Uma ferramenta entre muitas
O papel de Vipassana na prática Budista
Por
Ajaan Thanissaro
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O que exatamente é
vipassana?
Quase todos os livros sobre
meditação Budista lhe dirão que o Buda ensinou dois tipos de meditação: samatha
e vipassana. Samatha, que significa tranqüilidade, é um método que
promove estados intensos de absorção mental, denominados jhana. Vipassana
- literalmente "ver com clareza", mas freqüenteemente traduzido como
meditação de insight - é um método que utiliza uma pequena dose de
tranqüilidade para promover momento a momento a atenção plena acerca da
natureza impermanente dos eventos, exatamente da forma como eles são
vivenciados no presente. Essa atenção plena cria um sentido de desapego em
relação a todos os eventos, conduzindo a mente dessa forma à libertação do
sofrimento. Esses dois métodos, dizem, são bem distintos e dos dois, vipassana
é a contribuição especial do Budismo para a ciência da meditação. Outros
sistemas de prática, anteriores ao Buda, também ensinavam samatha mas o Buda
foi o primeiro a descobrir e ensinar vipassana. Embora alguns meditadores
Budistas possam praticar a meditação samatha antes de se dedicar a vipassana, a
prática de samatha não é realmente necessária para a busca da Iluminação. Como
ferramenta de meditação, o método vipassana é suficiente para alcançar o
objetivo. Ou assim nos dizem.
Mas se você buscar
diretamente nos discursos em Pali - a fonte mais antiga que existe acerca dos
ensinamentos do Buda - você verá que
são utilizados os termos samatha significando tranqüilidade e vipassana
significando ver com clareza, fora isso eles não endossam a suposta sabedoria
que atribuímos a esses termos. Só raramente fazem uso da palavra vipassana - em
contraste com o freqüente uso da palavra jhana. Quando eles descrevem o Buda
dizendo aos seus discípulos para que meditem, eles nunca se referem a ele
dizendo "vá fazer vipassana" mas sempre "vá fazer jhana". E
eles nunca igualam a palavra vipassana a qualquer técnica de atenção plena. Nas
poucas instâncias em que vipassana é mencionada é quase sempre em conjunto com
samatha - não como dois métodos alternativos mas como duas qualidades da mente
que uma pessoa pode "ganhar" ou "ser dotada de" e que devem
ser desenvolvidas em conjunto. Uma analogia por exemplo (SN XXXV.245), compara samatha e vipassana a
um par de mensageiros ligeiros que entram na cidadela do corpo por meio do
Nobre Caminho Óctuplo e apresentam o seu relato de maneira precisa -
Desatamento ou nibbana - para a consciência que age como o comandante da
cidadela. Uma outra passagem (AN X.71) recomenda que qualquer pessoa que queira
acabar com as impurezas da mente deve – além de aperfeiçoar os princípios de
comportamento virtuoso e cultivar o
isolamento - se dedicar a samatha e ser dotado de vipassana. Esse último
enunciado não contém nada de especial, mas esse mesmo discurso proporciona o
mesmo conselho a quem queira dominar os jhanas: dedicar-se a samatha e ser
dotado de vipassana. Isso sugere que aos olhos daqueles que coletaram os
discursos em Pali, samatha, jhana e vipassana são todos parte de um único
caminho. Samatha e vipassana são usados em conjunto para obter a maestria nos
jhanas para depois - baseado nos jhanas - serem aperfeiçoados para dar fim às
contaminações da mente e proporcionar a libertação do sofrimento. Essa é uma
interpretação que também encontra apoio em outros discursos.
Existe uma passagem por
exemplo, que descreve três formas em que samatha e vipassana podem atuar em
conjunto para conduzir ao conhecimento do Despertar: ou samatha se antecede a
vipassana, vipassana antecede samatha ou ambos se desenvolvem em sincronia (AN IV.170). As palavras utilizadas sugerem a
imagem de dois bois puxando uma carroça: um é colocado à frente do outro ou
ambos são conectados lado a lado. Uma outra passagem (AN IV.94) indica que se samatha antecede a
vipassana - ou vipassana a samatha - a prática se encontra desequilibrada e
precisa ser corrigida. Um meditador que alcançou um certo nível de samatha,
porém sem "vipassana baseada num
discernimento intensificado dos fenômenos (adhipañña-dhamma-vipassana),"
deveria perguntar a um companheiro meditador que alcançou vipassana: "Como
devem ser consideradas as formações? Como elas devem devem ser investigadas?
