Digha Nikaya 16
Mahaparinibbana Sutta
O Grande Discurso do Parinibbana
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1.1. Assim
ouvi. Em certa ocasião, o Abençoado estava em Rajagaha na
montanha do Pico do Abutre. Naquela ocasião, o Rei Ajatasattu Vedehiputta
desejava guerrear com os Vajjias. Ele
disse: “Atacarei os Vajjias que são muito fortes e poderosos. Irei aniquilá-los
e destruí-los, causar-lhes-ei ruína e destruição!”
1.2. E o Rei Ajatasattu disse para o seu primeiro-ministro, o Brâmane
Vassakara: “Brâmane, vá até o Abençoado e preste uma homenagem em meu nome, com
a sua cabeça aos pés dele e pergunte se ele está livre de enfermidades e
aflições, se está com saúde, forte e vivendo com conforto, dizendo: ‘Venerável senhor, o
Rei Ajatasattu Vedehiputta de Magadha deseja atacar os Vajjias e diz: “Atacarei os Vajjias que são muito fortes e poderosos. Irei aniquilá-los
e destruí-los, causar-lhes-ei ruína e destruição!” E
o que quer que o Abençoado diga, relate-o fielmente para mim, pois os
Tathagatas nunca mentem.”
1.3. “Muito
bem, venerável senhor,” disse Vassakara e tendo preparado as carruagens reais,
ele montou numa delas e saiu com toda a pompa da realeza de Rajagaha em direção
ao Pico do Abutre. Ele foi até onde a estrada permitia e depois continuou a pé
até onde o Abençoado estava e ambos se cumprimentaram. Quando a conversa cortês
e amigável havia terminado ele se sentou a um lado e relatou a mensagem do Rei.
1.4. Agora,
o venerável Ananda estava em pé atrás do Abençoado, ventilando-o. O Abençoado
disse:
“Ananda,
você ouviu dizer que os Vajjias se reúnem em assembléia regular e
frequentemente?” - “Eu ouvi que eles assim o fazem.”
“Ananda,
enquanto os Vajjias se reunirem em assembléias com freqüência e regularmente, é
de se esperar que eles prosperem e não que declinem. Você ouviu dizer que os
Vajjias se reúnem em harmonia, se separam em harmonia e conduzem os seus
negócios em harmonia?” - “Eu ouvi, venerável senhor, que eles assim o fazem.”
“Ananda,
enquanto os Vajjias se reunirem em harmonia, se separarem em harmonia e
conduzirem os seus negócios em harmonia, é de se esperar que eles prosperem e
não que declinem. Você ouviu dizer que os Vajjias não permitem aquilo que ainda
não foi autorizado e não restringem aquilo que foi autorizado, mas prosseguem
de acordo com aquilo que foi autorizado na sua tradição ancestral?” - “Eu ouvi,
venerável senhor” ... “Você ouviu dizer que eles
honram, respeitam, reverenciam e saúdam os seus anciãos e consideram que a eles
se deve dar ouvidos? ... que eles não raptam à força
as mulheres e as filhas dos outros e as obrigam a viver com eles? ... que eles
honram, respeitam, veneram e saúdam os santuários Vajjias dentro das cidades e
fora delas, não retirando o apoio adequado feito e dado anteriormente? ... que
medidas adequadas são tomadas para a segurança dos Arahants, para que esses Arahants possam viver lá no futuro,
e que aqueles que lá vivem possam permanecer com conforto?” - “Eu ouvi, venerável
senhor.” - “Ananda, enquanto medidas adequadas forem tomadas para a segurança dos Arahants, para que esses Arahants possam viver lá no futuro,
e que aqueles que lá vivem possam permanecer com conforto é de se esperar
que eles prosperem e não que declinem.”
1.5. Então,
o Abençoado disse para o Brâmane Vassakara:
“Certa vez,
Brâmane, quando eu estava no Santuário Sarandada em Vesali, eu ensinei aos
Vajjias esses sete princípios para prevenir o declínio e enquanto eles
mantiverem esses sete princípios, enquanto esses princípios permanecerem
vigentes, é de se esperar que os Vajjias prosperem e não que declinem.” Em
vista disso, Vassakara respondeu: “Venerável Gotama, se os Vajjias mantiverem
mesmo que um desses princípios, é de se esperar que
eles prosperem e não que declinem – quanto mais todos os sete. Com certeza os
Vajjias nunca serão conquistados pelo Rei Ajatasattu através da força das
armas, mas sim através da propaganda e
colocando-os uns contra os outros. E agora, venerável Gotama, estou muito
ocupado e tenho muito que fazer.” - “Brâmane, faça como julgar adequado.” Então,
Vassakara, satisfeito e contente com as palavras do Abençoado, levantou-se do
seu assento e partiu.
1.6. Pouco
tempo depois de Vassakara haver partido o Abençoado disse:
“Ananda, vá
até os bhikkhus que se encontram em Rajagaha e
convoque-os para o salão de assembléias.” - “Muito bem, venerável senhor,” Ananda
disse e assim fez. Então, ele voltou até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo
ficou em pé a um lado e disse: “Venerável senhor, a ordem dos bhikkhus está
reunida. Agora é o momento para o Abençoado fazer o que julgar adequado.”
Então, o
Abençoado levantou do seu assento, foi até o salão de assembléias e sentou
num assento que havia sido preparado e disse: “Bhikkhus, eu ensinarei para
vocês sete coisas que conduzem ao bem-estar. Ouçam
e prestem muita atenção àquilo que eu vou dizer.” – “Sim, venerável senhor,” os
bhikkhus responderam. O Abençoado disse o seguinte:
“Enquanto
os bhikkhus se reunirem em assembléia com freqüência e regularmente, é de se
esperar que eles prosperem e não que declinem. Enquanto eles se reunirem em
harmonia, se separarem em harmonia e conduzirem os seus
afazeres em harmonia, é de se esperar que eles prosperem e não que
declinem. Enquanto eles não permitirem aquilo que ainda não foi autorizado e
não restringirem aquilo que foi autorizado, mas prosseguirem de acordo com
aquilo que foi autorizado nas regras de treinamento ….; enquanto eles honrarem,
respeitarem, reverenciarem e saudarem os bhikkhus seniores que foram ordenados
há muito tempo, os pais e líderes da ordem ...; enquanto eles não forem uma
presa dos desejos que neles surgirem e que conduzem ao renascimento ...;
enquanto eles se dedicarem a viver nas florestas ....; enquanto eles mantiverem
a sua atenção plena estabelecida, para que no futuro os bons companheiros
venham até eles, e aqueles que já vieram se sintam bem na companhia deles ...;
enquanto os bhikkhus mantiverem essas sete coisas e forem vistos fazendo isso,
é de se esperar que eles prosperem e não que declinem.
1.7. “Eu
ensinarei para vocês outras sete coisas que conduzem ao bem-estar. Ouçam e
prestem muita atenção àquilo que eu vou dizer.” – “Sim, venerável senhor,” os
bhikkhus responderam. O Abençoado disse o seguinte: “Contanto que os bhikkhus
não se regozijem, não se deliciem e não fiquem
absortos em atividades, conversas, sono e convívio social; contanto que eles
não abriguem ou fiquem sob a influência de desejos inábeis e prejudiciais;
contanto que eles não tenham amigos, colegas ou companheiros prejudiciais;
contanto que eles não fiquem satisfeitos com realizações parciais contanto que os bhikkhus mantenham essas sete coisas e sejam
vistos agindo assim, é de se esperar que
eles prosperem e não que declinem.
1.8. “Eu
ensinarei para vocês outras sete coisas que conduzem ao bem-estar. Ouçam e
prestem muita atenção àquilo que eu vou dizer.” – “Sim, venerável senhor,” os
bhikkhus responderam. O Abençoado disse o seguinte: “Enquanto os bhikkhus mantiverem a fé, a
vergonha e o temor de cometer transgressões, o aprendizado, a energia
estimulada, a atenção plena estabelecida, a sabedoria, é de se esperar que
eles prosperem e não que declinem.
1.9. “Eu
ensinarei para vocês outras sete coisas que conduzem ao bem-estar. Ouçam e
prestem muita atenção àquilo que eu vou dizer.” – “Sim, venerável senhor,” os
bhikkhus responderam. O Abençoado disse o seguinte: “Enquanto
os bhikkhus desenvolverem os fatores da iluminação: da atenção plena, da
investigação dos fenômenos, da energia, do êxtase, da tranqüilidade, da
concentração, da equanimidade, é de se esperar que
eles prosperem e não que declinem.
1.10. “Eu
ensinarei para vocês outras sete coisas que conduzem ao bem-estar. Ouçam e
prestem muita atenção àquilo que eu vou dizer.” – “Sim, venerável senhor,” os
bhikkhus responderam. O Abençoado disse o seguinte: “Enquanto
os bhikkhus desenvolverem a percepção da impermanência, do não-eu, da
repulsa (do corpo), dos perigos (do corpo), do abandono, do desapego, da
cessação, é de se esperar que eles prosperem e não que declinem.
1.11. “Bhikkhus, eu ensinarei para vocês seis coisas que conduzem à vida
em comunidade. Enquanto os bhikkhus, tanto em público como em particular,
praticarem ações com amor bondade com o corpo, linguagem e mente para com os
seus companheiros na vida santa ... compartirem com os seus virtuosos companheiros
qualquer coisa que recebam como oferendas apropriadas, inclusive o conteúdo das
suas tigelas de esmolar, sem guardar apenas para si, …
observar consistentemente, sem alteração e ininterruptamente aquelas regras de
conduta que são imaculadas, que conduzem à libertação, elogiadas pelos sábios,
puras e que conduzem à concentração, e perseverar nisso juntamente com os seus
companheiros, tanto em público como em particular, ... continuar com o
entendimento nobre que conduz à libertação, à completa destruição do
sofrimento, permanecendo com esse insight juntamente com os seus companheiros,
tanto em público como em particular, ... Enquanto os bhikkhus mantiverem essas
seis coisas e forem vistos fazendo isso, é de se esperar que eles prosperem e
não que declinem.”
1.12.
Então, enquanto o Abençoado estava na montanha do Pico do Abutre, ele
freqüentemente aconselhava os bhikkhus desta forma: “Isto é virtude, isto é
concentração, isto é sabedoria. A concentração quando imbuída da virtude, traz
grandes frutos e benefícios. A sabedoria, quando imbuída da concentração, traz
grandes frutos e benefícios. A mente imbuída de sabedoria se liberta
completamente das impurezas, isto é, da impureza do desejo sensual, da impureza de
ser/existir, da impureza do entendimento incorreto e da impureza da ignorância.”
1.13. E
quando o Abençoado tinha permanecido em Rajagaha pelo tempo que desejava, ele
disse para o venerável Ananda: “Venha, Ananda, vamos para Ambalatthika.” - “Muito
bem, venerável senhor,” disse Ananda, e o Abençoado foi para lá com uma grande
comitiva de bhikkhus.
1.14. E o
Abençoado ficou no parque real em Ambalatthika,e lá também ele freqüentemente aconselhava os bhikkhus desta forma:
“Isto é virtude, isto é
concentração, isto é sabedoria. A concentração quando imbuída da virtude, traz
grandes frutos e benefícios. A sabedoria, quando imbuída da concentração, traz
grandes frutos e benefícios. A mente imbuída de sabedoria se liberta
completamente das impurezas, isto é, da impureza do desejo sensual, da impureza de
ser/existir, da impureza do entendimento incorreto e da impureza da ignorância.
