Majjhima Nikaya 91
Brahmayu Sutta
Brahmayu
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1. Assim ouvi.
Em certa ocasião, o Abençoado estava perambulando pelo país dos Videhas com uma
grande Sangha de bhikkhus, com quinhentos bhikkhus.
2. Agora,
naquela ocasião o brâmane Brahmayu estava vivendo em Mithila. Ele era um velho, envelhecido, com a idade avançada, pressionado pelos anos, avançado na vida, chegando ao
último estágio; ele estava no seu centésimo vigésimo ano. Ele era um mestre
dos três Vedas com os seus mantras, liturgia, fonologia e etimologia e as
histórias como quinto elemento; hábil em filologia e gramática, ele era um
perito em filosofia natural e nas marcas de um grande homem.[1]
3. O brâmane Brahmayu ouviu: “Gotama o
contemplativo, o filho dos Sakyas, que adotou a vida santa deixando o clã dos
Sakyas, anda perambulando pelo país dos Videhas com um grande número de
bhikkhus, com quinhentos bhikkhus. E acerca desse mestre Gotama existe essa boa
reputação: ‘Esse Abençoado é um arahant, perfeitamente iluminado, consumado
no verdadeiro conhecimento e conduta, bem-aventurado, conhecedor dos mundos, um
líder insuperável de pessoas preparadas para serem treinadas, mestre de devas e
humanos, desperto, sublime. Ele declara - tendo realizado por si próprio com o
conhecimento direto - este mundo com os seus devas, maras e brahmas, esta
população com seus contemplativos e brâmanes, seus príncipes e povo. Ele ensina o
Dhamma, com o significado e fraseado corretos, que é admirável no início,
admirável no meio, admirável no final; e ele revela uma vida santa que é
completamente perfeita e imaculada. É bom poder encontrar alguém tão nobre.’
4. Agora,
naquela época o brâmane Brahmayu tinha um pupilo, o jovem Uttara, que era um
estudante dos Vedas ... um perito em filosofia natural e nas marcas de um
grande homem. Ele disse para Uttara: “Estimado Uttara, Gotama o contemplativo,
o filho dos Sakyas, que adotou a vida santa deixando o clã dos Sakyas, está perambulando
pelo país dos Videhas com uma grande Sangha de bhikkhus, com quinhentos
bhikkhus ... É bom poder encontrar alguém tão nobre. Agora, estimado Uttara, vá
ver o contemplativo Gotama para descobrir se esse relato é correto ou não e se
o Mestre Gotama é como dizem. Assim, conheceremos o Mestre Gotama por seu
intermédio.”
5. “Senhor, como irei descobrir se esse relato é correto ou não e se o
Mestre Gotama é como dizem ?”
“Estimado
Uttara, as trinta e duas marcas de um grande homem foram transmitidas através
dos nossos mantras e o Grande Homem que as possui tem apenas dois possíveis destinos, nenhum outro. [2]
Se ele viver a
vida em família ele se tornará um Monarca que gira a roda, um monarca justo que
governará de acordo com o Dhamma; conquistador dos quatro
pontos cardeais, que estabelecerá a segurança no seu reino e que possuirá os
sete tesouros. Que são: a Roda Preciosa, o Elefante Precioso, o Cavalo
Precioso, a Jóia Preciosa, a Mulher Preciosa, o Tesoureiro Precioso e como
sétimo o Conselheiro Precioso. [3] Ele terá
mais de mil filhos que serão corajosos e heróicos e que aniquilarão os
exércitos inimigos. Ele governará, tendo conquistado esta terra circundada pelo
mar, sem bastão ou espada, através do Dhamma. Mas se ele deixar a vida em
família e seguir a vida santa, então ele se tornará um arahant, um Buda
perfeitamente iluminado, aquele que remove o véu do mundo.[4]
E eu, Uttara, sou o transmissor dos mantras e você é o
recebedor.
