante do ciclo de morte e
renascimento. E porque você é capaz de realizar isso? Porque o momento é
correto, a sua forma de existência é correta e você está colocando o esforço
correto.
Os discípulos do Buda
receberam essa prática do Mestre e se empenharam com perseverança resoluta.
Assim, eles alcançaram o despertar ao qual aspiravam.
Como eles se empenhavam? Do
mesmo modo que um homem que quisesse acender um fogo com um graveto, como nos
tempos passados. Ele esfregava dois gravetos um contra o outro e o calor era
produzido. Depois de um certo tempo os gravetos produziriam tanto calor que o
fogo poderia ser acendido. Portanto, se alguém quisesse acender um fogo dessa
forma e esfregasse dois gravetos de madeira um contra o outro, ele contaria:
“Uma esfregada, duas esfregadas, três esfregadas...”?
Discípulo: Não, senhor,
desse modo não iria funcionar.
Sayadaw: Como ele deveria
fazer então?
D: Ele deveria esfregá-los
de forma contínua até obter uma chama.
S: Sim, quando naqueles
tempos eles precisavam acender um fogo essa era a única forma de fazê-lo. Eles
precisavam esfregar com forte determinação e sem interrupção. Agora, se alguém
esfregasse dois gravetos de madeira dessa forma, quanto tempo demoraria para
acender o fogo?
D: Quando estiver quente o
suficiente, o fogo irá começar, senhor.
S: Isso demora muito?
D: Não muito tempo, senhor.
S: Não, se essa pessoa
trabalhar com determinação, não irá demorar muito tempo. É exatamente o mesmo
com essa nossa prática. Você quer fogo. Você sabe que se esfregar dois gravetos
de madeira irá obter fogo. Agora, se você contar, “Uma esfregada, duas
esfregadas...” irá ficar um pouco quente. E então você descansa um pouco. Você
irá acender o fogo?
D: Não, senhor.
S: OK, então você começa
outra vez, uma duas, três vezes...e mais uma vez o calor é produzido. Então
você se deita novamente para descansar. Você irá acender o fogo?
D: Não, senhor.
S: E se você continuar
agindo assim durante um mês inteiro?
D: Não iremos obter fogo.
S: E se você continuar
agindo assim durante todo um ano?
D: Apenas irá esquentar,
senhor, mas não haverá fogo.
S: Agora, e se você
trabalhasse dessa forma durante cem anos?
D: Apenas irá esquentar,
senhor.
S: Nesse caso, esses dois
gravetos não contêm fogo?
D: Contêm fogo, senhor, mas
o esforço e a perseverança não são suficientes.
S: É o mesmo com a sua
tarefa. Vocês têm que trabalhar como a pessoa que quer obter fogo, sem
descanso. Em pouco tempo irá ficar quente e depois, sem tardar muito, o fogo
irá acender. Somente então vocês poderão usar o fogo como quiserem. Vocês devem
todos se esforçar para realizar a aspiração pelo despertar. Vocês receberam os
ensinamentos do Buda. Agora vocês têm que se empenhar de modo que o seu esforço
seja igual ao daqueles sábios do passado que alcançaram o objetivo. Os
ensinamentos do Buda são o único caminho para eliminar o sofrimento, e vocês só
poderão praticá-los quando um Buda tiver surgido e enquanto os ensinamentos
dele estiverem disponíveis. Quando os ensinamentos de um Buda não estiverem
mais disponíveis, vocês não serão capazes de realizar a aspiração de alcançar
Nibbana.
Quando um Buda surge no
mundo, a conduta correta (carana) e o entendimento (vijja) que
conduzem ao fim do sofrimento são expostos. Se você aproveitar essa
oportunidade e colocá-los em prática, você se tornará perfeito. A conduta
correta também pode ser praticada quando os ensinamentos do Buda não estiverem
disponíveis, mas o insight ou o entendimento não estarão disponíveis.