1.15. Tendo
permanecido em Ambalatthika pelo tempo que desejava, ele disse para o venerável
Ananda: “Vamos para Nalanda,” e assim eles fizeram. Em
Nalanda o Abençoado ficou no manguezal de Pavarika.
1.16. Então, o venerável Sariputta foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo
sentou a um lado e disse: “Venerável senhor, eu
tenho tamanha confiança no Abençoado que acredito que não existe ou nunca
existirá no presente um outro contemplativo ou brâmane com mais conhecimento do
que o Abençoado com respeito à iluminação.”
“Sublime de
fato é essa sua afirmação bramada, Sariputta, você rugiu o definitivo e
categórico rugido do leão: ‘Venerável senhor, eu tenho tamanha confiança no
Abençoado que acredito que não existe ou nunca existirá no presente um outro
contemplativo ou brâmane com mais conhecimento do que o Abençoado com respeito
à iluminação.’ Você agora, Sariputta, compreendeu com
a sua mente as mentes de todos os Arahants, os Perfeitamente Iluminados, que
surgiram no passado e assim compreendeu: ‘Esses Abençoados tinham tal virtude
ou tais qualidades, ou tal sabedoria, ou tal permanência, ou tal libertação’?”
“Não,
venerável senhor.”
“Então,
Sariputta, você compreendeu com a sua mente as mentes de todos os Arahants, os
Perfeitamente Iluminados, que surgirão no futuro e assim compreendeu: ‘Esses
Abençoados terão tal virtude ou tais qualidades, ou tal sabedoria, ou tal
permanência, ou tal libertação’?”
“Não,
venerável senhor.”
“Então,
Sariputta, você compreendeu com a sua mente a minha própria mente – eu sendo no
momento o Arahant, o Perfeitamente Iluminado - e assim compreendeu: ‘O
Abençoado tem tal virtude ou tais qualidades, ou tal sabedoria, ou tal
permanência, ou tal libertação’?”
“Não,
venerável senhor.”
“Sariputta,
se você não tem o conhecimento compreendendo as mentes dos Arahants, os
Perfeitamente Iluminados do passado, do futuro e do presente, porque você faz
essa sublime afirmação bramada e ruge o definitivo e categórico rugido do leão:
‘Venerável senhor, eu tenho tamanha confiança no Abençoado que acredito que não
existe ou nunca existirá no presente um outro contemplativo ou brâmane com mais
conhecimento do que o Abençoado com respeito à iluminação.’?”
1.17. “Eu
não tenho, venerável senhor, o conhecimento compreendendo as mentes dos
Arahants, os Perfeitamente Iluminados do passado, do futuro e do presente, mas
ainda assim compreendi isso através da inferência do Dhamma. Suponha,
venerável senhor, que um rei tivesse uma cidade fronteiriça com sólidas
muralhas, proteções e abóbadas e com um único portão. O guardião ali postado
seria sábio, competente e inteligente; alguém que não permite a entrada de
desconhecidos e admite que entrem os conhecidos. Enquanto ele patrulha seguindo
o caminho que circunda a cidade ele não vê uma fissura ou abertura nas muralhas
grande o suficiente para permitir que mesmo um gato passe. Ele poderia
pensar: ‘Qualquer criatura de bom tamanho que entre ou saia desta cidade, todas
entram e saem através deste portão.’
“Do mesmo
modo, venerável senhor, eu compreendi isso através da inferência do Dhamma:
Todos os Arahants, Perfeitamente Iluminados, que surgiram no passado, todos
esses Abençoados primeiro abandonaram os cinco obstáculos, corrupções da mente
e enfraquecedores da sabedoria; e depois, com as suas mentes bem estabelecidas
nos quatro fundamentos da atenção plena, eles desenvolveram corretamente os
sete fatores da iluminação; e dessa forma eles despertaram para a insuperável
iluminação perfeita. E, venerável senhor, todos os Arahants, Perfeitamente Iluminados,
que irão surgir no futuro, todos esses Abençoados irão primeiro abandonar os
cinco obstáculos, corrupções da mente e enfraquecedores da sabedoria; e depois,
com as suas mentes bem estabelecidas nos quatro fundamentos da atenção plena,
eles irão desenvolver corretamente os sete fatores da iluminação; e dessa forma
despertarão para a insuperável perfeita iluminação. E, venerável senhor, o
Abençoado, que é no presente o Arahant, o Perfeitamente Iluminado, primeiro
abandonou os cinco obstáculos, corrupções da mente e enfraquecedores da
sabedoria; e depois, com a sua mente bem estabelecida nos quatro fundamentos da
atenção plena, desenvolveu
corretamente os sete fatores da iluminação; e dessa forma despertou para a
insuperável perfeita iluminação."
1.18.
Então, enquanto estava em Nalanda, no manguezal de Pavarika, o Abençoado
freqüentemente aconselhava os bhikkhus desta forma: “Isto é virtude, isto é
concentração, isto é sabedoria. A concentração quando imbuída da virtude, traz
grandes frutos e benefícios. A sabedoria, quando imbuída da concentração, traz
grandes frutos e benefícios. A mente imbuída de sabedoria se liberta
completamente das impurezas, isto é, da impureza do desejo sensual, da impureza de
ser/existir, da impureza do entendimento incorreto e da impureza da ignorância.
1.19. Tendo
permanecido em Nalanda pelo tempo que desejava, o Abençoado disse para Ananda:
“Vamos para Pataligama,” e assim eles fizeram.
1.20. Em
Pataligama eles ouviram: “O Abençoado acaba de chegar aqui.” E os discípulos
leigos de Pataligama foram até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentaram-se
a um lado e disseram: “Que o Abençoado concorde em visitar o nosso salão de
assembléias!” E o Abençoado concordou em silêncio.
1.21.
Então, quando eles viram que ele havia concordado, eles se levantaram dos seus
assentos e depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita, foram
até o salão de assembléias. Eles cobriram o salão completamente com coberturas
e prepararam assentos, arranjaram um grande jarro com água e penduraram uma
lamparina de azeite. Então, eles foram até o Abençoado e depois de
cumprimentá-lo, ficaram em pé a um lado e disseram: “Venerável senhor, o salão
de assembléias foi coberto completamente com coberturas e os assentos foram
preparados, um grande jarro com água foi arranjado e uma lamparina de azeite
foi pendurada. Agora é o momento para o Abençoado fazer aquilo que julgar
adequado.”
1.22.
Então, o Abençoado se vestiu e tomando a sua tigela e o manto externo, foi com
a Sangha dos bhikkhus até o salão de assembléias. Ao chegar, ele lavou os pés e
depois entrou no salão e sentou-se próximo à coluna central olhando para o
leste. E os bhikkhus lavaram os pés e depois entraram no salão e sentaram-se na
parede do lado oeste olhando para o leste, com o Abençoado à sua frente. E os
discípulos leigos de Pataligama lavaram os pés e entraram no salão e
sentaram-se na parede do lado leste olhando para o oeste, com o Abençoado à sua
frente.
1.23. Então, o Abençoado se dirigiu aos discípulos leigos de Pataligama:
“O homem imoral, chefes de família, por ter decaído da
virtude, enfrenta cinco perigos. Quais são eles? Em primeiro lugar ele
sofre grande perda de posses devido à sua negligência. Em segundo lugar, ele
obtém má reputação devido à sua imoralidade e má conduta. Em terceiro lugar, em
qualquer assembléia que ele entre, quer seja de Khattiyas, Brâmanes, chefes de
família ou contemplativos, ele se comporta de modo inseguro e tímido. Em quarto
lugar, ele morre confuso. Em quinto lugar, com a dissolução do corpo após a
morte, ela reaparece num estado de privação, num destino infeliz, nos reinos
inferiores, até mesmo no inferno. Esses são os cinco perigos para aquele que é
imoral.
1.24. “Cinco bênçãos, chefes de família, são obtidas pelo homem íntegro
através da prática da virtude. Quais são elas? Em primeiro lugar, devido à sua
diligência ele obtém muitas posses. Em segundo lugar, ele obtém boa reputação
devido à sua moralidade e boa conduta. Em terceiro lugar, em qualquer
assembléia que ele entre, quer seja de Khattiyas, Brâmanes, chefes de família
ou contemplativos, ele se comporta de modo seguro e autoconfiante. Em quarto
lugar, ele não morre confuso. Em quinto lugar, na dissolução do corpo, após a
morte, ele renasce num destino feliz, no paraíso. Essas são as cinco bênçãos
para aquele que é íntegro através da prática da virtude.”
1.25.
Então, o Abençoado instruiu, motivou, estimulou e encorajou os discípulos
leigos de Pataligama com um discurso do Dhamma, durante a maior parte da noite.
Depois ele os dispensou, dizendo: “Chefes de família, a noite quase terminou. Agora
é o momento para vocês fazerem o que julgarem adequado.” -
“Muito bem, venerável senhor,” eles responderam e então se levantaram dos seus
assentos e depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita,
partiram. E o Abençoado passou o restante da noite no salão de assembléias
vazio.
1.26.
Agora, naquela ocasião, Sunidha e Vassakara, os ministros de
1.27. E o
Abençoado, por meio do olho divino, que ultrapassa o humano, viu aqueles
milhares de devas se estabelecendo em Pataligama. E, ao se levantar com o raiar
do dia, ele disse para o venerável Ananda: “Ananda, quem está construindo uma
fortaleza em Pataligama?” - “Venerável senhor, Sunidha e Vassakara, os ministros
de Magadha, estão construindo uma fortaleza contra os Vajjias.”
1.28. “Ananda, é
1.29. Então, Sunidha e Vassakara
foram até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo ficaram em pé a um lado e
disseram: “Que o venerável Gotama juntamente com a Sangha dos bhikkhus concorde em aceitar
amanhã uma refeição oferecida por nós!” E o Abençoado concordou em silêncio.
1.30.
Então, sabendo que o Abençoado havia concordado, Sunidha e Vassakara foram para
casa e fizeram com que fossem preparados vários tipos de boa comida. Quando
tudo estava pronto eles anunciaram a hora para o Abençoado: “É hora, Mestre
Gotama, a refeição está pronta.” Então, o Abençoado se vestiu e,
carregando a sua tigela e o manto externo, foi com a Sangha dos bhikkhus para a
casa de Sunidha e Vassakara e sentou-se
num assento que havia sido preparado. Então, com as próprias mãos Sunidha e
Vassakara serviram e satisfizeram o Abençoado e os bhikkhus com os vários tipos
de boa comida. Em seguida, quando o Abençoado havia terminado de comer e
retirado a mão da sua tigela, Sunidha e Vassakara sentaram a um lado num
assento mais baixo.
1.31.
Estando ali sentados, o Abençoado agradeceu com estes versos:
“Onde quer que permaneça, o homem sábio
deveria alimentar os virtuosos da vida santa.
Tendo dado oferendas para os dignos,
ele comparte os seus méritos com os devas locais.
Assim reverenciados, eles também o honram.