6. ‘Sim,
senhor,’ ele respondeu. Ele se levantou, e depois de homenagear o brâmane
Brahmayu, mantendo-o à sua direita,
partiu em direção ao país dos Videhas, onde o Abençoado estava
perambulando. Viajando em etapas ele chegou até onde o Abençoado estava e ambos
se cumprimentaram. Depois que a conversa amigável e cortês havia terminado, ele
sentou a um lado e procurou as trinta e
duas marcas de um Grande Homem no corpo do Abençoado. Ele viu mais ou menos as
trinta e duas marcas de um Grande Homem no corpo do Abençoado, exceto duas; ele
ficou em dúvida e não podia ter certeza sobre duas dessas marcas, e não pôde
chegar a uma conclusão sobre elas: sobre a genitália contida numa bainha e
sobre o tamanho da língua.
Então,
ocorreu ao Abençoado que: “Este estudante brâmane Uttara vê mais ou menos as
trinta e duas marcas de um Grande Homem no meu corpo, exceto duas; ele tem
dúvida e incerteza sobre duas dessas marcas e não pode chegar a uma conclusão
sobre elas: sobre a genitália contida numa bainha e sobre o tamanho da língua.
7. Então, o
Abençoado através dos seus poderes supra-humanos fez com que o estudante
brâmane Uttara pudesse ver a sua genitália contida numa bainha. [5]
Em seguida, o Abençoado esticou a língua para fora, lambendo
ambas as orelhas e ambas as narinas e depois cobriu toda a extensão da sua testa com a língua.
8. Então, o
estudante brâmane Uttara pensou: “O contemplativo Gotama está provido de todas
as trinta e duas marcas de um Grande Homem, completas e sem faltar nenhuma. E
se eu seguisse o contemplativo Gotama e observasse o seu comportamento?”
Então, ele
seguiu o Abençoado por sete meses como uma sombra, sem nunca deixá-lo. Ao fim
dos sete meses no país dos Videhas, ele partiu em jornada para Mithila onde se
encontrava o brâmane Brahmayu. Ao chegar, ele o cumprimentou e sentou a um
lado. Em seguida o brâmane Brahmayu perguntou: “Bem, estimado Uttara, o relato
sobre o Mestre Gotama é correto ou não, o Mestre Gotama é como dizem ?”
9. “O
relato sobre o Mestre Gotama é correto, não incorreto; e o Mestre Gotama é como
dizem, não de outra forma. Ele possui as trinta e duas marcas de um Grande
Homem.
Mestre
Gotama tem os pés chatos – essa é a marca de um Grande Homem no Mestre Gotama.
Nas solas
dos seus pés há rodas com mil raios e cubo, toda completa ...
Ele tem os
calcanhares protuberantes ...
Os dedos
dos pés e das mãos são longos ...
As mãos e
os pés são suaves e delicados ...
As mãos e
os pés são reticulados ...
Os seus
tornozelos são alongados ...
As suas
pernas são como as de um antílope ...
Quando ele
fica em pé sem se inclinar, as palmas de ambas mãos tocam os joelhos ...
A sua
genitália está contida numa bainha ...
A sua complexão
é brilhante, de cor dourada ...
A sua pele
é sutil e devido à sutileza da sua pele, a poeira e a sujeira não aderem ao seu
corpo ...
Os pelos do
corpo crescem separadamente, cada um no seu poro ....
As pontas
dos pelos do corpo são curvadas para cima; a cor dos pelos é preta azulada,
enrolados para a direita ...
Ele tem os
membros retos de um Brahma ....
Ele tem
sete convexidades ... [6]
Ele tem o torso de um leão ...
Não há um
sulco entre os ombros ...
Ele tem as
proporções de uma figueira-de-bengala; a envergadura dos seus braços equivale à
altura do seu corpo, e a altura do seu corpo equivale à envergadura dos seus
braços ...
O seu
pescoço e ombros são nivelados ...
O seu
paladar é excepcionalmente apurado ... [7]
Ele tem a mandíbula de um leão ...
Ele tem
quarenta dentes ..
Os seus
dentes são nivelados ....
Os seus
dentes não têm espaços ...
Os seus
dentes são bem brancos ...
Ele tem uma
língua muito grande ...
Ele tem uma
voz divina, como o gorjeio de um pássaro ...
Os seus
olhos são de um azul profundo ...