O que exatamente
significa conduta correta? Agora que os
ensinamentos do Buda estão disponíveis, todos vocês, incansavelmente, dão aos
monges os quatro requisitos de alimento, mantos, moradia e medicamentos. Ao
dar, vocês oferecem o melhor que podem. Mas ainda assim vocês não ficam
satisfeitos; vocês querem fazer sempre mais. Essa é a conduta correta (carana).
Para praticar os
ensinamentos do Buda até o ponto em que sejamos capazes de dar fim a todo o
sofrimento, temos que estar atentos a um único objeto de forma contínua, sem
trégua ou interrupção. Se estivermos atentos dessa maneira, estaremos
praticando o entendimento (vijja).
Praticando ambos em
conjunto e com o esforço perfeito, os sábios de antigamente alcançaram o
despertar ao qual aspiravam.
Vocês podem pensar, “Bem, faremos
oferendas para os ensinamentos dando alimentos, vestimentas, moradia e
medicamentos para os monges. Para compreender os ensinamentos por nós mesmos
teríamos que praticar insight. Faremos isso se tivermos algum tempo livre
depois de preparar as nossas oferendas.” Agora se vocês agirem dessa forma,
vocês estarão praticando a conduta correta ou insight?
D: É conduta correta,
senhor.
S: Se depois de satisfizer
as suas obrigações, vocês mantiverem as mentes focadas com firmeza num único
objeto, o que vocês estarão praticando?
D: Sabedoria, senhor.
S: Então, o que aconteceu
com a conduta correta? Ao focar a atenção num único objeto, vocês estão
praticando a conduta correta?
D: Sim, senhor, neste caso
estaremos praticando a conduta correta e o entendimento ao mesmo tempo.
S: Sim, vocês podem
praticá-los juntos. Primeiro vocês preparam a refeição e depois vocês meditam.
Portanto, precisamos nos aperfeiçoar nas duas práticas, em conduta correta e
entendimento. Mas primeiro vocês praticam apenas a conduta correta e depois
apenas o entendimento. Não é possível praticar esses emancipáveis ensinamentos
do Buda de forma simultânea? Não é possível estar atento à inspiração e
expiração mesmo ao preparar comida ou construir um monastério?
D: É possível, senhor.
S: Como vocês podem ver, é
assim que os sábios discípulos do Buda costumavam praticar. Eles eram hábeis em
aceitar bons conselhos e instruções. Vocês crêem que eles poderiam ter pensado,
“Nossos pais, que são aquilo de mais precioso que temos e para os quais temos uma
imensa dívida de gratidão, estão ficando velhos. Temos que ficar noite e dia
cuidando deles, portanto não podemos meditar”?
D: Senhor, alguns devem ter
pensado dessa forma.
S: A realização das
responsabilidades para com os pais está compreendida na conduta correta ou no
entendimento?
D: É conduta correta,
senhor.
S: Não é possível estar
consciente da mentalidade-materialidade (nome e forma) enquanto se cuida dos pais?
D: É possível, senhor.
S: Agora que vocês sabem
que os sábios do passado praticavam a conduta correta e o entendimento de forma
simultânea, vocês ainda crêem ser impossível praticar o entendimento enquanto
cuidam dos seus filhos ou netos? Vocês não são capazes de treinar a mente na
atenção sobre a mentalidade-materialidade (nome e forma) ao mesmo tempo em que realizam as
suas tarefas? Onde quer que vocês estejam, o que quer que vocês façam, vocês
podem praticar a conduta correta e meditação ao mesmo tempo. Quando os seu
filhos se portam bem, vocês podem estar atentos à inspiração e expiração e
quando eles se portam mal e vocês têm que repreendê-los vocês também podem
praticar. Diga-me, o que significa repreender os seus filhos?
D: É conduta correta,
senhor.
S: Portanto, se vocês
praticarem a atenção ao repreendê-los, o que estarão praticando?
D: Entendimento, senhor.
S: Se praticarmos a atenção
enquanto fizermos o que precisamos fazer, iremos sofrer? Nos custa algo?