Amáveis tal qual uma mãe
em relação ao seu próprio filho, seu único filho;
aquele que assim desfruta da graça dos devas,
por eles é amado, encontra boa fortuna.”
Depois
disso o Abençoado levantou do seu assento e partiu.
1.32.
Sunidha e Vassakara seguiram o Abençoado de perto, dizendo: “Qualquer portão
pelo qual o contemplativo Gotama saia hoje, esse será chamado de portão Gotama;
e qualquer vau que ele use para cruzar o Ganges, esse será chamado vau Gotama.”
E assim, o portão pelo qual o Abençoado saiu foi chamado portão Gotama.
1.33.
Então, o Abençoado chegou no Rio Ganges. E justamente então, o rio estava tão cheio
que um corvo poderia beber nele. E algumas pessoas estavam procurando um
barco, algumas buscavam uma balsa e
outras estavam amarrando juncos para formar uma balsa para cruzar até o outro
lado. Mas o Abençoado, com a mesma rapidez com que um homem forte estende o seu
braço que está flexionado ou flexiona o seu
braço que está estendido, desapareceu desta margem do
Ganges e reapareceu com o seu grupo de bhikkhus na outra margem.
1.34. E o
Abençoado viu aquelas pessoas procurando um barco, em busca de uma balsa, amarrando juncos para formar uma balsa para cruzar
até o outro lado. E ao ver o que elas queriam fazer, ele recitou este verso:
“Quando querem cruzar o mar, um lago ou lagoa,
as pessoas constroem uma ponte ou balsa – os sábios já cruzaram.”
[Fim da
primeira recitação]
2.1. O
Abençoado disse para Ananda: “Vamos para Kotigama.” - “Muito bem, venerável
senhor,” disse Ananda, e o Abençoado foi para Kotigama com uma grande comitiva
de bhikkhus.
2.2. Então, o Abençoado se dirigiu aos bhikkhus da seguinte forma:
“Bhikkhus, é por não compreender, não penetrar as Quatro Nobres Verdades que
eu, bem como vocês, durante muito tempo perambulamos e transmigramos neste
ciclo de nascimento e morte. Quais são elas? Por não compreender a Nobre
Verdade do Sofrimento é que nós perambulamos e transmigramos, por não
compreender a Nobre Verdade da Origem do Sofrimento é que nós perambulamos e transmigramos, por não
compreender a Nobre Verdade da Cessação do
Sofrimento é que nós perambulamos e transmigramos, por não
compreender a Nobre Verdade do Caminho que conduz à Cessação do Sofrimento é que nós
perambulamos e transmigramos neste ciclo de nascimento e morte. E por
compreender e penetrar essa mesma Nobre Verdade do Sofrimento, da Origem do
Sofrimento, da Cessação do Sofrimento e do Caminho que conduz à Cessação do
Sofrimento, que o desejo por ser/existir foi cortado, o suporte para o
ser/existir foi destruído, não há mais vir a ser a nenhum estado.”
2.3. Tendo
dito isso, o Abençoado, o Mestre disse:
“Por não ver as Quatro Nobres Verdades,
longo e desgastante é o caminho de nascimento a nascimento.
Vendo-as, a causa do nascimento é removida,
o sofrimento desenraizado, o renascimento está terminado.”
2.4. Então,
enquanto o Abençoado estava em Kotigama, ele aconselhava os bhikkhus
freqüentemente desta forma: “Isto é virtude, isto é concentração, isto é
sabedoria. A concentração quando imbuída de virtude, traz grandes frutos e
benefícios. A sabedoria, quando imbuída de concentração, traz grandes frutos e
benefícios. A mente imbuída de sabedoria se liberta completamente das
impurezas, isto é, da impureza do desejo sensual, da impureza de ser/existir, da impureza do
entendimento incorreto e da impureza da ignorância.”
2.5. Quando o Abençoado havia permanecido em Kotigama pelo tempo que
desejava, ele disse para o venerável Ananda: “Venha, Ananda, vamos para
Nadika.” - “Muito bem, venerável senhor,” disse Ananda, e o Abençoado foi para
Nadika, ficando na Casa de Tijolos.
2.6. O
venerável Ananda foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentou a um
lado e disse: “Venerável senhor, o bhikkhu
Salha e a bhikkhuni Nanda morreram em Nadika. Qual é o destino deles, qual é o
seu futuro percurso? O discípulo leigo Sudatta e a discípulo
leiga Sujata, os discípulos leigos Kakudha, Kalinga, Nikata, Katissabha,
Tuttha, Santuttha, Bhadda e Subhadda todos eles morreram em Nadika. Qual é o
destino deles, qual é o seu futuro percurso?”
2.7.
“Ananda, o bhikkhu Salha, com a eliminação das impurezas mentais, permaneceu
num estado livre de impurezas com a libertação da mente e a libertação através da
sabedoria, tendo conhecido e manifestado isso para si mesmo no aqui e agora. A
bhikkhuni Nanda, com a destruição dos cinco primeiros grilhões, reapareceu
espontaneamente [nas Moradas Puras] e lá irá realizar o parinibbana sem nunca mais
retornar daquele mundo. O discípulo leigo Sudatta, com a destruição de três
grilhões e com a atenuação da cobiça, raiva e delusão, se tornou um que retorna
uma vez, retornando uma vez a este mundo para dar um fim ao sofrimento. A
discípula leiga Sujata, com a destruição de três grilhões, se tornou uma que
entrou na correnteza, não mais destinada aos mundos inferiores, com o destino
fixo, ela tem a iluminação como destino. O discípulo leigo Kakudha, com a
destruição dos cinco primeiros grilhões, reapareceu espontaneamente [nas
Moradas Puras] e lá realizará o parinibbana
sem nunca mais retornar daquele mundo. Da mesma forma Kalinga, Nikata,
Katissabha, Tuttha, Santuttha, Bhadda e Subhadda. Ananda, em Nadika mais de
cinqüenta discípulos leigos, com a destruição dos cinco primeiros grilhões,
reapareceram espontaneamente [nas Moradas Puras] e lá realizarão o parinibbana sem
nunca mais retornarem daquele mundo. Mais de noventa, com a destruição de três
grilhões e com a atenuação da cobiça, raiva e delusão, se tornaram aqueles que
retornam uma vez, retornando uma vez a este mundo para dar um fim ao
sofrimento. E muito mais que quinhentos, com a destruição de três grilhões, se
tornaram aqueles que entraram na correnteza, não mais destinados aos mundos
inferiores, com o destino fixo, eles têm a iluminação como destino.
2.8. “Não é surpreendente, Ananda, que um ser humano morra. Mas se cada
vez que alguém morrer você vier me perguntar sobre o seu destino, isso criaria
problemas para o Tathagata. Portanto, Ananda, eu ensinarei para você uma
exposição do Dhamma chamada o Espelho do Dhamma, através do qual um nobre
discípulo, se ele assim desejar, poderá por si próprio declarar de si mesmo:
‘Eu sou um daqueles que deu fim ao inferno, fim ao reino animal, fim ao reino
dos fantasmas, fim aos planos de miséria, fim aos destinos ruins, fim aos
mundos inferiores. Eu entrei na correnteza, não mais destinado aos mundos
inferiores, com o destino fixo, tenho a iluminação como destino.’
2.9. “E
qual, Ananda, é esse Espelho do Dhamma, através do qual um nobre discípulo, se
ele assim desejar, poderá por si próprio declarar isso de si mesmo? Aqui,
Ananda, o nobre discípulo possui convicção comprovada no Buda assim: ‘O Abençoado é um arahant,
perfeitamente iluminado, consumado no verdadeiro conhecimento e conduta,
bem-aventurado, conhecedor dos mundos, um líder insuperável de pessoas
preparadas para serem treinadas, mestre de devas e humanos, desperto,
sublime.’
Ele possui convicção comprovada no Dhamma assim: ‘O Dhamma é bem proclamado pelo
Abençoado, visível no aqui e agora, com efeito imediato, que convida ao exame,
que conduz para adiante, para ser experimentado pelos sábios por eles mesmos.’
Ele possui convicção comprovada na
Sangha assim: ‘A Sangha dos discípulos do Abençoado
pratica o bom caminho, pratica o caminho reto, pratica o caminho verdadeiro,
pratica o caminho adequado, isto é, os quatro pares de pessoas, os oito tipos
de indivíduos; esta Sangha dos discípulos do Abençoado é merecedora de dádivas,
merecedora de hospitalidade, merecedora de oferendas, merecedora de saudações
com reverência, um campo inigualável de mérito para o mundo.’
Ele possui
as virtudes apreciadas pelos nobres – intactas, não-laceradas, imaculadas,
não-matizadas, libertadoras, elogiadas pelos sábios, desapegadas, que conduzem
à concentração.
“Esse, Ananda, é o Espelho do Dhamma, através do qual um nobre discípulo
... por si próprio pode declarar de si mesmo: ‘Eu sou um daqueles que deu fim ao
inferno ... Eu entrei na correnteza, …
tenho a iluminação como destino.’ (igual ao verso 2.8).
2.10.
Então, o Abençoado, enquanto estava em Nadika, com freqüência aconselhava os
bhikkhus desta forma: “Isto é virtude, isto é
concentração, isto é sabedoria. A concentração quando imbuída da virtude, traz
grandes frutos e benefícios. A sabedoria, quando imbuída da concentração, traz
grandes frutos e benefícios. A mente imbuída de sabedoria se liberta
completamente das impurezas, isto é, da impureza do desejo sensual, da impureza de
ser/existir, da impureza do entendimento incorreto e da impureza da ignorância.
2.11.
Quando o Abençoado havia permanecido em Nadika pelo tempo que desejava ... o
Abençoado foi com uma grande comitiva de bhikkhus para Vesali, ficando no
bosque de Ambapali.
2.12. Lá o
Abençoado se dirigiu aos bhikkhus: “Bhikkhus,
um bhikkhu deve ter atenção plena e plena consciência, essa é a minha instrução
para vocês! E como um bhikkhu tem atenção plena? Aqui, bhikkhus, um bhikkhu
permanece contemplando o corpo como um corpo, ardente, plenamente consciente e
com atenção plena, tendo colocado de lado a cobiça e o desprazer pelo mundo.
Ele permanece contemplando as sensações como sensações ... mente como mente ...
objetos mentais como objetos mentais, plenamente consciente
e com atenção plena, tendo colocado de lado a cobiça e o desprazer pelo mundo.
Assim é como um bhikkhu tem atenção plena.
2.13. “
2.14. Agora
a cortesã Ambapali ouviu que o
Abençoado havia chegado em Vesali e que estava no
bosque dela. Ela fez com que se preparassem as melhores carruagens e saiu de
Vesali em direção ao parque. Ela foi até onde a estrada permitia e depois
continuou a pé até onde estava o Abençoado e ambos se cumprimentaram. Quando a
conversa cortês e amigável havia terminado ela sentou a um lado e o
Abençoado a instruiu, motivou, estimulou e encorajou com um discurso do Dhamma.
Estando satisfeita, Ambapali disse: “Que o venerável Gotama concorde em aceitar
amanhã uma refeição junto com a Sangha dos bhikkhus!” O Abençoado concordou em
silêncio, e quando Ambapali viu que ele havia concordado, ela se levantou do
seu assento e depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita,
partiu.
