Majjhima Nikaya 83
Makhadeva Sutta
Rei Makhadeva
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1. Assim
ouvi. [1] Em certa ocasião o
Abençoado estava em Mithila no mangueiral de Makhadeva. [2]
2. Então, num certo lugar o Abençoado sorriu. O venerável Ananda pensou:
“Qual é a razão, qual é a causa do sorriso do Abençoado? Os Tathagatas não
sorriem sem razão.” Assim ele arrumou o seu manto superior sobre o ombro e
juntando as mãos para o Abençoado numa respeitosa saudação perguntou:
“Venerável senhor, qual é a razão, qual é a causa do sorriso do Abençoado? Os
Tathagatas não sorriem sem razão.”
3. “Certa
vez, Ananda, aqui mesmo em Mithila havia um rei chamado Makhadeva. Ele era um
monarca justo que governava de acordo com o Dhamma, um grande rei que estava
estabelecido no Dhamma.[3] Ele se comportava
de acordo com o Dhamma entre brâmanes e chefes de família, entre habitantes das
cidades e do campo e observava os dias de Uposatha, no décimo quarto, décimo
quinto e oitavo dia da quinzena.[4]
4. “Agora, ao final de muitos anos, muitas centenas de anos, muitos
milhares de anos, o Rei Makhadeva se dirigiu ao seu barbeiro da seguinte forma:
‘Estimado barbeiro, quando você vir cabelos grisalhos crescendo na minha
cabeça, então me diga.’ – ‘Sim, senhor,’ ele respondeu. E depois de muitos
anos, muitas centenas de anos, muitos milhares de anos, o barbeiro viu cabelos
grisalhos crescendo na cabeça do Rei Makhadeva. [5] Ao vê-los, ele disse para o rei: ‘Os mensageiros divinos
apareceram, senhor; cabelos grisalhos podem ser vistos crescendo na cabeça da
sua majestade.’ – ‘Então, estimado barbeiro, arranque com cuidado esses cabelos
grisalhos com uma pinça e coloque-os na palma da minha mão.’ – ‘Sim, senhor,’
ele respondeu, e arrancou com cuidado aqueles cabelos grisalhos com uma pinça e
os colocou na palma da mão do rei.
“Então o
Rei Makhadeva deu o melhor vilarejo para o seu barbeiro, e chamando o príncipe,
o seu filho mais velho, ele disse: ‘Estimado príncipe, os mensageiros divinos
apareceram; [6] cabelos grisalhos podem ser
vistos crescendo na minha cabeça. Eu desfrutei dos prazeres sensuais humanos;
agora é o momento de buscar os prazeres sensuais divinos. Venha, estimado
príncipe, assuma o reino. Eu rasparei o meu cabelo e a barba, vestirei o manto
de cor ocre e deixarei a vida em família e seguirei a vida santa. E agora,
estimado príncipe, quando você também vir cabelos grisalhos crescendo na sua
cabeça, então depois de dar o melhor vilarejo para o seu barbeiro, e depois de
cuidadosamente instruir o príncipe, o seu filho mais velho, nos deveres de um
monarca, raspe o seu cabelo e barba, vista o manto de cor ocre e deixe a vida
em família e siga a vida santa. Dê seguimento a esta boa prática instituída por
mim e não seja o último homem. Estimado príncipe, quando houver dois homens
vivos e aquele sob o qual ocorrer uma interrupção desta boa prática – ele será
o último homem dentre eles. Portanto, estimado príncipe, eu lhe digo: Dê
seguimento a esta boa prática instituída por mim e não seja o último homem.’
5. “Então,
depois de dar o melhor vilarejo para o seu barbeiro, e depois de cuidadosamente
instruir o príncipe, o seu filho mais velho, nos deveres de um monarca, no
mangueiral de Makhadeva, ele raspou o
cabelo e a barba, vestiu o manto de cor ocre e deixou a vida em família e
seguiu a vida santa.