Perturba o nosso trabalho?
D: Não, senhor, se a pessoa
age com atenção o trabalho é completado com maior rapidez.
S: Se vocês não se
permitirem ficar distraídos, irão trabalhar com mais rapidez e ganharão mais
dinheiro. A sua aspiração por Nibbana também será realizada com mais rapidez.
Todos os seres que praticam dessa forma são capazes de realizar as suas
aspirações. Não existe um único instante em que não seja possível vocês realizarem
as suas aspirações. E o que acontece com aqueles seres humanos, devas e brahmas
que não praticam os ensinamentos do Buda embora o momento seja correto? Eles
irão realizar as suas aspirações?
D: Aqueles que não se
esforçam não realizarão as suas aspirações, senhor.
S: Porque? É porque eles
não renasceram no plano de existência correto ou porque não é o momento
correto?
D: Não, senhor, mas por que
sem o esforço nada pode ser alcançado.
S: Talvez eles não tenham parami
(perfeições espirituais) suficientes?
D: Talvez alguns não possam
compreender os ensinamentos porque não realizaram as suas perfeições o
suficiente no passado, senhor.
S: Mas se vocês não se
esforçarem, mesmo assim poderão dizer que não compreendem devido à falta de parami?
D: Aqueles que acumularam
perfeições no passado podem alcançar os níveis de realização espiritual até
Nibbana ao ouvir os ensinamentos. Mas nós, senhor, como não temos perfeições,
ouvimos o Dhamma constantemente mas permanecemos os mesmos.
S: Os sábios de antigamente
eram como pessoas sedentas. Eles estavam sedentos e por isso procuraram por
água. E quando a encontraram, o que fizeram? Eles olharam para o céu e
disseram, “Bem, nós ainda não queremos tomar essa água”? Não, eles eram pessoas
que estavam realmente sendentas. E quanto a vocês? Vocês receberam os
ensinamentos do Buda; vocês beberam esses ensinamentos de imediato?
D: Senhor, nós esperamos e
hesitamos.
S: Nesse caso, não é
verdade que vocês não tenham parami. Se vocês não beberem, a sua sede
não será saciada. O que vocês farão ao descobrirem que estão sentados ao lado
do jarro d´água?
D: Como não temos parami
suficiente, ficamos apenas ali sentados, senhor.
S: O que vocês fariam se
caminhassem para dentro de um lago repleto d´água?
D: Ao entrarmos na água
esticaríamos nossos pescoços e voltaríamos a cara para o céu, senhor. E se
quiséssemos mergulhar, senhor, fecharíamos a boca com firmeza.
S: Agora, vocês ainda assim
continuam dizendo que estão com sede mas que não possuem o entendimento
necessário para serem capazes de beber?
D: Senhor, como não temos o
necessário condicionamento, não abrimos a boca na água.
S: Se vocês realmente
quisessem beber ficariam com a boca fechada?
D: Se alguém quisesse
realmente beber, não ficaria, é claro.
S: Nesse caso vocês estão dizendo,
“Embora eu queira beber, eu não quero beber”! Vocês não estão se contradizendo?
D: É como se
fingíssemos não querer beber, senhor.
S: Então me digam, se vocês
estão sedentos mas aturando isso, vocês se sentem felizes ou infelizes?
D: Infelizes, senhor.
S: E se vocês ficarem
infelizes, vocês continuarão sentados ao lado do jarro d´água sem beber?
D: Senhor, nós vemos esse
sofrimento como felicidade.
S: O Buda ensinou que essa
sede é felicidade?
D: Não, senhor, ele disse
que é sofrimento.
S: Agora, diga-me, o que
vocês acreditam ser verdade: O que o Buda disse ou aquilo que vocês pensam?
D: Nossa idéia de que isso
é a felicidade está incorreta, senhor.
S: Vocês querem ser felizes
ou infelizes?
D: Embora queiramos ser
felizes continuamos criando infelicidade para nós mesmos.
S: O que é melhor: ouvir o
Buda ou não ouvir o Buda?