2.15. E os
Licchavis de Vesali ouviram que o Abençoado havia chegado em Vesali e que
estava no parque de Ambapali. Eles fizeram com que se preparassem as melhores
carruagens e saíram de Vesali. E alguns dos jovens Licchavi estavam todos em
azul, com maquiagem azul, roupas azuis
e adereços azuis, enquanto que outros estavam em amarelo, alguns em vermelho,
alguns em branco, com maquiagem branca, roupas brancas e adereços brancos.
2.16. E
Ambapali guiou a sua carruagem contra os Licchavis, eixo contra eixo, roda
contra roda e canga contra canga. E eles lhe disseram: “Ambapali, porque você
guia a sua carruagem assim contra nós?” - “Porque, jovens senhores, o Abençoado
foi convidado junto com a Sangha dos bhikkhus para a refeição de amanhã.”
“Ambapali,
troque essa refeição por cem mil moedas!” - “Jovens senhores, se vocês me dessem
toda a Vesali com toda a sua renda eu não abriria mão de uma refeição tão
importante!”
Então, os
Licchavis estalaram os dedos, dizendo: “Nós fomos derrotados pela mulher da
manga, fomos ludibriados pela mulher da
manga!” E saíram em direção ao bosque de Ambapali.
2.17. E o
Abençoado ao ver os Licchavis vindo à distância, disse: “Bhikkhus, qualquer um de
vocês que não tenha visto os devas do Trinta e Três, olhem para esse grupo de
Licchavis! Olhem bem e vocês terão uma idéia dos devas do Trinta e Três!”
2.18.
Então, os Licchavis foram com as suas carruagens até onde a estrada permitia e
depois continuaram a pé até onde estava o Abençoado e eles se cumprimentaram.
Quando a conversa cortês e amigável havia terminado eles sentaram a um lado
e o Abençoado os instruiu, motivou, estimulou e encorajou com um discurso do
Dhamma. Estando satisfeitos, eles disseram: “Que o venerável Gotama concorde em aceitar amanhã uma refeição junto com a Sangha dos bhikkhus!” “Mas, Licchavis, eu já aceitei a refeição de
amanhã da cortesã Ambapali. E os Licchavis estalaram os dedos, dizendo: “Nós
fomos derrotados pela mulher da manga, fomos ludibriados pela mulher da manga!”
Depois de ficarem satisfeitos e contentes com as palavras do Abençoado, eles se
levantaram dos seus assentos e depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à
sua direita, partiram.
2.19. E
quando a noite havia quase terminado, Ambapali fez com que se preparassem
vários tipos de boa comida e anunciou para o Abençoado que a refeição estava
pronta. Então, o Abençoado vestiu os seus mantos e carregando a sua tigela e o
manto externo, foi com a Sangha dos bhikkhus para a casa de Ambapali e
sentou num assento que havia sido preparado. Então, com as próprias mãos
Ambapali serviu e satisfez o Abençoado e os bhikkhus com os vários tipos de boa
comida. Em seguida, quando o Abençoado havia terminado de comer e retirado a
mão da sua tigela, Ambapali sentou-se a um lado, num assento mais baixo e
disse: “Venerável senhor eu dou este parque para a Sangha dos bhikkhus tendo o
Abençoado como o seu cabeça.” O Abençoado aceitou o parque e depois ele a
instruiu, motivou, estimulou e encorajou com um discurso do Dhamma, depois do
que ele levantou do seu assento e partiu.
2.20.
Então, enquanto o Abençoado estava em Kotigama, aconselhava os bhikkhus
freqüentemente desta forma: “Isto é virtude, isto é
concentração, isto é sabedoria. A concentração quando imbuída da virtude, traz
grandes frutos e benefícios. A sabedoria, quando imbuída da concentração, traz
grandes frutos e benefícios. A mente imbuída de sabedoria se liberta
completamente das impurezas, isto é, da impureza do desejo sensual, da impureza de
ser/existir, da impureza do entendimento incorreto e da impureza da ignorância.
2.21.
Quando o Abençoado havia permanecido no bosque de Ambapali pelo tempo que
desejava … ele foi com uma grande comitiva de bhikkhus para o pequeno vilarejo
de Beluvagamaka.
2.22. Lá ele se dirigiu aos monges
desta forma:“Venham,
bhikkhus, entrem no retiro das chuvas onde quer que vocês tenham amigos,
conhecidos e familiares nas proximidades de Vesali. Eu mesmo entrarei no retiro
das chuvas aqui em Beluvagamaka.” - “Sim, venerável senhor,” aqueles bhikkhus
responderam e eles entraram no retiro das chuvas onde tinham amigos, conhecidos
e familiares nas proximidades de Vesali, enquanto que o Abençoado entrou no
retiro das chuvas ali mesmo em Beluvagamaka.
2.23.
Então, quando o Abençoado havia entrado no retiro das chuvas, ele foi acometido
por uma grave enfermidade e dores terríveis próximas da morte o assaltaram. Mas
o Abençoado suportou aquilo, com atenção plena e plena consciência, sem ficar
aflito. Então este pensamento ocorreu ao Abençoado: “Não é apropriado que eu
realize o parinibbana sem ter falado com
os meus assistentes e sem ter me despedido da Sangha dos Bhikkhus. Que eu então
suprima esta enfermidade através da energia e siga vivendo depois de decidir
pela formação vital. Então, o Abençoado suprimiu aquela enfermidade através da
energia e seguiu vivendo, tendo decidido pela formação vital.
2.24. O
Abençoado então se recuperou daquela enfermidade. Pouco tempo depois dele haver
se recuperado, ele saiu da sua moradia e sentou num assento que havia sido
preparado à sombra atrás da habitação. Então, o venerável Ananda foi até o
Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentou a um lado e disse: “É esplêndido,
venerável senhor que o Abençoado esteja resistindo bem, é esplêndido que ele
tenha se recuperado! Mas, venerável senhor, quando o Abençoado estava enfermo
foi como se o meu corpo estivesse sedado, eu me senti perdido, as coisas não
estavam claras para mim. Todavia, eu tinha este tanto de consolo: que o
Abençoado não iria realizar o parinibbana
sem ter feito algum pronunciamento relacionado à Sangha dos Bhikkhus.”
2.25. “O
que mais, Ananda, espera de mim a Sangha dos Bhikkhus? Eu ensinei o Dhamma sem
fazer qualquer distinção entre ensinamentos esotéricos e exotéricos, não há
nada, Ananda, concernente aos ensinamentos que o Tathagata tenha retido até o
final com o punho cerrado de um mestre que não transmite todos os ensinamentos.
Se, Ananda, alguém pensar, ‘Eu assumirei o controle da Sangha dos
Bhikkhus,’ ou ‘A Sangha dos bhikkhus está sob o meu comando,’ é ele que deveria
fazer um pronunciamento desses para a Sangha dos Bhikkhus. Mas, o Tathagata não
pensa assim, ‘Eu assumirei o controle da Sangha dos Bhikkhus,’ ou ‘A
Sangha dos bhikkhus está sob o meu comando,’ então porque deveria o Tathagata
fazer algum pronunciamento desses para a Sangha dos Bhikkhus?
“Eu agora
estou velho, Ananda, envelhecido, pressionado pelos anos, com a idade avançada,
chegando ao último estágio da vida. Este é o meu octogésimo ano. Assim como uma
carroça velha é mantida por meio de ataduras, da mesma forma o corpo do
Tathagata é mantido por meio de uma combinação de ataduras. Sempre que, Ananda,
através da não atenção a todos os sinais e pela cessação de certas sensações, o
Tathagata entra e permanece na concentração sem sinais da mente, nessa ocasião,
Ananda, o corpo do Tathagata fica mais confortável.
2.26. “Portanto, Ananda, sejam ilhas para vocês mesmos, refúgios para
vocês mesmos, não buscando nenhum
refúgio externo; com o Dhamma como a sua ilha, o Dhamma como refúgio, buscando
nenhum outro refúgio. E como, Ananda, um bhikkhu é uma ilha para ele mesmo, um
refúgio para ele mesmo, buscando nenhum refúgio externo; com o Dhamma como a
sua ilha, o Dhamma como o seu refúgio, buscando nenhum outro refúgio? Neste caso,
Ananda, um bhikkhu permanece contemplando o corpo como um corpo, ardente,
plenamente consciente e com atenção plena, tendo colocado de lado a cobiça e o
desprazer pelo mundo. Ele permanece contemplando as sensações como sensações
... mente como mente ... objetos mentais como objetos mentais, ardente,
plenamente consciente e com atenção plena, tendo colocado de lado a cobiça e o
desprazer pelo mundo. Esses bhikkhus, Ananda, que agora ou depois que eu
me for, permanecerem como uma ilha para eles mesmos, como um refúgio para eles
mesmos, sem nada mais como refúgio, com o Dhamma como uma ilha, o Dhamma como
refúgio, sem nada mais como refúgio, eles serão para mim os bhikkhus mais
eminentes dentre aqueles que têm interesse em aprender.”
[Fim da
segunda recitação] - Segunda Parte do Podcast
3.1 Então,
ao amanhecer, o Abençoado se vestiu e
tomando a tigela e o manto externo, foi para Vesali para esmolar alimentos.
Depois de haver esmolado em Vesali e retornado, após a refeição ele se dirigiu
ao venerável Ananda da seguinte forma: “Leve com você o seu pano para sentar,
Ananda; vamos até o Santuário de Capala para passar o dia.” - “Sim, venerável
senhor,” o venerável Ananda respondeu, e tomando o seu pano para sentar seguiu
de perto atrás do Abençoado.
3.2. O Abençoado foi até o Santuário de Capala e sentou num assento
que havia sido preparado. O venerável Ananda depois de homenagear o Abençoado
sentou a um lado. O Abençoado então disse para o venerável Ananda: “Encantadora
é Vesali, Ananda. Encantador é o santuário Udena, encantador é o santuário
Gotamaka, encantador é o santuário Sattamba, encantador é o santuário
Bahuputta, encantador é o santuário Sarandada, encantador é o santuário Capala.
3.3.
“Qualquer um, Ananda, que tenha desenvolvido e cultivado as quatro bases do
poder espiritual, que tenha feito delas o seu veículo, a sua base, que as tenha
estabilizado, que nelas tenha se exercitado e que as tenha aperfeiçoado,
poderia, se ele assim desejasse, seguir vivendo
durante aquele éon ou o tempo que restasse de um éon. O Tathagata, Ananda, desenvolveu e cultivou as quatro bases do
poder espiritual, fez delas o seu veículo, a sua base, estabilizou-as, se
exercitou nelas e aperfeiçoou-as. Se ele assim desejasse, o Tathagata poderia
seguir vivendo durante este éon ou o tempo que resta do éon.”
3.4. Mas,
embora um sinal tão óbvio tenha sido dado ao venerável Ananda pelo Abençoado,
embora uma insinuação tão óbvia lhe tenha sido feita, ele foi incapaz de
compreendê-la. Ele não implorou ao Abençoado: “Venerável senhor, que o
Abençoado siga vivendo durante este éon! Que o Iluminado siga vivendo durante
este éon, para o bem-estar de muitos, para a felicidade de muitos, por
compaixão pelo mundo, pelo bem, bem-estar e felicidade de devas e humanos.” Até
esse ponto a mente dele estava obcecada por Mara.