Como elas devem ser vistas através do insight?" para então desenvolver
vipassana seguindo as instruções daquela pessoa. Os verbos nessas questões -
"consideradas", "investigadas", "vistas" - indicam que
o processo de desenvolvimento de vipassana compreende mais do que uma simples
técnica de atenção plena. Na verdade, como veremos a seguir, esses verbos se
aplicam a um processo de interrogação hábil denominado "atenção com
sabedoria".
O caso oposto - um
meditador que alcançou uma certa dose de vipassana, baseado em um discernimento
intensificado dos fenômenos, porém sem samatha - deveria perguntar a alguém que
alcançou samatha: “Como a mente deve ser estabilizada? Como deve ser
feito para acalmar a mente? Como a mente deve ser unificada? Como a mente deve
ser concentrada?” para então
desenvolver samatha seguindo as instruções daquela pessoa. Os verbos aqui
utilizados dão a impressão de que "samatha" neste contexto significa
jhana, pois o jhana corresponde à fórmula verbal - "a mente se estabiliza,
se acalma, se unifica e fica concentrada" - que os discursos em Pali
utilizam repetidamente para descrever a conquista de jhana. Essa impressão é
reforçada quando notamos que em todos os casos
onde os discursos são explícitos acerca dos níveis de concentração
necessários para que o insight seja libertador, esses níveis são os jhanas.
Uma vez que o meditador
esteja dotado de ambos, samatha e vipassana, ele/ela "deve fazer o esforço
para estabelecer essas mesmas qualidades hábeis em um nível mais elevado para
eliminar as impurezas mentais(asava)." Isso corresponde aos
caminhos de samatha e vipassana desenvolvidos em sincronia. Uma passagem no MN 149 descreve como isso pode acontecer. A
pessoa sabe e vê, exatamente como na verdade são, os seis meios dos sentidos
(os cinco mais a mente), os seus objetos, a consciência em cada meio do
sentido, o contato em cada meio do sentido, e a experiência de prazer, dor ou
neutra como resultado desse contato. A pessoa mantém a atenção plena de tal
forma a não ser cativada por nenhuma dessas coisas, desapegada, sem estar
confusa, focalizada nas suas desvantagens, abandonando qualquer desejo por
elas: isso seria considerado como vipassana. Ao mesmo tempo - abandonando as
perturbações físicas e mentais, tormentos e misérias - a pessoa experimenta a
tranqüilidade de corpo e mente: isso seria considerado como samatha. Essa
prática não somente desenvolve samatha e vipassana em sincronia mas também
induz as "37 Asas para o Despertar" - que incluem jhana - até o seu
desenvolvimento máximo.
Portanto o caminho adequado
é aquele no qual vipassana e samatha são mantidos em equilíbrio, cada um
suportando e atuando como um controle sobre o outro. Vipassana faz com que a
tranqüilidade não se torne estagnada e tediosa. Samatha previne manifestações
de aversão - tais como náusea, vertigem, desorientação e até o completo
desligamento - que podem ocorrer quando a mente está presa ao momento presente
contra a sua vontade.
Baseado nessa descrição é
óbvio que samatha e vipassana não são práticas separadas mas ao invés disso são
maneiras complementares de como se conectar com o momento presente: samatha
proporciona uma sensação de tranqüilidade e vipassana uma visão clara dos
eventos da forma como eles na verdade ocorrem, em si mesmos e por si mesmos.