D: Senhor, sabemos que
deveríamos seguir os ensinamentos do Buda, mas apesar disso continuamos criando
sofrimento para nós mesmos.
S: Nesse caso parece que
vocês sabem o que é bom para vocês mesmos, mas vocês na verdade são
preguiçosos.
D: Como nossos parami
são fracos, precisamos sofrer devido à nossa ignorância, senhor.
S: Agora, se existe água e
vocês não saciam a sua sede com ela, isso se deve ao fato de vocês não terem
aperfeiçoado os seus parami?
D: Devido à falta de parami
o poder da ignorância é tão avassalador, senhor.
S: Diga-me, o que é mais
poderoso, entendimento (vijja) ou
ignorância (avijja)?
D: Senhor, o entendimento é
mais poderoso para os seres humanos.
S: Então vocês sabem que o
entendimento ensinado pelo Buda é poderoso.
D: Senhor, sabemos que o
entendimento é uma coisa boa.
S: Então, associem-se ao
entendimento. Pensando ou não que o poder da ignorância é forte ou outra coisa
qualquer...Vocês aprenderam a distinguir entre mentalidade-materialidade (nome e forma).
Enquanto estiverem atentos à mentalidade-materialidade (nome e forma), como ensinado pelo Buda, a ignorância ainda
prevalece?
D: Enquanto estamos
atentos, senhor, não há ignorância.
S: Agora, vamos nos
concentrar no ponto abaixo do nariz, acima do lábio superior com a atenção
sobre a mentalidade-materialidade (nome e forma) (nama-rupa)
tal como ensinado pelo Buda. Quando ancoramos a nossa atenção dessa forma, a
ignorância consegue permanecer? Se você procurá-la poderá encontrá-la?
D: Ela terá desaparecido
por completo, senhor.
S: Vocês sabem para onde
ela foi?
D: Senhor, ela desapareceu
completamente.
S: Nesse caso, o poder do
entendimento é maior ou o da ignorância é que é maior?
D: O poder da ignorância é
grande, senhor.
S: Como pode ser grande? A
pobre saiu correndo tão rápido quanto podia; vocês nem conseguem vê-la mais.
D: Mas ela volta sempre,
senhor.
S: Isso acontece porque
vocês permitem que ela volte. Se vocês admitirem apenas o entendimento e a
sabedoria, a ignorância não conseguirá regressar. Mas se vocês consentirem que
ela volte, então pouco a pouco o entendimento se dissolverá e a ignorância
assumirá o controle uma vez mais. É como com as lâmpadas neste lugar em que
estamos. O que é necessário para ligar as luzes?
D: Interruptores, senhor.
S: O que ocorre dentro dos
interruptores para que tenhamos luz?
D: A eletricidade flui
através deles, senhor.
S: O que acontece se o
fluxo for interrompido?
D: Ficará escuro, senhor.
S: O que vocês precisam
fazer para converter a escuridão em claridade?
D: Temos que alimentar os
bulbos com eletricidade, senhor.
S: E para onde vai a
escuridão quando as luzes são acesas?
D: Ela desaparece, senhor.
S: Fica restando algo da
escuridão?
D: Não, senhor.
S: Quando o entendimento
brilha, fica restando algo da ignorância?
D: Não, senhor.
S: Nesse caso, o poder da
ignorância é grande?
D: Não, senhor, não é.
S: É difícil fazer o que
fizemos agora?
D: Não é muito difícil,
senhor.
S: Não vemos a realidade
quando de súbito surge a luz?
D: Sim vemos, senhor.
S: Vocês ainda serão capazes
de errar?
D: Não, senhor.
S: É tão fácil! O que os
discípulos do Buda compreenderam? Se vocês quiserem acender a luz, vocês terão
que conectar os fios para que a eletricidade flua. Então, de maneira suave
mantenha a sua atenção no objeto da meditação; ela se conectará. Vocês
entenderam?
D: Gostaríamos de desistir
disto, senhor.