3.5. Uma
segunda vez... Uma terceira vez... (Igual aos versos 3.3 e 3.4).
3.6. Então,
o Abençoado se dirigiu ao venerável Ananda: “Você pode ir, Ananda, quando lhe
for conveniente.”
“Sim, venerável
senhor,” o Venerável Ananda respondeu e levantando-se do seu assento,
homenageou o Abençoado e mantendo-o à sua direita, sentou ao pé de uma árvore
ao lado.
3.7. Então,
pouco tempo depois que o venerável Ananda havia partido, Mara, o Senhor do Mal,
foi até o Abençoado e disse: “Venerável senhor, que o Abençoado agora realize o
parinibbana! Que o Iluminado agora realize o parinibbana! Agora é o momento
para o parinibbana do Abençoado! Esta afirmação, venerável senhor, foi feita
pelo Abençoado: ‘Eu não realizarei o parinibbana, Senhor do Mal, até que eu
tenha discípulos bhikkhus que sejam sábios, disciplinados, confiantes,
libertados do cativeiro, estudados, defensores do Dhamma, praticando de acordo
com o Dhamma, praticando do modo correto, comportando-se de modo apropriado;
que tenham aprendido a doutrina do mestre e sejam capazes de explicá-la,
ensiná-la, proclamá-la, estabelecê-la, revelá-la, analisá-la e elucidá-la; que
sejam capazes de refutar completamente com argumentos as doutrinas dos outros e
que sejam capazes de ensinar o Dhamma que é eficaz.’
3.8. “Mas
no momento, venerável senhor, o Abençoado tem discípulos bhikkhus que são
sábios... que são capazes de ensinar o Dhamma que é eficaz. Venerável senhor,
que o Abençoado agora realize o parinibbana! Que o Iluminado agora realize o
parinibbana! Agora é o momento para o parinibbana do Abençoado! E esta
afirmação, venerável senhor, foi feita pelo Abençoado: ‘Eu não realizarei o
parinibbana, Senhor do Mal, até que eu tenha discípulos bhikkhuni ... até que eu tenha discípulos leigos ...
até que eu tenha discípulas leigas que sejam sábias... e que sejam
capazes de ensinar o Dhamma que é eficaz.’ Mas no momento, venerável senhor, o
Abençoado tem discípulas leigas que são sábias, disciplinadas,
confiantes, libertadas do cativeiro, estudadas, defensoras do Dhamma,
praticando de acordo com o Dhamma, praticando do modo correto, comportando-se
de modo apropriado; que aprenderam a doutrina do mestre e que são capazes de
explicá-la, ensiná-la, proclamá-la, estabelecê-la, revelá-la, analisá-la e
elucidá-la; que são capazes de refutar completamente com argumentos as
doutrinas dos outros e que são capazes de ensinar o Dhamma que é eficaz.
Venerável senhor, que o Abençoado agora realize o parinibbana! Que o Iluminado
agora realize o parinibbana! Agora é o momento para o parinibbana do Abençoado!
E esta afirmação, venerável senhor, foi feita pelo Abençoado: ‘Eu não
realizarei o parinibbana, Senhor do Mal, até que esta minha vida santa tenha se
tornado bem sucedida e próspera, extensa, popular, expandida, bem proclamada
entre os devas e humanos.’ A vida santa do Abençoado, venerável senhor, se
tornou bem sucedida e próspera, extensa, popular, expandida, bem proclamada
entre os devas e humanos. Venerável senhor, que o Abençoado agora realize o
parinibbana! Que o Iluminado agora realize o parinibbana! Agora é o momento
para o parinibbana do Abençoado!”
3.9. Quando
isso foi dito, o Abençoado disse para Mara o Senhor do Mal: “Fique tranqüilo,
Senhor do Mal. Não tardará muito até que ocorra o parinibbana do Tathagata.
Daqui a três meses o Tathagata realizará o parinibbana.”
3.10.
Então, o Abençoado, no santuário de Capala, com atenção plena e plena
consciência renunciou à sua formação vital. E quando o Abençoado renunciou à
sua formação vital, ocorreu um grande terremoto, assustador e aterrorizador e o
estrondo de trovões sacudiram o céu. Então, tendo compreendido o significado
daquilo, o Abençoado naquela ocasião recitou estes versos inspirados:
“Comparando o incomparável com a existência continuada,
o sábio renunciou à formação de ser/existir.
Regozijando-se no íntimo, concentrado, ele rompeu
a continuada existência tal qual uma armadura.”
3.11. E o
venerável Ananda pensou: “É maravilhoso, é admirável que surja esse grande
terremoto, assustador e aterrorizador com estrondo de trovões que sacodem o
céu! O que será que causou isso?”
3.12. Ele
foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo, ele sentou a um lado e
perguntou sobre aquilo.
3.13.
“Ananda, há oito razões, oito causas para o surgimento de um grande terremoto.
Esta grande terra está estabelecida na água, a água no vento, o vento no
espaço. E quando um vento forte sopra, este agita a água e devido à agitação da
água a terra treme. Essa é a primeira razão.
3.14. “Em
segundo lugar há algum contemplativo ou Brâmane que desenvolveu poderes
supra-humanos ou um deva forte e poderoso cuja consciência terra está pouco
desenvolvida e a sua consciência água é imensurável, e ele faz com que a terra
se sacuda e se agite, e trema violentamente. Essa é a segunda razão.
3.15.
“Outra vez, quando um Bodisatva plenamente atento e plenamente consciente,
falece no paraíso de Tusita e descende no ventre da sua mãe, então a terra se
sacode e se agita, e treme violentamente. Essa é a terceira razão.
3.16.
“Outra vez, quando um Bodisatva plenamente atento e plenamente consciente,
emerge do ventre da sua mãe, então a terra se sacode e se agita, e treme
violentamente. Essa é a quarta razão.
3.17.
“Outra vez, quando o Tathagata realiza a perfeita iluminação, então a terra se
sacode e se agita, e treme violentamente. Essa é a quinta razão.
3.18. “Outra
vez, quando o Tathagata coloca em movimento a Roda do Dhamma, então a terra se
sacode e se agita, e treme violentamente. Essa é a sexta razão.
3.19.
“Outra vez, quando o Tathagata, plenamente atento e plenamente consciente,
renuncia à sua formação vital, então a terra se sacode e se agita, e treme
violentamente. Essa é a sétima razão.
3.20.
“Outra vez, quando o Tathagata realiza o parinibbana, então a terra se sacode e
se agita, e treme violentamente. Essa é a oitava razão. Essas, Ananda, são as
oito razões, as oito causas para o surgimento de um grande terremoto.
3.21. “Ananda, há esses oito tipos de assembléias. Quais são elas? A
assembléia de Khattiyas, a assembléia de Brâmanes, de chefes de família, de
contemplativos, dos devas dos Quatro Grandes Reis, dos devas do
Trinta e Três, dos maras, dos Brahmas.
3.22. “Eu
me lembro bem, Ananda, das muitas centenas de assembléias de Khattiyas das
quais eu participei; e antes que eu me sentasse com eles, conversasse com eles
ou participasse da conversa deles, eu adotava a aparência e linguagem deles,
qualquer que fosse. E eu os instruia, motivava, estimulava e encorajava com um
discurso do Dhamma. E enquanto eu falava, eles não sabiam quem eu era e se
perguntavam: ”Quem é esse que fala dessa forma – um deva ou humano?” E tendo-os
instruído dessa forma, eu desaparecia e ainda assim eles não sabiam: “Quem que
acabou de desaparecer – um deva ou humano?”
3.23. “Eu
me lembro bem de muitas centenas de assembléias de Brâmanes, ... de chefes de família,…
de contemplativos, ... de devas dos Quatro Grandes Reis, ... dos devas do
Trinta e Três, ... dos maras, ... dos Brahmas e ainda assim eles não sabiam:
“Quem que acabou de desaparecer – um deva ou humano?” Essas, Ananda, são as
oito assembléias.
3.24. “Ananda, há oito bases para a transcendência. Quais são as
oito?
3.25. “Percebendo a forma no interior, ele vê a
forma no exterior, limitada, bonita e feia; ao transcendê-la, ele percebe
assim: ‘Eu sei, eu vejo.’ Essa é a primeira base para a transcendência.
3.26.
“Percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior, imensurável,
bonita e feia; ao transcendê-la, ele percebe assim: ‘Eu sei, eu vejo.’ Essa é a
segunda base para a transcendência.
3.27. “Não
percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior, limitada, bonita e
feia; ao transcendê-la, ele percebe assim: ‘Eu sei, eu vejo.’ Essa é a terceira
base para a transcendência
3.28. “Não
percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior, imensurável, bonita
e feia; ao transcendê-la, ele percebe assim: ‘Eu sei, eu vejo.’ Essa é a quarta
base para a transcendência.
3.29. “Não
percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior, azul, de cor azul,
azul na aparência, com luminosidade azul. Como uma flor de linho que é azul, de
cor azul, azul na aparência, com luminosidade azul ou como o tecido de Benares
liso dos dois lados que é azul, de cor azul, azul na aparência, com
luminosidade azul; assim também, não percebendo a forma no interior, ele vê a
forma no exterior... com luminosidade azul; ao transcendê-la, ele percebe
assim: ‘Eu sei, eu vejo.’ Essa é a quinta base para a transcendência.
3.30. “Não
percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior, amarela, de cor
amarela, amarela na aparência, com luminosidade amarela. Como uma flor amarela,
de cor amarela, amarela na aparência, com luminosidade amarela ou como o tecido
de Benares liso dos dois lados, que é amarelo, de cor amarela, amarelo na
aparência, com luminosidade amarela; assim também, não percebendo a forma no
interior, ele vê a forma no exterior... com luminosidade amarela; ao
transcendê-la, ele percebe assim: ‘Eu sei, eu vejo.’ Essa é a sexta base para a
transcendência..
3.31. “Não
percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior, vermelha, de cor
vermelha, vermelha na aparência, com luminosidade vermelha. Como uma flor de
hibisco, que é vermelha, de cor vermelha, vermelha na aparência, com
luminosidade vermelha ou como o tecido de Benares liso dos dois lados, que é
vermelho, de cor vermelha, vermelho na aparência, com luminosidade vermelha;
assim também, não percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior...
com luminosidade vermelha; ao transcendê-la, ele percebe assim: ‘Eu sei, eu
vejo.’ Essa é a sétima base para a transcendência.
3.32. “Não
percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior, branca, de cor
branca, branca na aparência, com luminosidade branca. Como a estrela da manhã,
que é branca, de cor branca, branca na aparência, com luminosidade branca ou
como o tecido de Benares liso dos dois lados, que é branco, de cor branca,
branco na aparência, com luminosidade branca; assim também, não percebendo a
forma no interior, ele vê a forma no exterior...com luminosidade branca; ao
transcendê-la, ele percebe assim: ‘Eu sei, eu vejo.’ Essa é a oitava base para
a transcendência. Essas, Ananda, são as oito bases para a transcendência.