Ele tem os
cílios de um touro ...
Ele tem
pelos no espaço entre as sobrancelhas e eles são brancos com o brilho do
algodão macio ...
A sua
cabeça tem o formato de um turbante - essa é a marca de um Grande Homem no
Mestre Gotama. [8]
O Mestre Gotama está dotado dessas trinta e duas marcas de um Grande
Homem.
10. “Ao
caminhar, ele dá o primeiro passo com o pé direito. Ele não estende o pé em
demasia ou o coloca muito perto. Ele caminha nem tão rápido, nem tão devagar.
Ele caminha sem que os joelhos se toquem. Ele caminha sem que os tornozelos se
toquem. Ele caminha sem levantar ou baixar as coxas, sem trazê-las juntas ou mantê-las separadas. Ao caminhar,
apenas a parte baixa do seu corpo oscila, e ele não caminha por meio do esforço
corporal. Ao virar-se para olhar, ele assim o faz com todo o corpo. Ele não
mantém o olhar para cima; ele não mantém o olhar para baixo. Ele não caminha
olhando em volta. Ele mantém o olhar a uma pequena distância à sua frente; e
numa distância maior, ele tem conhecimento e visão desimpedidos.
11. “Quando
ele chega num lugar fechado, ele não levanta ou abaixa o seu corpo, ou o
inclina para frente, ou para trás. Ele dá a volta não muito distante do
assento, nem muito próximo deste. Ele não se apóia no assento com as mãos. Ele
não larga o corpo sobre o assento.
12. “Quando
sentado num lugar fechado, ele não fica mexendo as mãos nervosamente. Ele não
mexe os pés nervosamente. Ele não senta com os joelhos cruzados. Ele não senta
com os tornozelos cruzados. Ele não senta com a mão segurando o queixo. Quando
sentado num lugar fechado ele não tem temor, ele não treme e se agita, ele não
fica nervoso. Destemido, sem tremer ou se agitar, ou ficar nervoso, os seus
pelos não ficam em pé, e ele tem como intenção o isolamento.
13. “Ao
receber água para a tigela, ele não levanta ou abaixa a tigela, ou a inclina
para frente ou para trás. Ele recebe nem pouca, nem muita água para a tigela.
Ele lava a tigela sem fazer ruído. Ele lava a tigela sem girá-la. Ele não
coloca a tigela no chão para lavar as mãos: quando as mãos estão lavadas a
tigela está lavada; e quando a tigela está lavada as mãos estão lavadas. Ele
verte a água da tigela nem demasiado longe, nem demasiado perto e ele não verte
o seu conteúdo por todos os lados.
14. “Ao
receber arroz, ele não levanta ou abaixa a tigela, ou a inclina para frente ou
para trás. Ele recebe nem pouco, nem muito arroz. Ele adiciona os molhos na proporção
correta; ele não excede a quantidade correta de molho em cada bocado. Ele gira
o bocado duas ou três vezes na boca e depois o engole, e nenhum grão de arroz
entra no seu corpo sem ser mastigado, e nenhum grão de arroz permanece na sua
boca; depois ele toma outro bocado. Ele se alimenta experienciando o sabor,
embora sem experimentar cobiça pelo sabor. A comida que ele ingere possui oito
fatores: o alimento não deve ser tomado como forma de diversão ou para
embriaguez, tampouco com o objetivo de embelezamento e para ser mais atraente,
mas somente com o propósito de manter a resistência e continuidade do corpo,
como forma de dar um fim ao desconforto e para auxiliar a vida santa.
Considerando: ‘Dessa forma darei um fim às antigas sensações (de fome) sem
despertar novas sensações (de comida em excesso) e serei saudável e sem culpa e
viverei em comodidade.’” [9]
15. “Depois de comer e receber água para a tigela, ele não levanta ou
abaixa a tigela, ou a inclina para frente, ou para trás. Ele recebe nem pouca,
nem muita água para a tigela. Ele lava a tigela sem fazer ruído. Ele lava a
tigela sem girá-la. Ele não coloca a tigela no chão para lavar as mãos: quando
as mãos estão lavadas a tigela está lavada; e quando a tigela está lavada as
mãos estão lavadas. Ele verte a água da tigela nem demasiado longe, nem
demasiado perto e ele não verte o seu conteúdo por todos os lados.