S: Concentrem a atenção no
objeto. De forma suave. Vocês ficam cansados ao focar a mente dessa forma?
D: Não senhor.
S: Isso lhes custa algo?
D: Não, senhor.
S: Vocês precisam parar o
seu trabalho?
D: Não, senhor.
S: Isso não é maravilhoso?
Vocês podem praticar nas quatro posturas: sentados, em pé, andando e deitados.
Vocês podem manter o foco no ponto de toque da respiração com a atenção na
inspiração e expiração mesmo ao comer, beber e trabalhar?
D: Por favor, senhor,
ensine como manter a atenção na respiração enquanto nos movemos e trabalhamos.
S: Vocês conhecem muitas
técnicas distintas, mas vocês não precisam praticá-las todas. Escolham uma e
trabalhem com ela. Se vocês mantiverem a mente focada com firmeza num objeto,
de imediato vocês terão consciência daquilo que não tinham antes, como acontece
quando vocês vêm luz ao ligar o interruptor. Pode ainda haver entendimento
incorreto e delusão na suas mentes, enquanto estiverem assim conscientes?
D: Não, senhor, mas como
não sabemos onde se encontram os interruptores de luz, temos que continuar
sentados no escuro.
S: Mas como, se vocês têm
tantos interruptores! Qualquer um que vocês ligarem irá acender a luz.
D: Senhor, como há tantos
interruptores, eu não sei qual ligar.
S: Qualquer um serve; os
resultados serão imediatos.
D: Quando ligo aquele
interruptor, senhor, a lâmpada queima de imediato. Por isso pensei que fosse o
interruptor errado.
S: Não irá queimar; irá
acender a lâmpada. Mesmo que não acenda um dia, quando você tentar novamente,
com certeza acenderá.
D: Mas eu não sei como
ligar o interruptor, senhor.
S: Vocês conhecem os
interruptores; um grande número de técnicas lhes foram ensinadas por monges
cheios de compaixão. Agora, não tentem todas elas. Selecionem apenas uma.
D: Senhor, por favor ensine
essa única técnica!
S: Todas as técnicas
ensinadas pelo Buda irão funcionar como interruptor para acender a luz.
D: Gostaríamos de aprender
uma técnica através da qual pudéssemos aperfeiçoar a nossa conduta e pudéssemos
ser treinados no entendimento enquanto trabalhamos, andamos ou estivermos
sentados, senhor.
S: Bem então, digam-me,
todos vocês, pequenos e grandes, respiram?
D: Sim, senhor.
S: Portanto, não existe aqui
ninguém que não saiba como respirar. Alguma vez vocês foram capazes de dizer,
“Desculpe-me, estou muito ocupado agora. Não tenho tempo para respirar”?
D: Não senhor.
S: Então, respirar é muito
fácil para vocês, não é? Agora, tentem descobrir por onde sai o ar quando vocês
expiram.
D: Ele sai pelo nariz,
senhor.
S: Existe algum outro lugar
por onde ele saia?
D: Não, senhor, existe
apenas um lugar.
S: Sim, existe apenas um
lugar. Então não me digam que existem tantos interruptores que vocês não sabem
qual deles ligar. Vocês estão todos respirando, não estão? Onde toca o ar
quando vocês expiram?
D: Ele toca um ponto na
base do nariz, senhor.
S: O que acontece quando o
ar entra? Onde ele toca?
D: Ele toca no mesmo ponto,
senhor.
S: Portanto, isso é bem
evidente para vocês: o ar toca num pequeno ponto na base do nariz quando vocês
inspiram e expiram. Vocês têm consciência disso, não é mesmo?
D: Sim, senhor.
S: Não permitam que a mente
perambule em busca de outros objetos. Vocês podem perceber o ponto onde o ar
toca como se o estivessem tocando com o dedo? Coloquem a sua atenção ali e
mantenham-na ali. Não sigam a respiração pelas narinas. Mantenham a atenção com
calma e tranqüilidade no mesmo ponto e vocês serão capazes de perceber o ar
entrando e saindo. O fluxo de ar é continuo, não é mesmo?