“Ele
permaneceu com o coração pleno de amor bondade, permeando o primeiro quadrante com a mente imbuída de amor bondade,
da mesma forma o segundo, da mesma forma o terceiro, da mesma forma o quarto;
assim acima, abaixo, em volta e em todos os lugares, para todos bem como para
si mesmo, ele permaneceu permeando o mundo todo com a mente imbuída de amor
bondade, abundante, transcendente, imensurável, sem hostilidade e sem má
vontade.
“Ele permaneceu com o coração pleno de compaixão,
permeando o primeiro quadrante com a mente imbuída de compaixão ... com a mente
imbuída de alegria altruísta ... com a mente imbuída de equanimidade, da mesma
forma o segundo, da mesma forma o terceiro, da mesma forma o quarto; assim
acima, abaixo, em volta e em todos os lugares, para todos bem como para si
mesmo, ele permaneceu permeando o mundo todo com a mente imbuída de
equanimidade, abundante, transcendente, imensurável, sem hostilidade e sem má
vontade.
6. “Durante
oitenta e quatro mil anos o Rei Makhadeva brincou com jogos infantis, durante
oitenta e quatro mil anos ele atuou como vice-regente; durante oitenta e quatro
mil anos ele governou o reino; durante oitenta e quatro mil anos ele viveu a
vida santa neste mangueiral de Makhadeva depois de raspar o cabelo e a barba,
vestir o manto de cor ocre e deixar a vida em família e seguir a vida santa.
Por ter desenvolvido as quatro moradas divinas, com a dissolução do corpo, após
a morte, ele renasceu no mundo de Brahma.
7-9.
“Agora, ao final de muitos anos, muitas centenas de anos, muitos milhares de
anos, o filho do Rei Makhadeva se dirigiu ao seu barbeiro da seguinte forma:
... (igual aos versos 4 –6 acima inserindo “filho do Rei Makhadeva”) ... Por
ter desenvolvido as quatro moradas divinas, com a dissolução do corpo, após a
morte, ele renasceu no mundo de Brahma.
10. “Os
descendentes do filho do Rei Makhadeva até o número de oitenta e quatro mil
reis em sucessão, depois de raspar o cabelo e a barba, vestir o manto de cor
ocre e deixar a vida em família, seguiram a vida santa neste mangueiral de
Makhadeva. Eles permaneceram com o coração pleno de amor bondade, permeando o primeiro quadrante com a mente imbuída
de amor bondade ... com compaixão ...
com alegria altruísta ... com equanimidade ... sem má vontade.
11.
“Durante oitenta e quatro mil anos eles brincaram com jogos infantis, durante
oitenta e quatro mil anos eles atuaram como vice- regente; durante oitenta e
quatro mil anos eles governaram o reino; durante oitenta e quatro mil anos eles
viveram a vida santa neste mangueiral de Makhadeva depois de raspar o cabelo e a
barba, vestir o manto de cor ocre e deixar a vida em família e seguir a vida
santa. Por ter desenvolvido as quatro moradas divinas, com a dissolução do
corpo, após a morte, eles renasceram no mundo de Brahma
12. “Nimi
foi o último desses reis. Ele era um monarca justo que governava de acordo com
o Dhamma, um grande rei que estava estabelecido no Dhamma. Ele se comportava de
acordo com o Dhamma entre brâmanes e chefes de família, entre os habitantes das
cidades e do campo e observava os dias de Uposatha, no décimo quarto, décimo
quinto e oitavo dia da quinzena.
13. “Certa
vez, Ananda, quando os devas do Trinta e Três estavam reunidos na Assembléia de
Sudhamma, esta discussão teve início: ‘É um ganho, senhores, para o povo de
Videha, é um grande ganho para o povo de Videha que o seu Rei Nimi seja um
monarca justo que governa de acordo com o Dhamma, um grande rei que está
estabelecido no Dhamma. Ele se comporta de acordo com o Dhamma entre brâmanes e
chefes de família, entre habitantes das cidades e do campo, e ele observa os
dias de Uposatha, no décimo quarto, décimo quinto e oitavo dia da quinzena.’
“Então
Sakka, o senhor dos devas, se dirigiu aos devas do Trinta e Três da seguinte
forma: ‘Estimados senhores, vocês querem ver o Rei Nimi?’ – ‘Estimado senhor,
nós queremos ver o Rei Nimi.’