16. “Depois
de comer, ele coloca a tigela nem muito longe, nem muito perto; e ele não é nem
negligente e tampouco excessivamente preocupado com relação à tigela.
17. “Depois
de comer, ele senta em silêncio durante algum tempo, mas ele não deixa escapar
o momento certo para a benção. [10] Depois
de comer e ao dar a benção, ele assim o faz sem criticar a refeição ou na
expectativa de uma outra refeição; ele instrui, motiva, estimula e encoraja a
audiência com um discurso puramente do Dhamma. Depois de ter feito isso, ele
levanta do seu assento e parte.
18. “Ele
caminha nem muito depressa, nem muito devagar, e ele não caminha como alguém
que quer se evadir.
19. “O seu
manto é usado nem muito alto, nem muito baixo no corpo, nem demasiado justo no
corpo, nem demasiado folgado no corpo, nem o vento faz com que o manto se solte
do seu corpo. A poeira e a sujeira não sujam o seu corpo.
20. “Ao
chegar no monastério, ele senta num assento que tenha sido preparado. Tendo
sentado, ele lava os pés, embora ele não tenha preocupação com a beleza dos pés.
Tendo lavado os pés, ele senta com as pernas cruzadas, mantém o corpo ereto e
estabelece a plena atenção à sua frente. Ele não ocupa a sua mente com a sua
própria aflição, ou a aflição dos outros, ou a aflição de ambos; ele senta com
a mente focada no seu próprio bem-estar, no bem-estar dos outros e no bem-estar
de ambos, até mesmo no bem-estar de todo o mundo.
21. “Ao
chegar no monastério, ele ensina o Dhamma para uma audiência. Ele nem elogia e
tampouco recrimina aquela audiência; ele instrui, motiva, estimula e encoraja a
audiência com um discurso puramente do Dhamma. O discurso que sai da sua boca
tem oito qualidades: é claro, inteligível, melodioso, audível, envolvente,
eufônico, profundo e sonoro. Mas ao mesmo tempo que a sua voz é inteligível até
onde há audiência, o seu discurso não vai além da audiência. Quando as pessoas
foram instruídas, motivadas, estimuladas e encorajadas por ele, elas se
levantam dos seus assentos e partem olhando apenas para ele e sem preocupação
com mais nada.
22. “Nós
vimos o Mestre Gotama caminhando, senhor, nós o vimos em pé, nós o vimos entrar
num lugar fechado, nós o vimos dentro de um lugar fechado sentado em silêncio
depois de comer, e nós o vimos dar a benção depois de comer, nós o vimos indo
para o monastério em silêncio, nós o vimos no monastério ensinando o Dhamma
para uma audiência. Assim é o Mestre Gotama; assim é ele, e mais do que isso.”
[11]
23. Quando isso foi dito, o brâmane Brahmayu levantou-se do seu assento
e arrumando o manto externo sobre o ombro, juntou as mãos em respeitosa
saudação na direção do Abençoado e pronunciou esta exclamação três vezes:
“Honra ao Abençoado, um arahant, perfeitamente iluminado! Honra ao Abençoado, um arahant, perfeitamente
iluminado!Honra ao Abençoado, um arahant, perfeitamente iluminado! Talvez um dia
desses possamos encontrar o Mestre Gotama e ter uma conversa com ele.”
24. Então,
no transcurso da sua perambulação o Abençoado acabou chegando em Mithila. Lá, o
Abençoado se estabeleceu no Manguezal de
Makhadeva. Os brâmanes chefes de família de Mithila ouviram: “Gotama o contemplativo, o filho dos Sakyas,
que adotou a vida santa deixando o clã dos Sakyas, andava perambulando no país
dos Videhas com um grande número de bhikkhus, com quinhentos bhikkhus, ele
agora chegou em Mithila estabelecendo-se no Manguezal de Makhadeva. E acerca desse mestre Gotama
existe essa boa reputação ...(igual ao verso 3) ... É bom poder encontrar
alguém tão nobre.’
