Satipatthana
O Foco da Atenção Plena
Por
Ajaan Brahmavamso
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Sobre a prática de
Satipatthana, já foi dito muito mais do que a respeito de qualquer outra
prática de meditação pelos mestres Budistas da atualidade .... exceto por este
monge! E neste artigo sobre o Dhamma eu acompanharei essa tendência
apresentando algumas observações práticas com relação a esse ensinamento que é
um dos mais mal compreendidos ensinamentos do Buda.
Aqueles que vêm “marcando presença” nos Centros
Budistas há algum tempo, provavelmente já ouviram alguns mestres afirmar que o
“Foco quádruplo da Atenção Plena” (minha tradução para “Satipatthana”) [1] constitui
o “único caminho” para aqueles que têm por objetivo a iluminação plena! Embora esse seja um bom argumento para
vender os ensinamentos, ele não é nem uma tradução verdadeira do texto original
e tampouco é consistente com aquilo que o Buda disse em outros discursos. A frase específica (“Ekayana Magga”)
que é incorretamente traduzida como “único caminho” ocorre novamente no Mahasihanada Sutta MN 12, onde de
maneira inequívoca significa um “caminho com apenas um destino possível”.
Muitos caminhos distintos podem compartilhar a mesma destinação. Na verdade, o
“único caminho” é a descrição que o Buda dá, não para Satipatthana, mas para o
Nobre Caminho Óctuplo:
“De todos caminhos, o caminho óctuplo é o melhor ,,,
Esse é o único caminho, não há um outro
para a purificação da visão”
Dhammapada versos 273 e 274
Portanto, o “único caminho” para a Iluminação, como
todos os Budistas deveriam saber de qualquer modo, é o Nobre Caminho Óctuplo. O
Foco quádruplo da Atenção Plena constitui apenas parte desse Caminho, o sétimo
fator. Jhanas são o oitavo fator e também há o Entendimento Correto, Pensamento
Correto, Esforço Correto e os três fatores da Virtude Correta. Cada um desses
oito fatores são necessários para alcançar o objetivo da Iluminação plena. Se
algum desses fatores fosse desnecessário, então o Buda teria ensinado um
caminho com 7 fatores, ou um caminho com 6 fatores, etc. Por essa razão, na
nossa prática de Budismo, tenham em mente que todos os fatores do Nobre Caminho
Óctuplo devem ser cultivados como o “único caminho.”
Agora, o método do Foco quádruplo da Atenção Plena tal
qual ensinado pelo Buda, é uma prática bastante avançada. Tão avançada que o
Buda disse que se alguém desenvolvesse todos eles da maneira descrita por ele
durante sete dias apenas, então essa pessoa alcançaria a Iluminação plena ou o
estado do não retorno. Muitos meditadores que estão lendo isso podem ter
participado de um desses retiros de nove dias ou até mais e no entanto não
alcançaram essa que é a mais elevada dentre as promessas do Buda. Porque não?
Porque, eu diria, eles não estiveram seguindo as instruções do Buda.
Se você quiser praticar o Foco quádruplo da Atenção
Plena da maneira que o Buda diz conduzir
rapidamente à Iluminação, então certas coisas são necessárias antes que
você comece. Os preparos necessários são, resumidamente, o desenvolvimento
perfeito dos outros sete fatores do Nobre Caminho Óctuplo. Ou, como dito pelo
Buda em alguns suttas do Anguttara Nikaya (AN IX.63, AN IX.64), a pessoa deve
observar os cinco Preceitos (quanto mais tempo melhor), abandonar os cinco
Obstáculos [2] e
daí praticar Satipatthana.