D: Sim, senhor.
S: Vocês podem ter
consciência dele sem a menor interrupção. Se mantiverem a atenção naquele
ponto, existirá apenas a consciência das propriedades da mentalidade-materialidade (nome e forma) (nama-rupa). Agora, em
qual desses dois se encaixam as narinas, mente ou matéria?
D: Senhor, até onde sei, as
narinas são matéria (rupa).
S: Qual é a entidade que
conhece a sensação de toque?
D: Senhor, aquilo que
conhece é a mente (nama).
S: Portanto, vocês estão
conscientes da mentalidade-materialidade (nome e forma) ao mesmo tempo. Se vocês têm
consciência da mentalidade-materialidade (nome e forma), existem ainda outras entidades das
quais vocês não tenham consciência?
D: Não, senhor, não existe
nada além de mentalidade-materialidade (nome e forma).
S: Estar consciente da mentalidade-materialidade (nome e forma) é ignorância ou entendimento?
D: É entendimento, senhor.
S: Se uma pessoa não tem
consciência da mentalidade-materialidade (nome e forma), como denominamos isso?
D: Denominamos isso
ignorância, senhor.
S: A ignorância poderá
influenciar-nos até mesmo enquanto estivermos treinando no entendimento?
D: Não, senhor, não poderá.
S: Ainda existirá motivo
para preocupação e temor sobre o presente e o futuro?
D: Não, senhor, não haverá.
S: Mesmo se vocês aplicarem
a atenção apenas por um instante, vocês se beneficiarão. Quanto benefício vocês
receberão se puderem manter essa atenção por mais tempo?
D: Devem ser muitos os
benefícios, senhor.
S: Haverá ainda alguma
dúvida nas suas mentes quanto à capacidade de vocês para atingirem o despertar
pelo qual aspiram?
D: Não, senhor.
S: Vocês poderão alcançar o
objetivo ainda mais rápido do que pensavam. É claro que vocês ainda têm que
cumprir com as suas responsabilidades em relação aos seus mestres, pais e
filhos. Vocês têm que apoiar os ensinamentos do Buda. Vocês têm que obter o seu
sustento. Se vocês não cumprirem com essas responsabilidades, a virtude de
vocês será perfeita?
D: Não será, senhor.
S: Se a virtude não for
perfeita vocês poderão alcançar o objetivo?
D: Não, senhor, é
impossível.
S: Diga-me, quando ou aonde
não seria possível praticar a conduta correta e a meditação ao mesmo tempo?
D: Nunca é demasiado
difícil, senhor, até mesmo quando se está enfermo.
S: Se os insights se
desenvolvem através da sua prática, vocês ainda precisam contar para os outros
que vocês se tornaram felizes através do Dhamma do Buda?
D: Não é necessário contar,
senhor.
S: E se vocês não falarem a
respeito, isso significa que vocês desconhecem a própria felicidade?
D: Mesmo se não contarmos
para ninguém, ainda assim saberemos por nós mesmos, senhor.
S: É da mesma maneira que
as pessoas nobres sabem. Vocês sabem por si mesmos o quanto conquistaram até
agora e quando alcançarem o objetivo, também saberão. Se vocês escreverem num
pedaço de papel que o sal é salgado e alguém ler isso, ela saberá que o sal é
salgado, não é mesmo?
D: É claro, senhor.
S: E se vocês contarem para
uma pessoa que o sal é salgado, ela saberá?
D: Com certeza, senhor.
S: Mas diga-me, o sal se
tornará salgado só pelo fato de você escrever ou dizer isso para alguém?
D: Não, senhor, é claro que
não.
S: Se vocês lerem que o sal
é salgado, vocês na verdade sabem que é assim?
D: Embora a pessoa
compreenda que é salgado, ela na verdade não sabe qual é o sabor do sal.
Somente quando colocarmos um pouco de sal na língua e o experimentarmos,
poderemos saber o que “salgado” significa.