“Agora,
naquela ocasião, sendo o décimo quinto dia do Uposatha, o Rei Nimi lavou a
cabeça e foi para o terraço no topo do seu palácio, onde ele estava sentado
para a observância do Uposatha. Então, com a mesma rapidez com a qual um homem
forte pode estender o braço flexionado ou flexionar o braço estendido, Sakka, o
senhor dos devas, desapareceu dentre os devas do Trinta e Três e apareceu na
presença do Rei Nimi. Ele disse: ‘É um ganho para você, grande rei, é um grande
ganho para você, grande rei. Quando os devas do Trinta e Três estavam reunidos
na Assembléia de Sudhamma, esta discussão teve início: “É um ganho, senhores,
para o povo de Videha ... oitavo dia da quinzena.” Grande Rei, os devas desejam
vê-lo. Eu enviarei para você uma carruagem arreada com mil puros-sangues.
Grande Rei, monte na carruagem divina sem apreensões.’
“O Rei Nimi
concordou em silêncio. Então, com a mesma rapidez com a qual um homem forte
pode estender o braço flexionado ou flexionar o braço estendido, Sakka, o
senhor dos devas, desapareceu da presença do Rei Nimi e apareceu dentre os
devas do Trinta e Três.
14. “Então
Sakka, o senhor dos devas, se dirigiu ao cocheiro Matali da seguinte forma: ‘Venha,
estimado Matali, prepare uma carruagem arreada com mil puros-sangues e vá até o
Rei Nimi e diga: “Grande Rei, esta carruagem arreada com mil puros-sangues
foi-lhe enviada por Sakka, o senhor dos
devas. Grande Rei, monte na carruagem divina sem apreensões.’”
“’Que as
suas palavras sejam sagradas,’ o cocheiro Matali respondeu. E tendo preparado a
carruagem arreada com mil puros-sangues, ele foi até o Rei Nimi e disse:
‘Grande Rei, esta carruagem arreada com mil puros-sangues foi-lhe enviada por Sakka, o senhor dos devas. Grande
Rei, monte na carruagem divina sem apreensões. Mas, grande rei, por qual rota
devo conduzí-lo: aquela através da qual aqueles que praticam más ações
experimentam os resultados das más ações, ou aquela através da qual aqueles que
praticam boas ações experimentam os resultados das boas ações?’ – ‘Conduza-me
por ambas as rotas, Matali.’ [7]
15. “Matali levou o Rei Nimi até a Assembléia de Sudhamma. Sakka, o
senhor dos devas, viu o Rei Nimi vindo à distância e disse: ‘Venha, grande rei!
Bem vindo, grande rei! Os devas do Trinta e Três, reunidos na Assembléia de
Sudhamma disseram o seguinte: “É um ganho, senhores, para o povo de Videha ...
oitavo dia da quinzena.” Grande rei, os devas do Trinta e Três querem vê-lo.
Grande rei, desfrute do poder divino dentre os devas.’
“’Já basta,
estimado senhor. Que o cocheiro me leve de volta a Mithila. Lá me comportarei
de acordo com o Dhamma entre brâmanes e chefes de família, entre habitantes das
cidades e do campo, lá observarei os dias de Uposatha, no décimo quarto, décimo
quinto e oitavo dia da quinzena.’
16. “Então
Sakka, o senhor dos devas, se dirigiu ao cocheiro Matali da seguinte forma:
‘Venha, estimado Matali, prepare uma carruagem arreada com mil puros-sangues e
conduza o Rei Nimi de volta a Mithila.’
“’Que as
suas palavras sejam sagradas,’ o cocheiro Matali respondeu. E tendo preparado a
carruagem arreada com mil puros-sangues, ele conduziu o Rei Nimi de volta a Mithila.
E lá, de fato, o Rei Nimi se comportou de acordo com o Dhamma entre brâmanes e
chefes de família, entre habitantes das cidades e do campo, e observou os dias
de Uposatha, no décimo quarto, décimo quinto e oitavo dia da quinzena.