3.33. “Ananda, há essas oito
libertações. Quais são as oito? Possuindo
forma material, ele vê a forma: essa é a primeira libertação. Não percebendo a
forma no interior, ele vê a forma no exterior: essa é a segunda libertação. Ele
está decidido apenas pelo belo: essa é a terceira libertação. Com a completa
superação das percepções da forma, com o desaparecimento das percepções do
contato sensorial, sem dar atenção às percepções da diversidade, consciente que
o ‘espaço é infinito,’ ele entra e permanece na base
do espaço infinito: essa é a quarta libertação. Com a completa superação da
base do espaço infinito, consciente de que a ‘consciência é infinita,' ele
entra e permanece na base da consciência infinita: essa é a quinta libertação.
Com a completa superação da base da consciência infinita, consciente de que
‘não há nada,’ ele entra e permanece na base do nada: essa é a sexta
libertação. Com a completa superação da base do nada, ele entra e permanece na
base da nem percepção, nem não percepção: essa é a sétima libertação. Com a
completa superação da base da nem percepção, nem não percepção, ele entra e
permanece na cessação da sensação e percepção: essa é a oitava libertação.”
3.34. “Ananda, certa ocasião, eu estava em Uruvela às margens do rio
Neranjara ao pé da figueira-dos-pagodes, pouco tempo depois de ter realizado a
perfeita iluminação. Então Mara, o Senhor do Mal, veio até a mim, ficou em pé a
um lado e disse: ‘Venerável senhor, que o Abençoado agora realize o
parinibbana! Que o Iluminado agora realize o parinibbana! Agora é o momento
para o parinibbana do Abençoado!’
3.35. “Em
vista disso, eu disse para Mara: ‘Eu não realizarei o parinibbana, Senhor do Mal, até que eu
tenha discípulos bhikkhus que sejam sábios, disciplinados, confiantes,
libertados do cativeiro, estudados, defensores do Dhamma, praticando de acordo
com o Dhamma, praticando do modo correto, comportando-se de modo apropriado;
que tenham aprendido a doutrina do mestre e sejam capazes de explicá-la,
ensiná-la, proclamá-la, estabelecê-la, revelá-la, analisá-la e elucidá-la; que
sejam capazes de refutar completamente com argumentos as doutrinas dos outros e
que sejam capazes de ensinar o Dhamma que é eficaz. Eu não realizarei o parinibbana, Senhor do Mal, até que esta minha vida
santa tenha se tornado bem sucedida e próspera, extensa, popular, expandida, bem
proclamada entre os devas e humanos.’
3.36. “E
justamente agora, hoje, Ananda, no santuário de Capala, Mara veio até a mim,
ficou em pé a um lado e disse: ‘Venerável senhor, que o Abençoado agora realize
o parinibbana! ... Agora é o momento para o parinibbana do Abençoado!’
3.37. “E eu
disse: ‘Fique tranqüilo, Senhor do Mal. Não tardará muito até que ocorra o
parinibbana do Tathagata. Daqui a três meses o Tathagata realizará o
parinibbana.’ Portanto agora, hoje, Ananda, no santuário de Capala, o Tathagata
com atenção plena e plena consciência renunciou à sua formação vital.”
3.38. Em
vista disso, o venerável Ananda disse: “Venerável senhor, que o Abençoado possa
ficar por um éon, que o Iluminado possa ficar por um éon, para o bem-estar e
felicidade de muitos, com compaixão pelo mundo, pelo bem, pelo bem-estar e
felicidade de devas e humanos!” - “Basta, Ananda! Não implore ao Tathagata,
porque o tempo para tais súplicas já passou!”
3.39. Uma
segunda e uma terceira vez o venerável Ananda fez o mesmo pedido. “Ananda, você
tem fé na iluminação do Tathagata?” - “Sim, venerável senhor.” - “Então porque você
incomoda o Tathagata com esse pedido três vezes?”
3.40. “Mas
venerável senhor, eu ouvi isso da própria boca do Abençoado, eu compreendi isso
da própria boca do Abençoado: ‘Qualquer um que tenha desenvolvido e cultivado
as quatro bases do poder espiritual ... poderia, se ele assim desejasse, seguir
vivendo durante aquele éon ou o tempo que restasse de um éon.’”
“Você tem
fé, Ananda?” - “Sim, venerável senhor.”
“Então,
Ananda, o erro foi seu, você falhou, pois tendo sido dada uma sugestão tão
clara, um sinal tão evidente pelo Tathagata, você não compreendeu e não
implorou ao Tathagata para que permanecesse por um éon ... Se, Ananda, você
tivesse implorado, o Tathagata teria recusado duas vezes, mas na terceira ele
teria consentido. Portanto, Ananda, o erro foi seu, você falhou.
3.41.
“Certa vez, Ananda, eu estava em Rajagaha, na Montanha do Pico do Abutre e lá
eu disse: ‘Ananda, encantadora é Rajagaha. Encantador é o Pico do Abutre.
Qualquer um que tenha desenvolvido e cultivado as quatro bases do poder
espiritual ... poderia, se ele assim desejasse, seguir vivendo durante aquele
éon ...’ Mas você, Ananda, apesar de ter sido dada uma
sugestão tão clara, não compreendeu e não implorou ao Tathagata para que
permanecesse por um éon ...
3.42.
“Certa vez eu estava em Rajagaha no Parque das Figueiras …, no Penhasco dos
Ladrões .., na Caverna Satapanni na encosta do Monte Vebhara …, na Pedra negra
na encosta do Monte Isigili ..., na encosta ao lado da Lagoa das Cobras no
Bosque Frio ..., no Parque Tapoda ..., no Santuário dos Esquilos em Veluvana
..., no manguezal de Jivaka ... e também em Rajagaha no Parque do Gamo
Maddakucchi.
3.43. “Em
todos esses lugares eu lhe disse: “Ananda, encantador é este lugar...”
3.44.
“’Qualquer um que tenha desenvolvido e cultivado as quatro bases do poder
espiritual... poderia, se ele assim desejasse, seguir vivendo durante aquele
éon ...”
3.45.
“Certa vez eu estava em Vesali no Santuário Udena ...
3.46.
“Certa vez eu estava em Vesali no Santuário Gotamaka …, no Santuário Sattambaka
..., no Santuário Bahuputta ..., no Santuário Sarandada ....
3.47. “E agora,
hoje, no Santuário de Capala eu disse: “Esses lugares são encantadores. Ananda,
qualquer um que tenha desenvolvido e cultivado as quatro bases do poder
espiritual ... poderia, se ele assim desejasse, seguir vivendo durante aquele
éon .... O Tathagata desenvolveu esses poderes … e ele poderia, Ananda, seguir
vivendo durante este éon ou o tempo que resta do éon.”
“Mas você,
Ananda, falhou em compreender essa sugestão tão clara, esse sinal tão evidente
e não implorou ao Tathagata para que permanecesse por um éon. Se, Ananda, você
tivesse implorado, o Tathagata teria recusado duas vezes, mas na terceira ele
teria consentido.
3.48.
“Ananda, eu já não lhe disse antes: Todas aquelas coisas que para nós são
queridas, estimadas e prazerosas estão sujeitas à mudança, separação e
alteração? Então, como poderia ser possível que tudo aquilo que nasce, veio a
ser, condicionado,
que está sujeito à dissolução, não desapareça – isso é impossível. E isso foi
renunciado, abandonado, rejeitado, deixado de lado, abdicado: o Tathagata
renunciou à sua formação vital. O
Tathagata disse de uma vez por todas: ‘O parinibbana do Tathagata não será
postergado. Daqui a três meses o Tathagata realizará o parinibbana.’ Que o
Tathagata possa retroceder nessa declaração para continuar vivendo, isso não é
possível. Agora venha, Ananda, vamos para o Salão com um pico na Cumeeira na
Grande Floresta.” - “Muito bem, venerável senhor.”
3.49. E o
Abençoado foi com o venerável Ananda para o Salão com um pico na Cumeeira na
Grande Floresta. Ao chegar ele disse: “Ananda, vá e reúna no salão de
assembléias os bhikkhus que se encontram na vizinhança de Vesali.” - “Muito bem,
venerável senhor, disse Ananda, e assim ele fez. Ele então voltou até o
Abençoado e depois de cumprimentá-lo ficou em pé a um lado e disse: “Venerável
senhor, a Sangha dos bhikkhus está reunida. Agora é o momento, Abençoado, faça
como julgar adequado.”
3.50. Então, o Abençoado entrou no salão de assembléias e sentou num
assento que havia sido preparado e disse para os bhikkhus: “Bhikkhus, esses
ensinamentos que compreendi através do
conhecimento direto e que tornei do seu conhecimento, vocês devem aprendê-los completamente,
cultivá-los, desenvolvê-los e praticá-los freqüentemente, que a vida santa se
estabeleça e que dure por muito tempo, para o bem-estar e felicidade de muitos,
com compaixão pelo mundo, pelo bem, pelo bem-estar e felicidade de devas e
humanos.”
“E quais,
bhikkhus, são esses ensinamentos? Eles são os quatro fundamentos da atenção
plena, os quatro esforços corretos, as quatro bases do poder, as cinco
faculdades dominantes, os cinco poderes, os sete fatores de iluminação e o Nobre Caminho
Óctuplo. Esses, bhikkhus, são os ensinamentos que compreendi através do
conhecimento direto e que tornei do seu conhecimento, vocês devem aprendê-los
completamente, cultivá-los, desenvolvê-los e praticá-los freqüentemente, que a
vida santa se estabeleça e que dure por muito tempo, para o bem-estar e
felicidade de muitos, com compaixão pelo mundo, pelo bem, pelo bem-estar e
felicidade de devas e humanos.”
3.51.
Então, o Abençoado disse para os bhikkhus: “Dessa forma, bhikkhus, eu os
encorajo: todas as coisas condicionadas estão sujeitas à dissolução.
Esforcem-se pelo objetivo com diligência. O momento do parinibbana do Tathagata
está próximo. Daqui a três meses o Tathagata realizará o parinibbana.”
Tendo dito
isso, o Abençoado, o Mestre disse:
“Com a idade madura. Meu tempo de vida determinado.
Agora deixo vocês, tendo me estabelecido como refúgio.
Bhikkhus, sejam incansáveis, plenamente atentos, disciplinados,
guardem as suas mentes, com os pensamentos bem controlados.
Aquele que, incansável, mantém o Dhamma e a Disciplina,
deixando o nascimento de lado, dará um fim ao sofrimento.”
[Fim da
terceira recitação]
4.1. Então,
ao amanhecer, o Abençoado se vestiu e tomando a tigela e o manto externo, foi
para Vesali para esmolar alimentos. Depois de haver esmolado em Vesali e de
haver retornado, após a refeição, ele olhou para Vesali com o seu olhar de elefante
e disse: “Ananda, esta é a última vez
que o Tathagata olhará para Vesali. Agora iremos para Bhandagama.” - “Muito bem,
venerável senhor”, e o Abençoado saiu com uma grande comitiva de bhikkhus para
Bhandagama.
4.2. Lá, o
Abençoado se dirigiu aos bhikkhus: “Bhikkhus, é por não compreender, não
penetrar quatro coisas que eu, bem como vocês, durante muito tempo perambulamos
e transmigramos neste ciclo de nascimento e morte. Quais quatro? Por não
compreender a nobre virtude, por não compreender a nobre concentração, por não
compreender a nobre sabedoria, por não compreender a nobre libertação, que eu,
bem como vocês, durante muito tempo perambulamos e transmigramos neste ciclo de
nascimento e morte. E é compreendendo e penetrando a nobre virtude, a nobre
concentração, a nobre sabedoria e a nobre libertação que o desejo por
ser/existir foi cortado, a tendência para o devir foi exausta e não há mais
nascimento.”