Esses dois requisitos essenciais são na verdade
mencionados pelo Buda nos dois discursos que tratam do Foco quádruplo da
Atenção Plena, como “Vineyya Loke Abhijjha-Domanassam”. Essa frase em
geral é traduzida como “tendo
colocado de lado a cobiça e o desprazer pelo mundo”, ou algo semelhante. Essas
traduções significam tão pouco para os meditadores que eles ignoram essa
instrução por completo, e dessa forma “perdem o trem!” Na época do Buda, os
monges, monjas e discípulos leigos teriam entendido essa frase assim “depois de
ter abandonado os cinco Obstáculos”! Os dois comentários autorizados dos dois Satipatthana
Suttas ensinados pelo Buda mencionam de modo claro que “Abhijjha-Domanassam”
se refere precisamente aos cinco Obstáculos. Em outros discursos do Buda, que
foram preservados, “Abhijjha” é um sinônimo para o primeiro Obstáculo, “Domanassam”
é um sinônimo para o segundo Obstáculo, e juntos eles representam, em Pali, uma
abreviação para todos os cinco. Isso então significa que os cinco Obstáculos
precisam ser abandonados primeiro antes de iniciar qualquer uma das práticas do
Foco da Atenção Plena. Na minha não tão modesta opinião, é precisamente porque
os meditadores tentam praticar o método Satipatthana com alguns dos Obstáculos
ainda presentes que eles não alcançam nem resultados notáveis e tampouco
duradouros.
É função da
prática de Jhana, o último fator do Nobre Caminho Óctuplo, abandonar todos os
cinco Obstáculos por tempo suficiente de modo a obter um GRANDE Insight. Por exemplo,
no Nalakapanna Sutta MN68, o Buda
afirma que para aquele meditador que não alcança Jhana, os cinco Obstáculos
junto com o descontentamento e a fadiga invadem a mente e permanecem. O Buda
disse que só quando se alcança Jhana, os cinco Obstáculos junto com o
descontentamento e a fadiga não invadem e não permanecem na mente.
Todo meditador que tiver experimentado o poder de
Jhanas sabe, através dessa experiência e aquilo que acontece depois, o que é na
verdade uma mente sem nenhum Obstáculo. O meditador que não experimentou Jhanas
não se dá conta das muitas formas sutis que os Obstáculos podem assumir. Ele
poderá pensar que os Obstáculos foram abandonados, mas a verdade é que ele não
os vê e assim não obtém grandes resultados na meditação. Essa é a razão porque
a prática de Samatha que cultiva os Jhanas faz parte do ensinamento de
Satipatthana, e porque é desinformação chamar Satipatthana de “Vipassana puro”.
Mesmo o meu mestre, Ajaan Chah, disse repetidas vezes que Samatha e Vipassana,
“tranqüilidade e insight”, caminham juntos e são inseparáveis como as duas
faces de uma moeda.
Tendo pacientemente completado as preparações
necessárias, o meditador sustenta a sua atenção plena nos quatro focos: o seu
próprio corpo, o prazer e o desprazer associado com cada sentido, a mente e,
como quarto, os objetos mentais. Quando os Obstáculos tiverem se retirado e a
pessoa for capaz de sustentar a poderosa e penetrante atenção nesses quatro
objetos, só então será possível compreender que no fundo da nossa psique, muito
mais fundo que o véu do raciocínio intelectual, nós estivemos pressupondo a
existência de um Ego. Estivemos pressupondo que este corpo é o “eu” ou “meu”,
que o prazer ou dor tem algo que ver comigo, que a mente que observa é a nossa
Alma ou algo parecido, e que os objetos mentais como o pensamento ou a volição
( o ‘escolhedor’) é um Ego, eu, ou meu. Em resumo, o propósito do Foco
quádruplo da Atenção Plena é instruir a pessoa sobre o que fazer ao emergir do
Jhana, é revelar a delusão profundamente disfarçada de uma Alma e depois ver
aquilo que o Buda viu, a Verdade de Anatta.
Isto não é fácil, mas pode ser feito e são necessários
apenas sete dias. Isto é, se alguém seguir as instruções do Buda sem tomar
atalhos.
Notas:
[1] Outra tradução: Fundamentos da Atenção Plena (Veja o Satipatthana
Sutta – MN 10). [Retorna]
[2] Cinco Obstáculos: desejo sensual, má vontade, inquietação e remorso,
torpor e preguiça, e dúvida (Veja Os Cinco Obstáculos (Nivarana)). [Retorna]
Fonte: Buddhist Society of
Revisado: 21 Fevereiro 2015
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