Também é óbvia a razão pela qual as duas qualidades têm que atuar em conjunto
para conquistar os jhanas. As instruções básicas para a meditação da respiração
(MN 118) indicam que tal conquista abrange três coisas: satisfação,
concentração e libertação da mente. Satisfazer a mente significa
encontrar uma sensação de estímulo e contentamento no presente. Concentrar
significa manter a mente enfocada no seu objeto, enquanto que a libertação significa
livrar a mente dos fatores mais grosseiros que caracterizam um estágio mais
baixo de concentração, de tal forma a alcançar um nível mais elevado. As
primeiras duas atividades são funções de samatha enquanto que a última é função
de vipassana. Todas as três precisam atuar em conjunto. Se por exemplo existe
concentração e satisfação, sem o desapego, a mente não será capaz de aprimorar
a sua concentração. Os fatores que devem ser abandonados para elevar a mente do
estágio x para o estágio y pertencem ao mesmo conjunto de fatores
que elevou a mente até x inicialmente (AN
IX.34). Sem a habilidade para ver com clareza os eventos mentais no
presente, não haverá maneira hábil de libertar a mente dos fatores que a
aprisionam a um estágio de concentração inferior e que agem como fatores de
perturbação para alcançar um estágio mais elevado. Se, por outro lado, existe
um simples desapego desses fatores, mas sem um reconhecimento, ou estabilidade
no silêncio que permaneça por um período de tempo, a mente sairia de jhana
completamente. Assim, samatha e vipassana devem atuar em conjunto para trazer a
mente, com maestria, para a concentração correta.
A questão que surge é: se
vipassana funciona com a conquista dos jhanas, e os jhanas não são
exclusividade dos Budistas então o que existe de Budista acerca de vipassana? A
resposta é que vipassana em si não é exclusivamente Budista. O que é
distintamente Budista é (1) a extensão em que ambos, samatha e vipassana, são
desenvolvidos e, (2) a forma como são desenvolvidos - isto é, a linha de
interrogação que é adotada para estimulá-los e, (3) a forma como são combinados
juntamente com um arsenal de ferramentas de meditação para conduzir a mente
para a libertação total.
No MN 73, o Buda aconselha um bhikkhu que conquistou
os jhanas a aprofundar o desenvolvimento de samatha e vipassana de tal forma a
obter maestria nas seis habilidades
cognitivas, sendo que a mais importante delas : ‘Realizando por si mesmo com o
conhecimento direto, aqui e agora, entrou e permaneceu no que é o objetivo
supremo da vida santa pelo qual com razão membros de um clã adotam a vida santa.
Ele soube que: “O nascimento foi destruído, a vida santa foi vivida, o que
deveria ser feito foi feito, não há mais vir a ser a nenhum estado.”’ Essa é
uma das descrições do objetivo Budista. Alguns comentaristas têm afirmado que
essa libertação é função exclusiva de vipassana, mas existem discursos que
indicam o contrário.
Note que a libertação tem
dois desdobramentos: libertação da mente e libertação através da sabedoria. A
libertação da mente ocorre quando um meditador se torna totalmente desapegado
em relação à cobiça: essa é a função básica de samatha. A libertação através da sabedoria
ocorre quando existe desapego da ignorância: essa é a função fundamental de
vipassana (AN II.29-30). Dessa forma ambos
samatha e vipassana estão envolvidos nesse processo de libertação duplo.
O Sabbasava Sutta (MN 2)
afirma que a libertação será "livre de impurezas" somente se a pessoa
souber e puder ver sob a perspectiva da "atenção com sabedoria" (yoniso
manasikara). Como mostra o discurso, atenção com sabedoria significa fazer
as perguntas apropriadas acerca dos fenômenos, tomando-os não em termos de
eu/outro ou ser/não ser, mas em termos das quatro nobres verdades. Em outras
palavras, ao invés de perguntar "Eu existo? Eu não existo? O que sou
eu?" a pessoa pergunta acerca do que experiencia, "Isto é sofrimento?
A origem do sofrimento? A cessação do sofrimento? O caminho que conduz à
cessação do sofrimento?" Porque cada uma dessas categorias requer uma
tarefa, a resposta a essas questões determina um curso de ação: o sofrimento
deve ser compreendido, a sua origem abandonada, a sua cessação realizada e o
caminho para a sua cessação desenvolvido.