17-19.
“Então, ao final de muitos anos, muitas centenas de anos, muitos milhares de
anos, o Rei Nimi se dirigiu ao seu barbeiro da seguinte forma: ... (igual aos
versos 4 –6 acima inserindo “Rei Nimi”) ... Por ter desenvolvido as quatro
moradas divinas, com a dissolução do corpo, após a morte, ele renasceu no
mundo de Brahma.
20. “Agora,
o Rei Nimi tinha um filho chamado Kalarajanaka. Ele não deixou a vida em
família para seguir a vida santa. Ele interrompeu aquela boa prática. Ele foi o
último homem dentre eles.
21. “Agora, Ananda, você poderá pensar assim: ‘Com certeza, uma outra
pessoa era o Rei Makhadeva naquela ocasião.’ Mas essa não deve ser a
interpretação. Era eu o Rei Makhadeva naquela ocasião. Eu instituí aquela boa
prática e as gerações subseqüentes deram seguimento àquela boa prática
instituída por mim. Mas esse tipo de boa prática não conduz ao desencantamento,
ao desapego, à cessação, à paz, ao conhecimento direto, à iluminação, a
Nibbana, mas apenas ao renascimento no mundo de Brahma.[A] Mas há essa outra boa prática que conduz ao completo
desencantamento, ao desapego, à cessação, à paz, ao conhecimento direto, à
iluminação, a Nibbana. E qual é essa boa prática? É este Nobre Caminho Óctuplo;
isto é, entendimento correto, pensamento correto, linguagem correta, ação
correta, modo de vida correto, esforço correto, atenção plena correta e
concentração correta. Essa é a boa prática instituída por mim agora, que conduz
ao completo desencantamento, ao desapego, à cessação, à paz, ao conhecimento
direto, à iluminação, a Nibbana.
“Ananda, eu
lhe digo: dê seguimento a esta boa prática instituída por mim e não seja o
último homem. Ananda, quando há dois homens vivos, aquele sob o qual ocorre uma
interrupção desta boa prática – ele é o último homem dentre eles. Portanto,
Ananda, eu lhe digo: dê seguimento a esta boa prática instituída por mim e não
seja o último homem.” [8]
Isso foi o que disse o Abençoado. O venerável Ananda ficou satisfeito e
contente com as palavras do Abençoado.
Notas:
[1] Veja o Makhadeva Jataka (Num. 9) e o Nimi
Jataka (Num. 54). O Rei Makhadeva e o Rei Nimi foram nascimentos anteriores do
Buda Gotama. [Retorna]
[2] O mangueiral havia sido plantado por
Makhadeva e por isso levava o seu nome. [Retorna]
[3] MA: Ele se fundamentava nos dez tipos de
ações benéficas. [Retorna]
[4] O Uposatha é a observância religiosa da
antiga Índia, também adotada como tal pelo Budismo. Veja o MN
4, nota 4. [Retorna]
[5] De acordo com a cosmologia Budista o tempo
de vida dos seres humanos varia entre um mínimo de dez anos e um máximo de muitos
milhares de anos. Makhadeva vivia numa época na qual o tempo de vida era dos
mais longos. [Retorna]
[6] Quanto aos “mensageiros divinos”, os
augúrios da velhice, enfermidade e morte, veja o MN 130.
[Retorna]
[7] MA: Matali primeiro o conduziu através dos
infernos e depois regressou e o conduziu através do paraíso. [Retorna]
[A] É interessante observar que esta afirmação
do Buda coloca em dúvida que todas as práticas do Bodisatva em vidas
passadas tinham como objetivo a busca pela iluminação. Veja também o DN 19.61.[Retorna]
[8] MA: A boa prática é interrompida por um
bhikkhu virtuoso quando ele pensa, “Eu não posso alcançar o estado de arahant”
e assim não aplica a sua energia. A boa prática foi interrompida por um bhikkhu
que é corrupto. A boa prática tem tido seguimento através dos sete sekhas.
A boa prática tem tido seguimento através do arahant. [Retorna]
Revisado: 8 Dezembro 2015
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