25. Assim,
os brâmanes chefes de família de Mithila foram até o Abençoado. Alguns
homenagearam o Abençoado e sentaram a um lado; alguns trocaram saudações
corteses com ele e após a troca de saudações sentaram a um lado; alguns
ajuntaram as mãos em respeitosa saudação e sentaram a um lado; alguns anunciaram o seu nome e clã
e sentaram a um lado. Alguns permaneceram em silêncio e sentaram a um lado.
26. O
brâmane Brahmayu ouviu: “Gotama o contemplativo, o filho dos Sakyas, que adotou
a vida santa deixando o clã dos Sakyas chegou em Mithila estabelecendo-se no
Manguezal de Makhadeva.”
Então, o
brâmane Brahmayu foi para o Manguezal de Makhadeva com um número de estudantes
brâmanes. Ao chegar no manguezal, ele pensou: “Não é apropriado que eu vá até o
contemplativo Gotama sem ser primeiro anunciado.” Então, ele se dirigiu a um
certo estudante brâmane: “Venha, estudante brâmane, vá até o contemplativo
Gotama e pergunte em meu nome se o contemplativo Gotama está livre de aflições
e enfermidades, e se ele se encontra saudável, forte e vivendo com conforto,
dizendo: ‘Mestre Gotama, o brâmane Brahmayu pergunta se o Mestre Gotama está
livre de enfermidades … vivendo com conforto,’ e diga o seguinte: ‘O brâmane
Brahmayu, Mestre Gotama, é um velho, envelhecido, pressionado pelos anos, com a idade avançada, chegando ao
último estágio; ele está no seu centésimo
vigésimo ano. Ele é um mestre dos três Vedas com os seus mantras, liturgia,
fonologia e etimologia e as histórias como quinto elemento; hábil em filologia
e gramática, ele é um perito em filosofia natural e nas marcas de um grande
homem. De todos os brâmanes chefes de família que vivem em Mithila, o brâmane
Brahmayu é declarado como o principal dentre eles em riqueza, no conhecimento
dos mantras, em idade e fama. Ele deseja ver o Mestre Gotama.’”
“Sim,
senhor” o estudante brâmane respondeu. Ele foi até o Abençoado e ambos se
cumprimentaram, e quando a conversa amigável e cortês havia terminado, ele
ficou em pé a um lado e relatou a sua mensagem. [O Abençoado disse:]
“Agora é o
momento para que o brâmane Brahmayu faça como julgar adequado.”
27. Então,
o estudante brâmane foi até o brâmane Brahmayu e disse: “A permissão foi
concedida pelo contemplativo Gotama. Agora é o momento, senhor, para fazer como
julgar adequado.”
Assim o
brâmane Brahmayu foi até o Abençoado. A assembléia o viu chegando à distância e
de imediato eles abriram o caminho como para alguém que é bem conhecido e
famoso. Então, o brâmane Brahmayu disse para a assembléia: “Basta senhores, que
cada um sente no seu assento. Eu sentarei aqui ao lado do contemplativo
Gotama.”
28. Então,
ele foi até o Abençoado e ambos se cumprimentaram, e quando a conversa amigável
e cortês havia terminado, ele sentou a um lado e procurou pelas trinta e duas
marcas de um Grande Homem no corpo do Abençoado. Ele viu mais ou menos as trinta
e duas marcas de um Grande Homem no corpo do Abençoado, exceto duas; ele ficou
em dúvida e não podia ter certeza sobre duas dessas marcas, e não pôde chegar a
uma conclusão sobre elas: sobre a genitália contida numa bainha e sobre o
tamanho da língua.
29. Então o
brâmane Brahmayu se dirigiu ao Abençoado em versos:
“As duas e trinta marcas eu aprendi
que são as marcas de um Grande Homem -
mas eu não vejo duas dessas
no seu corpo, Gotama.
É aquilo que deve ser coberto por um pano
escondido numa bainha, homem superior?
Embora nomeada por uma palavra do sexo feminino,[12]
talvez a sua língua seja máscula?