S: Se vocês tiverem
experimentado e souberem que é salgado, vocês ainda terão que ler a respeito?
Vocês ainda terão que fazer declarações a respeito do sabor?
D: Não, senhor.
S: Se contarmos ao nosso
vizinho sobre o sabor, ele compreenderá?
D: Ele apenas terá ouvido a
respeito, senhor.
S: O que precisamos fazer
para que ele compreenda?
D: Temos que lhe dar um
pouco de sal e fazer com que ele experimente. De outro modo, o que ele souber
será só de ouvir dizer, senhor.
S: Vocês sabem, com
certeza, que a conduta correta e o insight e sabedoria constituem o caminho
para a libertação do sofrimento?
D: Sim, senhor, nós
sabemos.
S: Se vocês lerem que o sal
é salgado e considerarem que esse conhecimento é suficiente, então é nesse
ponto que vocês pararão. Mas se quiserem ter certeza, vocês têm que
experimentar por si mesmos. É suficiente ler que o sal é salgado e tê-lo
confirmado por mim?
D: Senhor, você não mentiria.
Se você me dissesse que é salgado, isso seria o bastante para mim.
S: Agora vocês estão voltando atrás naquilo que
disseram antes. Vocês sabem que o sal é salgado por ouvir e ler a respeito, mas
só se vocês souberem genuinamente por si mesmos é que ficarão satisfeitos. Se
vocês contarem para alguém que o sal é salgado e ele aceitar cegamente o que
vocês disseram, nesse caso ele não irá nem mesmo sentir desejo de experimentar
por ele mesmo.
Afinal, ele pensa que sabe.
Com essa noção na mente, ele não verá necessidade de prová-lo. Não é fácil
saber por si mesmo que o sal é salgado. O sal existe. Tome-o, prove-o. Só
então, vocês saberão isso por si mesmos e não haverá necessidade de perguntar
aos outros.
D: Senhor, ontem eu provei
um pouco de sal.
S: Verdade? Porque só um
pouco? O sal acabou?
D: Não, senhor, há muito
sal.
S: Então tome-o! Não provem
apenas um pouco. Usem tanto quanto precisarem. Cada um de vocês tem sal, não
tem?
D: Sim, senhor. Nós não
comemos até ficarmos saciados, senhor, e ficamos satisfeitos em provar apenas
um pouco.
S: Mas é claro que vocês
não estão pensando em deixar por isso mesmo, estão?
D: Bem, senhor, na verdade
não, mas à medida que o tempo passa tudo muda. Planejamos algo no ano passado e
um ano já passou...
S: Mas desta vez não pensem
apenas. Quantos “pensadores” havia na época do Buda?
D: Havia tantos quantos
grãos de areia na praia, senhor.
S: Vocês precisam se esforçar mais e meditar. Vocês precisam se esforçar mais para compreender os
ensinamentos do Buda. Vocês estão planejando fazer isso, não estão? Vocês
também estão pensando em colocar esforço só nesta vida?
D: Se só pensarmos nisso, senhor, novamente seremos
deixados para trás no ciclo de nascimento e morte.
S: Bem, nesse caso então não há problema. “No passado,
nós nos perdemos porque só pensávamos em fazer esforço, mas agora compreendemos
que existe fogo nos dois gravetos de madeira. Iremos esfregá-los um no outro.”
Pensando dessa forma, haverá esforço e também o desejo de enfrentar essa
batalha...Vocês já se apossaram dos dois gravetos de madeira? Se eu continuar
falando, vocês irão pensar, “Esse monge já está falando faz muito tempo.” Eu
devo parar agora. Só por meio do empenho poderão conseguir algo, se tiverem o
desejo de trabalhar, meditar, trabalhar duro, aplicar-se com o mesmo esforço e
determinação dos Nobres de antigamente.
Fonte: Buddhist Publication
Society. Bodhi Leaves BL 122. Traduzido do Birmanês por Roger Bischoff
Revisado: 19 Outubro 2002
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