4.3. Tendo
dito isso, o Abençoado, o Mestre disse:
“Virtude, concentração, sabedoria e completa libertação.
Essas coisas maravilhosas Gotama compreendeu.
O Dhamma que ele discerniu foi ensinado aos seus bhikkhus:
aquele, cuja visão deu um fim ao sofrimento, realizou nibbana.”
4.4. Então,
o Abençoado, enquanto estava em Bhandagama, freqüentemente aconselhava os
bhikkhus desta forma: “Isto é virtude, isto é concentração, isto é sabedoria. A
concentração, quando imbuída da virtude, traz grandes frutos e benefícios. A
sabedoria, quando imbuída de concentração, traz grandes frutos e benefícios. A
mente imbuída de sabedoria se liberta completamente das impurezas, isto é, da
impureza do desejo sensual, da impureza de ser/existir, da impureza do entendimento incorreto e da
da impureza ignorância.”
4.5. Quando
o Abençoado havia permanecido em Bhandagama pelo tempo que desejava, ele disse:
“Ananda, vamos para Hatthigama ..., para Ambagama ..., para Jambugama ...”
proferindo o mesmo discurso em cada um desses lugares. Então, ele disse:
“Ananda, vamos para Bhoganagara.”
4.6. “Muito
bem, venerável senhor”, Ananda disse, e o Abençoado foi com uma grande comitiva
de bhikkhus para Bhoganagara.
4.7. Em
Bhoganagara o Abençoado ficou no Santuário Ananda. Lá ele disse para os
bhikkhus: “Bhikkhus, eu ensinarei para vocês quatro critérios. Ouçam e prestem
muita atenção àquilo que eu vou dizer.” – “Sim, venerável senhor,” os bhikkhus
responderam.
4.8.
“Suponham que um bhikkhu dissesse: ‘Amigos, eu ouvi e recebi isto da boca do
próprio Abençoado: este é o Dhamma, esta é a Disciplina, esse é o ensinamento
do Mestre’, então, bhikkhus, vocês não devem nem aprovar e nem desaprovar as
palavras dele. Então, sem aprovar ou desaprovar, as palavras e expressões dele
devem ser cuidadosamente anotadas e comparadas com os Suttas e revisadas sob a
luz da Disciplina. Se elas, depois dessa comparação e revisão, não estiverem em
conformidade com os Suttas ou a Disciplina, a conclusão tem que ser: ‘Com
certeza essa não é a palavra do Buda, esse bhikkhu entendeu de maneira
incorreta’, e o assunto deve ser rejeitado. Mas se através dessa comparação e
revisão for constatado que elas estão em conformidade com os Suttas ou a
Disciplina, a conclusão deve ser: ‘Com certeza essa é a palavra do Buda, esse
bhikkhu entendeu da maneira correta.’ Esse é o primeiro critério.
4.9.
“Suponham que um bhikkhu dissesse: ‘Em tal lugar há uma comunidade de bhikkhus
seniores e mestres distinguidos. Eu ouvi e recebi isso dessa comunidade’,
então, bhikkhus, vocês não devem nem aprovar e nem desaprovar as palavras dele.
Então, sem aprovar ou desaprovar, as palavras e expressões dele
devem ser cuidadosamente anotadas e comparadas com os Suttas e revisadas sob a
luz da Disciplina. Se elas, depois dessa comparação e revisão, não estiverem em
conformidade com os Suttas ou a Disciplina, a conclusão tem que ser: ‘Com
certeza essa não é a palavra do Buda, esse bhikkhu entendeu de maneira
incorreta’, e o assunto deve ser rejeitado. Mas se através dessa comparação e
revisão for constatado que elas estão em conformidade com os Suttas ou a
Disciplina, a conclusão deve ser: ‘Com certeza essa é a palavra do Buda, esse
bhikkhu entendeu da maneira correta. Esse é o segundo critério.
4.10.
“Suponham que um bhikkhu dissesse: ‘Em tal lugar há muitos bhikkhus seniores
estudados, portadores da tradição, que conhecem o Dhamma, a Disciplina, o
código de regras, então, bhikkhus, vocês não devem nem aprovar e nem desaprovar as palavras dele. Então, sem aprovar ou desaprovar, as palavras e expressões dele
devem ser cuidadosamente anotadas e comparadas com os Suttas e revisadas sob a
luz da Disciplina. Se elas, depois dessa comparação e revisão, não estiverem em
conformidade com os Suttas ou a Disciplina, a conclusão tem que ser: ‘Com
certeza essa não é a palavra do Buda, esse bhikkhu entendeu de maneira
incorreta’, e o assunto deve ser rejeitado. Mas se através dessa comparação e
revisão for constatado que elas estão em conformidade com os Suttas ou a
Disciplina, a conclusão deve ser: ‘Com certeza essa é a palavra do Buda, esse
bhikkhu entendeu da maneira correta. Esse é o terceiro critério.
4.11.
“Suponham que um bhikkhu dissesse: ‘Em tal lugar há um bhikkhu sênior
estudado, que conhece o Dhamma, a Disciplina, o
código de regras, eu ouvi e recebi isso desse bhikkhu sênior, então, bhikkhus, vocês não devem nem aprovar e nem desaprovar as palavras dele. Então, sem aprovar ou desaprovar, as palavras e expressões dele
devem ser cuidadosamente anotadas e comparadas com os Suttas e revisadas sob a
luz da Disciplina. Se elas, depois dessa comparação e revisão, não estiverem em
conformidade com os Suttas ou a Disciplina, a conclusão tem que ser: ‘Com
certeza essa não é a palavra do Buda, esse bhikkhu entendeu de maneira
incorreta’, e o assunto deve ser rejeitado. Mas se através dessa comparação e
revisão for constatado que elas estão em conformidade com os Suttas ou a
Disciplina, a conclusão deve ser: ‘Com certeza essa é a palavra do Buda, esse
bhikkhu entendeu da maneira correta.’ Esse é o
quarto critério.
4.12.
Então, o Abençoado, enquanto estava em Bhoganagara, freqüentemente aconselhava
os bhikkhus desta forma: “Isto é virtude, isto é
concentração, isto é sabedoria. A concentração quando imbuída da virtude, traz
grandes frutos e benefícios. A sabedoria, quando imbuída da concentração, traz
grandes frutos e benefícios. A mente imbuída de sabedoria se liberta
completamente das impurezas, isto é, da impureza do desejo sensual, da impureza de
ser/existir, da impureza do entendimento incorreto e da impureza da ignorância.
4.13.
Quando o Abençoado havia permanecido em Bhoganagara pelo tempo que desejava,
ele disse: “Ananda, vamos para Pava.” - “Muito bem, venerável senhor”, disse
Ananda e o Abençoado foi com uma grande comitiva de bhikkhus para Pava, onde
ele ficou no manguezal do prateiro Cunda.
4.14. E
Cunda ouviu que o Abençoado havia chegado em Pava e que estava no seu
manguezal. Então, ele foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentou a
um lado e o Abençoado instruiu, motivou, estimulou e encorajou o prateiro Cunda
com um discurso do Dhamma.
4.15.
Então, Cunda disse: “Que o Venerável Gotama concorde em aceitar amanhã uma refeição,
junto com a Sangha dos bhikkhus!” E o Abençoado concordou em silêncio.
4.16.
Então, sabendo que o Abençoado havia concordado, Cunda levantou do seu
assento e depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita, partiu.
4.17.
Quando a noite havia quase terminado, Cunda fez com que se preparassem vários tipos
de boa comida, com fartura de ‘delícias de porco’ e anunciou para o Abençoado que a refeição estava pronta. Quando
tudo estava pronto eles anunciaram a hora para o Abençoado: “É hora, Mestre
Gotama, a refeição está pronta.”
4.18.
Então, o Abençoado vestiu os seus mantos e, carregando a sua tigela e o manto
externo, foi com a Sangha dos bhikkhus para a casa de Cunda, sentando num
assento que havia sido preparado ele disse: “Sirva a ‘delícias de porco’ que
foi preparada para mim e sirva o restante da boa comida para os bhikkhus.” -
“Muito bem, venerável senhor,” Cunda disse e assim fez.
4.19.
Então, o Abençoado disse para Cunda: “O que tiver sobrado da ‘delícias de
porco’ você deve enterrá-lo numa cova, porque, Cunda, eu não vejo ninguém neste
mundo com os seus devas, maras e Brahmas, nesta população com os seus
contemplativos e Brâmanes, seus príncipes e
povo, que ao comer isso possa ser capaz de digerí-lo, exceto o
Tathagata. “Muito bem, venerável senhor”, disse Cunda e tendo enterrado o que
havia sobrado da ‘delícias de porco’ numa cova ele foi até o Abençoado e depois
de cumprimentá-lo sentou a um lado. Então, o Abençoado, depois de
instruí-lo, motivá-lo, estimulá-lo e encorajá-lo com um discurso do Dhamma, levantou do seu assento e partiu.
4.20. E
logo depois do Abençoado ter comido a refeição dada pelo prateiro Cunda, uma
doença terrível se abateu sobre ele, com diarréia sangrenta e dores terríveis
como se estivesse a ponto de morrer. Porém, o Abençoado suportou tudo com
atenção plena e plena consciência, sem se queixar. Então, o Abençoado disse:
“Ananda, vamos para Kusinara” E o venerável Ananda respondeu “Sim, venerável senhor.”
Tendo comido a refeição de Cunda (assim ouvi),
ele sofreu com grave enfermidade, dolorosa, mortal;
por ter comido ‘delícias de porco’
severa doença se apoderou do Mestre.
Tendo se purificado, o Abençoado disse:
“Agora irei para Kusinara.” ]
4.21. Então saindo da estrada, o Abençoado foi até o pé de uma árvore e
disse: “Venha, Ananda, dobre um manto em quatro para mim, estou cansado e quero
sentar.” - “Muito bem, venerável senhor,” e Ananda assim fez.
4.22. O
Abençoado sentou no assento que havia sido preparado e disse: “Ananda,
traga-me um pouco de água, tenho sede e quero beber.” Ananda respondeu:
“Venerável senhor, quinhentas carroças passaram por esta estrada. A água foi
perturbada pelas rodas e não está boa, ela está suja e turva. Mas, venerável
senhor, o rio Kakuttha que está próximo tem água limpa, agradável, fresca,
pura, com margens aprazíveis, deliciosas. Lá o Abençoado poderá beber a água e
refrescar os membros.”
4.23. Uma
segunda vez o Abençoado disse: “Ananda,
traga-me um pouco de água ...” e Ananda respondeu da mesma forma.
4.24. Uma
terceira vez o Abençoado disse: “Ananda, traga-me um pouco de água, tenho sede
e quero beber.” - “Muito bem, venerável senhor,” Ananda disse e tomando a tigela foi
até o rio. E aquele rio, cujas águas haviam sido perturbadas pelas rodas, que
não estavam boas, que estavam sujas e turvas, à medida que Ananda se
aproximava, começaram a fluir puras, límpidas e imaculadas.