Talvez a sua língua também seja grande,
de acordo com aquilo que foi ensinado?
Por favor ponha a língua um pouco para fora
e assim, Oh! Vidente, sane a nossa dúvida
para o bem-estar nesta mesma vida
e felicidade nas vidas que virão.
E agora ansiamos pela permissão para perguntar
algo que desejamos conhecer.”
30. Então,
ocorreu ao Abençoado que: “Este brâmane Brahmayu vê mais ou menos as trinta e
duas marcas de um Grande Homem no meu corpo, exceto duas; ele tem dúvida e
incerteza sobre duas dessas marcas e não pode chegar a uma conclusão sobre
elas: sobre a genitália contida numa bainha e sobre o tamanho da língua.
Então, o
Abençoado através dos seus poderes supra-humanos fez com que o brâmane Brahmayu
pudesse ver a sua genitália contida numa bainha. Em seguida, o Abençoado
esticou a língua para fora, lambendo ambas as orelhas e ambas as narinas, e
depois cobriu toda a extensão da sua testa com a língua
31. Então,
o Abençoado disse estes versos em resposta ao brâmane Brahmayu:
“As duas e trinta marcas que você aprendeu
que são as marcas de um Grande Homem -
todas podem ser encontradas no meu corpo:
portanto, brâmane, não tenha mais dúvida disso,
o que deve ser conhecido foi conhecido diretamente,
o que deve ser desenvolvido foi desenvolvido,
o que deve ser abandonado foi abandonado,
por conseguinte, brâmane, eu sou um Buda.[13]
Para o bem-estar nesta mesma vida
e felicidade nas vidas que virão,
visto que a permissão lhe foi concedida, por favor pergunte o que
quiser,
qualquer coisa a que você aspire conhecer.”
32. Então o
brâmane Brahmayu pensou: “A permissão me foi concedida pelo contemplativo
Gotama. Sobre o que devo perguntar:
sobre o bem nesta vida ou nas vidas que virão?” Então ele pensou: “Eu
sou hábil no que diz respeito ao bem nesta vida, e os outros também me perguntam
sobre o bem nesta vida. Porque não lhe pergunto sobre o bem nas vidas que
virão?” Então ele se dirigiu ao Abençoado em versos:
“Como alguém se torna um brâmane?
E como se obtém o conhecimento? [14]
Como se obtém o conhecimento tríplice?
E como alguém se torna um estudioso santo?
Como alguém se torna um arahant?
E como alguém alcança a perfeição?
Como alguém é um sábio silencioso?
E como alguém pode ser chamado de Buda?” [15]
33. Então o Abençoado disse estes versos em resposta:
“Quem conhece as suas vidas passadas,
vê os paraísos e os estados de privação,
e alcançou a destruição do nascimento -
um sábio que compreende através do conhecimento direto,
que sabe que a sua mente está purificada,
completamente livre de qualquer desejo,
que abandonou o nascimento e morte,
perfeito na vida santa,
que transcendeu tudo -
alguém assim é chamado de Buda. [16]
34. Quando isso foi dito, o brâmane Brahmayu
levantou do seu assento e depois de arrumar o seu manto externo sobre um ombro,
prostrando-se com a cabeça aos pés do Abençoado, cobrindo os pés do Abençoado
com beijos e acariciando-os com as mãos, pronunciando o seu nome: “Eu sou o
brâmane Brahmayu, venerável senhor; Eu sou o brâmane Brahmayu de Kosala,
venerável senhor.”
35. Aqueles
presentes na assembléia ficaram admirados e maravilhados e disseram: “É
admirável, senhores, é maravilhoso, esse grande poder e força que o contemplativo
Gotama possui, e que faz com que o famoso brâmane Brahmayu preste tamanha
demonstração de humildade!”
Então, o
Abençoado disse para o brâmane Brahmayu: “Já basta, brâmane, levante-se; sente
no seu assento visto que a sua mente tem confiança em mim.”
O brâmane
Brahmayu então levantou e sentou-se no seu assento.