Samatha e vipassana fazem
parte do caminho e portanto devem ser desenvolvidos. Para desenvolvê-los é
necessário aplicar a atenção com sabedoria à tarefa de entender o sofrimento,
que inclui os cinco agregados influenciados pelo apego - apego à forma física,
sensações, percepções, formações mentais e consciência. Aplicar atenção com
sabedoria a esses agregados significa vê-los em relação às suas desvantagens,
como "impermanentes, sofrimento, uma enfermidade, um câncer, uma flecha,
dolorosos, uma aflição, estranhos, uma dissolução, um vazio, não-eu" (SN XXII.122). Uma lista de perguntas,
exclusivas do Buda, auxilia nessa abordagem: "Este agregado é permanente
ou impermanente?" - "E aquilo que é impermanente é sofrimento
ou felicidade?" - "E
é adequado considerar o que é impermanente, sofrimento, sujeito a mudanças
como: "Isso é meu. Isso sou eu. Isso é o meu eu" (SN
XXII.59). Essas questões se aplicam a cada um dos cinco agregados, quer
sejam "passado, futuro ou presente, interno ou externo; grosseiro ou
sutil, inferior ou superior, próximo ou distante." Em outras palavras, o meditador coloca
questões desse tipo para todas as experiências do universo nos seis meios dos
sentidos.
Essa linha de interrogação
faz parte de uma estratégia que conduz a um nível de conhecimento denominado
"conhecer e ver as coisas como elas na verdade são (yatha-bhuta-ñana-dassana),"
em que as coisas são compreendidas sob cinco perspectivas distintas: a sua origem,
a sua cessação, as suas desvantagens, a sua gratificação e como escapar delas –
escapar, neste caso, significando o desapego.
Alguns comentaristas têm
sugerido que em termos práticos, essas cinco perspectivas podem ser alcançadas
simplesmente com a concentração na origem e cessação desses agregados no
momento presente, se a atenção for suficientemente firme, conduzirá
naturalmente ao conhecimento das desvantagens, gratificação e escapatória,
suficientes para a libertação total. Os textos, no entanto, não corroboram essa
interpretação, e a experiência prática parece
lhes dar razão. Como indicado no MN 101,
cada meditador irá descobrir que, em alguns casos, eles poderão desenvolver
desapego em relação a algo que cause
sofrimento, simplesmente através da observação equânime dos agentes
causadores, porém em outros casos, será necessário fazer um esforço consciente
para desenvolver o desapego, que irá proporcionar o meio de escape. O discurso
é vago - talvez intencionalmente - com relação a que tipo de abordagem irá
funcionar melhor e em qual situação. Isso é algo que cada meditador terá que
testar por si mesmo na prática.
O Sabbasava Sutta expande esse tema listando sete
abordagens que podem ser adotadas para desenvolver o desapego. Vipassana, sendo
uma qualidade da mente, está relacionada com todas as sete, mas mais
diretamente com a primeira: "ver", isto é, ver os eventos sob a
perspectiva das quatro nobres verdades e as tarefas que lhes são apropriadas.
As seis abordagens restantes abrangem as maneiras de como executar essas
tarefas: refrear a mente de colocar a atenção em dados sensoriais que poderiam
provocar estados inábeis da mente; refletir acerca das razões adequadas para as
necessidades de alimentação, mantos, moradia e medicamentos; tolerar
sensações dolorosas; evitar perigos óbvios e companhias inadequadas; destruir
pensamentos de desejo sensual, má vontade, de provocar dano e outros estados
inábeis; e desenvolver os sete fatores da iluminação: atenção plena,
investigação dos fenômenos, energia, êxtase, tranqüilidade, concentração, equanimidade.
Cada uma dessas abordagens
abrange um amplo espectro de ações. Em "destruir" por exemplo,
pode-se eliminar um estado mental inábil substituindo-o por um estado mental
hábil, colocando a atenção nas suas desvantagens, desviando a atenção, relaxando
o processo de fabricação de pensamentos que o originou, ou suprimindo-o com a
força bruta da vontade (MN 20). Muitos exemplos
semelhantes podem ser extraídos de outros discursos também. O ponto mais
abrangente é que os caminhos da mente são variados e complexos. Diferentes
impurezas podem surgir borbulhando com aparências distintas e reagir a
abordagens distintas. A habilidade da pessoa, como meditador, está em obter
maestria em uma variedade de abordagens e de desenvolver a sensibilidade para
saber qual abordagem irá funcionar melhor em qual situação.