36. Então,
o Abençoado transmitiu-lhe o ensino gradual, [17] isto é, ele falou sobre a generosidade, sobre a virtude, sobre o
paraíso; ele explicou o perigo, a degradação e as contaminações dos prazeres
sensuais e as vantagens da renúncia. Quando ele percebeu que a mente do brâmane Brahmayu estava pronta, receptiva, livre de obstáculos, satisfeita, clara, com serena confiança, ele explicou o ensinamento particular dos Budas: o
sofrimento, a sua origem, a sua cessação e o caminho. Tal como um pano limpo,
com todas as manchas removidas, absorverá um corante de modo adequado, assim
também, enquanto o brâmane Brahmayu estava ali sentado, a visão imaculada do
Dhamma surgiu nele: “Tudo que está sujeito ao surgimento está sujeito à
cessação.” O brâmane Brahmayu viu o Dhamma, alcançou o Dhamma, compreendeu o
Dhamma, examinou a fundo o Dhamma; ele superou a dúvida, se libertou da
perplexidade, conquistou a intrepidez, e se tornou independente dos outros na
Revelação do Mestre.
37. Então,
ele disse para o Abençoado: “Magnífico, Mestre Gotama! Magnífico, Mestre
Gotama! Mestre Gotama esclareceu o Dhamma de várias formas, como se tivesse
colocado em pé o que estava de cabeça para baixo, revelasse o que estava
escondido, mostrasse o caminho para alguém que estivesse perdido ou segurasse
uma lâmpada no escuro para aqueles que possuem visão pudessem ver as formas. Eu
busco refúgio no Mestre Gotama, no Dhamma e na Sangha dos bhikkhus. Que o
Mestre Gotama me aceite como discípulo leigo que buscou refúgio para o
resto da vida. Que o
Abençoado junto com a Sangha dos bhikkhus concorde em aceitar a refeição de
amanhã.” O Abençoado concordou em silêncio. Então, sabendo que o Abençoado
havia concordado, o brâmane Brahmayu levantou do seu assento e depois de
homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita, ele partiu.
38. Então,
quando a noite terminou, o brâmane Brahmayu fez com que fossem preparados
vários tipos de boa comida na sua própria residência, e fez com que a hora
fosse anunciada para o Abençoado: ‘É
hora, Mestre Gotama, a
refeição está pronta.’
Então, ao
amanhecer, o Abençoado se vestiu e tomando a sua tigela e o manto externo, foi
junto com a Sangha dos bhikkhus para a residência do brâmane Brahmayu e sentou
num assento que havia sido preparado. Então, durante uma semana, com as suas
próprias mãos, o brâmane Brahmayu serviu e satisfez a Sangha dos bhikkhus
liderada pelo Buda com os vários tipos de alimentos.
39. Ao
final daquela semana, o Abençoado saiu perambulando pelo pais dos Videhas.
Pouco depois dele haver partido, o brâmane Brahmayu morreu. Então um grande
número de bhikkhus foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo, eles sentaram a
um lado e disseram: “Venerável senhor, o brâmane Brahmayu morreu. Qual o seu
destino? Qual o seu percurso futuro?”
“Bhikkhus,
o brâmane Brahmayu era sábio. Ele praticava de acordo com o Dhamma e não me
causou problemas na interpretação do Dhamma. Com a destruição dos cinco
primeiros grilhões, ele renasceu espontaneamente (nas Moradas Puras) e lá
realizará o parinibbana sem nunca mais retornar desse mundo.”
Isso foi o que disse o Abençoado. Os bhikkhus ficaram
satisfeitos e contentes com as palavras do Abençoado.