Em um nível mais básico no
entanto, a pessoa necessita de uma forte motivação para obter maestria nessas
habilidades. Como a atenção com sabedoria requer o abandono de dicotomias que
são tão básicas no modelo de pensamento de todas pessoas - "ser/não
ser" e "meu/não meu" -
os meditadores precisam ter fortes razões para adotá-la. É por essa
razão que o Sabbasava Sutta insiste em que qualquer pessoa, que
desenvolva atenção com sabedoria, precisa primeiro ter os nobres (significando nesse caso o Buda e os seus
discípulos iluminados) em alta conta. Em outras palavras, a pessoa precisa
enxergar que aqueles, que seguiram o caminho, são verdadeiramente dignos de
serem imitados. A pessoa precisa também estar bem versada no ensinamento e na disciplina deles. De acordo
com o MN 117, "estar bem versada no
ensinamento deles" tem início com a convicção nos ensinamentos acerca de
karma e renascimento, que oferecem o contexto intelectual e emocional para
adotar as quatro nobres verdades como as formas básicas para categorizar as
experiências. Estar bem versada na disciplina dos nobres inclui, além de
observar os preceitos, ter habilidade nas sete abordagens descritas acima de
como abandonar as impurezas.
Sem esse tipo de cenário,
os meditadores podem trazer atitudes e questões incorretas para a prática da
observação da origem e cessação dos fenômenos no momento presente. Por exemplo,
eles podem estar buscando um "eu verdadeiro" e acabar se
identificando - consciente ou inconscientemente - com a vasta, ampla noção de
consciência que abrange toda mudança, da qual tudo parece surgir e para a qual
tudo parece retornar. Ou eles podem ansiar por uma sentido de conexão com a
vasta inter-relação do universo, convencidos de que – como todas as coisas
estão em constante mudança - qualquer desejo pela não mudança é neurótico e uma
negação da vida. Para pessoas com objetivos desse tipo a simples experiência dos eventos, surgindo
e desaparecendo no presente, não irá conduzir ao conhecimento de como as coisas
realmente são. Elas se recusarão a reconhecer que as idéias que possuem são uma
fermentação de opiniões, ou que as experiências de calma que parecem confirmar
essas idéias, são simplesmente uma impureza sob a forma de um estado de ser.
Como resultado, elas não irão querer aplicar as quatro nobres verdades a essas
idéias e experiências. Somente uma pessoa disposta a ver essas impurezas como
tais, e convencida da necessidade de transcendê-las, estará preparada para
aplicar os princípios de atenção com sabedoria a essas idéias e dessa forma
superá-las.
Portanto, para responder a
questão com a qual começamos: Vipassana não é uma técnica de meditação. É uma qualidade
da mente - a habilidade para ver os eventos claramente no momento presente.
Embora a atenção plena seja um auxílio na promoção de vipassana, não é
suficiente para desenvolver vipassana até o ponto da libertação total. Outras
técnicas e abordagens também são necessárias. Em particular, vipassana tem que
ser combinada com samatha - a habilidade para acomodar a mente confortavelmente
no presente - de tal forma a alcançar estados de intensa absorção ou jhana.
Baseado nessa maestria, samatha e vipassana são então empregados em um programa
de interrogação hábil, denominado atenção com sabedoria, dirigido a todas as
experiências: explorando os eventos não em termos de meu/não meu ou ser/não
ser, mas em termos das quatro nobres
verdades. O meditador persevera nesse programa até que alcance o entendimento
de todos eventos em seus cinco desdobramentos: a sua origem, a sua cessação, as
suas desvantagens, a sua gratificação e como escapar deles. Somente então, a
mente experimentará a libertação.
Este programa para o
desenvolvimento de vipassana e samatha, por outro lado, necessita do apoio de
muitas outras atitudes, qualidades mentais e técnicas de prática. Essa é a
razão porque o Buda as ensinou como parte de um programa mais amplo que inclui
o respeito pelos nobres, maestria em todas as sete abordagens para o abandono
das impurezas mentais e todos os oito fatores do nobre caminho. Adotar uma
abordagem reduzida para a prática poderá somente produzir resultados reduzidos, pois a meditação é uma habilidade
que tal como a carpintaria, requer a
maestria no uso de muitas ferramentas em resposta a diferentes necessidades.
Limitar-se a apenas uma abordagem na meditação, seria o mesmo que tentar
construir uma casa com uma motivação inadequada e uma caixa de ferramentas contendo nada além de martelos.
Revisado: 19 Outubro 2002
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