[1] Esta é uma descrição padrão de um brâmane
estudado. De acordo com MA, os Três Vedas seriam o Iru, Yaju e Sarna (= Rig,
Yajur e Saman). O quarto Veda, o Atharva, não é mencionado, mas MA diz que a
sua existência está implícita ao chamar as histórias, (Itihasa), como quinto
elemento dos trabalhos considerados como confiáveis pelos brâmanes. Quanto às
marcas de um grande homem, MA diz que esta era uma ciência baseada em 12.000
obras que explicavam as características de grandes homens, tais como Budas,
paccekabuddhas, discípulos principais, discípulos destacados, monarcas que
giram a roda, etc. Essas obras incluíam 16.000 versos denominados “O Mantra do
Buda.” [Retorna]
[2] As trinta e duas marcas, enumeradas no
verso 9 abaixo, são o objeto de todo um sutta do Digha Nikaya, DN 30, Lakkhana Sutta. Nesse sutta cada uma das
marcas é explicada como o fruto de kamma de uma virtude em particular
aperfeiçoada pelo Buda durante as suas existências anteriores como um
bodisatva. [Retorna]
[3] Os sete tesouros são discutidos no MN 129.34-41. A obtenção da Roda Preciosa explica
porque ele é chamado de ‘Monarca que Gira a Roda.’ [Retorna]
[4] MA: O mundo, envelopado pela obscuridade
das contaminações, está coberto por sete véus: cobiça, raiva, delusão,
presunção, idéias, ignorância e conduta imoral. Tendo já removido esses véus, o
Buda permanece irradiando luz por todos os lados. [Retorna]
[5] MA explica que o Buda realizou este feito
depois de primeiro se assegurar que o mestre de Uttara, Brahmayu, tinha o
potencial para alcançar o fruto do não retorno, e que a realização desse fruto
dependia da dissipação das dúvidas de Uttara. [Retorna]
[6] As sete são: a parte de trás dos quatro
membros, os dois ombros e o tronco. [Retorna]
[7] Rasaggasaggi. O Lakkhana Sutta
explica (DN 30.2.7): “Qualquer coisa que ele toque
com a ponta da língua ele experimenta na sua garganta e o sabor se dispersa por
toda parte.” É difícil, no entanto, entender como essa qualidade pode ser considerada
uma característica física ou como isto poderia ser percebido pelos outros. [Retorna]
[8] Esta marca, unhisa, explica a
protuberância que em geral é vista no topo da cabeça das imagens do Buda. [Retorna]
[9] Esta é uma reflexão padrão sobre o uso
correto da comida esmolada, tal como no MN 2.14. [Retorna]
[10] A benção, (anumodana), é um breve
discurso depois da refeição, instruindo os doadores sobre algum aspecto do
Dhamma e expressando o desejo de que o kamma meritório traga muitos frutos. [Retorna]
[11] MA: Esta é a intenção: “As excelentes
qualidades que não descrevi são muito mais numerosas do que aquelas que
descrevi. As excelentes qualidades do Mestre Gotama são como a grande terra e o
grande oceano; expostas em detalhe estas são infinitas e imensuráveis, como o
espaço.” [Retorna]
[12] A palavra em Pali para língua, jivha,
é do gênero feminino. [Retorna]
[13] O que deve ser conhecido, (abhiññeyya),
são as Quatro Nobres Verdades, o que deve ser desenvolvido, (bhavetabba),
é o Nobre Caminho Óctuplo, e o que deve ser abandonado, (pahatabba), são as impurezas encabeçadas
pela cobiça. Aqui o contexto exige que a palavra “Buda” seja compreendida com o
sentido específico de Um Perfeitamente Iluminado, (sammasambuddha). [Retorna]
[14] Vedaga. Este termo e os dois que
seguem, - tevijja e sotthiya – parecem ter representado os tipos
ideais entre os brâmanes; veja também o MN 39.24, 26, e
27. O sexto e sétimo termos - kevali e muni –
eram provavelmente tipos ideais entre as ordens contemplativas não Védicas. Pela
resposta, o Buda dota esses termos de um novo significado derivado do seu
próprio sistema espiritual. [Retorna]
[15] Aqui e na resposta a palavra “Buda” pode
significar simplesmente aquele que é iluminado ou desperto, com o significado
que se aplica a um arahant, embora a resposta de Brahmayu também possa sugerir
que a intenção seja o significado mais específico de um Perfeitamente
Iluminado. [Retorna]
[16] MA proporciona uma complicada explanação sobre
como a resposta do Buda responde a todas as oito questões de Brahmayu. [Retorna]
[17] Igual ao MN 56.18.
[Retorna]
Revisado: 14 Setembro 2013
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