4.25. E o
venerável Ananda pensou: “Maravilhosos, admiráveis são os grandes poderes do
Tathagata! Essas águas foram perturbadas pelas rodas …, e à medida que me
aproximei começaram a fluir puras, límpidas e imaculadas!” Ele colocou a água
na tigela e a levou para o Abençoado e disse o que ele estava pensando,
acrescentando: “Que o Abençoado beba a água, que o Iluminado beba!” E o
Abençoado bebeu a água.
4.26.
Naquele momento o Malla Pukkusa, um pupilo de Alara Kalama, estava seguindo pela estrada principal de Kusinara para Pava.
Vendo o Abençoado sentado sob a árvore, ele foi até lá e depois de
cumprimentá-lo ele sentou a um lado. Então, ele disse: “É maravilhoso, é
admirável, quão tranqüilos são esses contemplativos!”
4.27.
“Certa vez, venerável senhor, Alara Kalama caminhava pela estrada principal e
saindo dela ele foi sentar ao pé de uma árvore próxima para descansar. E
quinhentas carroças passaram perto dele com muito ruído. Um homem que caminhava
atrás das carroças foi até Alara Kalama e disse: ‘Venerável senhor, você não
viu quinhentas carroças passarem perto daqui?’ - ‘Não, amigo, eu não vi.’ - ‘Mas
você não as ouviu, venerável senhor?’ - ‘Não, amigo, eu não as ouvi.’ - ‘Muito bem,
você estava dormindo, venerável senhor?’ - ‘Não, amigo, eu não estava dormindo.’ -
‘Então, venerável senhor, você estava consciente?’ - ‘Sim, amigo.’ - ‘Portanto,
venerável senhor, estando consciente e desperto você nem viu e nem ouviu as
quinhentas carroças passarem perto de você, muito embora o seu manto esteja
sujo com poeira?’ - ‘Assim foi, amigo.’ E aquele homem pensou: ‘É maravilhoso, é
admirável! Esses contemplativos são tão tranqüilos, tão conscientes e
despertos, o homem nem viu e nem ouviu
quinhentas carroças passarem perto dele!’ E ele seguiu o seu caminho elogiando
os eminentes poderes de Alara Kalama.”
4.28. “Muito bem, Pukkusa, o que você pensa? O que você considera mais
difícil de ser alcançado – estando consciente e desperto, nem ver e nem ouvir
quinhentas carroças passarem por perto ou, estando consciente e desperto, nem
ver e nem ouvir nada quando os devas da chuva despejam uma tormenta com raios e
trovões?”
4.29.
“Venerável senhor, como pode alguém comparar
nem ouvir e nem ver quinhentas carroças com isso – ou mesmo, seiscentas,
setecentas, oitocentas, novecentas ou mil ou milhares de carroças, com isso?
Nem ver e nem ouvir uma furiosa tempestade é mais difícil.”
4.30.
“Certa vez, Pukkusa, quando eu estava em Atuma, num celeiro, os devas da chuva
despejaram uma tormenta com raios e trovões, e dois lavradores, irmãos, e
quatro bois foram mortos. E muitas pessoas saíram de Atuma para onde os dois
irmãos e os quatro bois foram mortos.
4.31. “E,
naquele momento, Pukkusa, eu havia saído do celeiro e estava caminhando para lá
e para cá. Um homem da multidão veio ter comigo e depois de me cumprimentar
ficou parado a um lado. E eu disse:
4.32.
“’Amigo, porque essas pessoas estão todas reunidas aqui?’ ‘Venerável senhor,
houve uma grande tormenta e dois lavradores, irmãos, e quatro bois foram
mortos. Mas você, venerável senhor, onde você
onde estava?’ - ‘Eu estava bem aqui, amigo.’ - ‘Mas o que você viu,
venerável senhor?’ - ‘Eu não vi nada, amigo.’ - ‘Ou o que você ouviu?’ - ‘Eu não ouvi
nada, amigo.’ - ‘Você estava dormindo, venerável senhor?’ - ‘Eu não estava
dormindo, amigo.’ - ‘Então, venerável senhor, você estava consciente?’ - ‘Sim,
estava, amigo.’ - ‘Portanto, venerável senhor, estando consciente e desperto você
nem viu e nem ouviu a tormenta com raios e trovões?’ - ‘Assim foi, amigo.’
4.33. “E
aquele homem, Pukkusa, pensou: ‘É maravilhoso, é admirável! Esse contemplativo
é tão tranqüilo que embora consciente e desperto não viu e nem ouviu a tormenta
com raios e trovões!’ Proclamando os meus eminentes poderes, ele me homenageou
e mantendo-me à sua direita, partiu.’”
4.34. Em
vista disso, Pukkusa, o Malla, disse: “Venerável senhor, eu rejeito os
eminentes poderes de Alara Kalama como se eles tivessem sido soprados por um
vento forte ou arrastados pela correnteza veloz de um rio! Magnífico, venerável
senhor! Magnífico, venerável senhor! O Abençoado esclareceu o Dhamma de várias
formas, como se tivesse colocado em pé o que estava de cabeça para baixo,
revelasse o que estava escondido, mostrasse o caminho para alguém que estivesse
perdido ou segurasse uma lâmpada no escuro para aqueles que possuem visão pudessem
ver as formas. Nós buscamos refúgio no Abençoado, no Dhamma e na Sangha dos
bhikkhus. Que o Abençoado nos aceite como discípulos leigos que nele buscaram
refúgio para o resto da vida.!”
4.35.
Então, Pukkusa disse para um certo homem: “Vá e traga-me dois conjuntos de
mantos dourados, brilhantes e prontos para serem usados.” - “Sim, venerável
senhor,” o homem respondeu e assim fez. E Pukkusa ofereceu os mantos para o
Abençoado, dizendo: “Aqui, venerável senhor, estão dois conjuntos de mantos
dourados. Que o Abençoado os aceite por compaixão!” - “Muito bem, Pukkusa,
vista-me num manto e Ananda no outro.” - “Muito bem, venerável senhor”, Pukkusa
disse e assim fez.
4.36. Então, o Abençoado instruiu, motivou, estimulou e encorajou
Pukkusa com um discurso do Dhamma. Então, Pukkusa levantou do seu assento e
depois de homenagear o Abençoado, mantendo-o à sua direita, partiu.
4.37. Pouco tempo depois que Pukkusa havia partido, Ananda, tendo
arrumado os mantos no corpo do Abençoado, observou que comparado com o tom da
pele do Abençoado o manto parecia desluzido. E ele disse: “É maravilhoso, é
admirável, venerável senhor, quão límpida e brilhante está a complexão do
Abençoado! Parece ainda mais brilhante que os mantos dourados nos quais você
está vestido.” - “Assim é, Ananda. Há duas ocasiões nas quais a complexão do
Tathagata se mostra particularmente límpida e brilhante. Quais são elas? Uma é
na noite em que o Tathagata realiza a perfeita iluminação, a outra é a noite em que ele realiza o parinibbana. Nessas duas
ocasiões a complexão do Tathagata se mostra particularmente límpida e
brilhante.”
4.38. “Esta
noite, Ananda, na última vigília, no bosque de árvores sal dos Mallas perto de
Kusinara, entre duas árvores sal, o Tathagata realizará o parinibbana. E agora,
Ananda, vamos para o rio Kakuttha.” - “Muito bem, venerável senhor.” Ananda disse.
Dois mantos dourados foi a oferenda de Pukkusa:
mais brilhante que o manto era a complexão do Abençoado.
4.39. Então,
o Abençoado foi com uma grande comitiva de bhikkhus para o rio Kakuttha. Ele entrou na água, se
banhou, bebeu e ao sair foi para o manguezal onde disse para o venerável
Cundaka: ‘Venha, Cundaka, dobre uma manto em quatro para mim. Estou cansado e quero
me deitar.” - “Muito bem, venerável senhor,” Cundaka disse e assim fez.
4.40. Então, o Abençoado deitou no seu lado direito, na postura do
leão, com um pé sobre o outro, atento e plenamente consciente, após anotar na
mente o horário para despertar. E o venerável Cundaka sentou em frente ao
Abençoado.
4.41. O Buda foi para o rio Kakuttha
com as águas límpidas, brilhantes e agradáveis,
lá o Mestre mergulhou o corpo cansado.
Tathagata sem igual no mundo.
Cercado pelos bhikkhus dos quais ele era o cabeça.
O Mestre Abençoado, Protetor do Dhamma,
foi para o Manguezal do grande Sábio,
e para o bhikkhu Cundaka ele disse:
“Deitarei num manto dobrado em quatro.”
E assim solicitado pelo grande Experto,
Cundaka arrumou o manto em quatro.
O Mestre deitou os membros cansados para descansar
enquanto Cundaka vigiava à sua frente.
4.42.
Então, o Abençoado disse para o venerável Ananda: “Pode acontecer, Ananda, que
o prateiro Cunda sinta remorso, pensando: ‘É minha culpa, é devido à minha
falha que o Tathagata morreu depois da última refeição oferecida por mim!’ Mas
o remorso de Cunda deve ser dissipado desta forma: ‘Esse é o seu mérito, Cunda,
a sua boa ação, que o Tathagata tenha realizado o parinibbana depois da última
refeição oferecida por você, pois, amigo Cunda, eu ouvi da própria boca do
Abençoado que essas duas oferendas de comida produzem grandes frutos, grandes
benefícios, mais frutuosas e vantajosas do que quaisquer outras. Quais duas?
Aquela refeição depois da qual o Tathagata realiza a perfeita iluminação, a
outra depois da qual ele realiza o parinibbana. Essas duas oferendas são mais
frutuosas e vantajosas do que todas as demais. A sua ação, Cunda, conduz a uma
vida longa, a uma bela aparência, à felicidade, à fama, ao paraíso e à
senhoria.” Dessa forma, Ananda, o remorso de Cunda deve ser dissipado.
4.43.
Então, o Abençoado, tendo resolvido aquela questão, recitou este verso:
“Dando, o mérito se incrementa, com contenção, a raiva é controlada.
Quem é hábil abandona as coisas prejudiciais.
À medida que a cobiça, a raiva e
a delusão diminuem, nibbana é realizado.”
[Fim da
quarta recitação] - Terceira Parte do Podcast
5.1. O Abençoado disse: “Ananda, vamos cruzar o rio Hiraññavati para ir
até o bosque de árvores-sal dos Mallas perto de Kusinara.” - “Muito bem,
venerável senhor,” Ananda disse, e o Abençoado com uma grande comitiva de
bhikkhus cruzou o rio e foi para o bosque de árvores sal. Lá, o Abençoado
disse: “Ananda, prepare para mim um leito entre as árvores-sal gêmeas, com a
cabeça para o norte. Eu estou cansado e quero me deitar.” - “Muito bem, venerável
senhor,” disse Ananda e assim fez. Então, o Abençoado deitou no seu lado
direito, na postura do leão, com um pé sobre o outro, atento e plenamente
consciente, após anotar na mente o horário para despertar.
5.2. E
daquelas árvores sal gêmeas, fora de época, brotaram flores em abundância que
caíram sobre o corpo do Tathagata, dispersando-se e cobrindo o seu corpo,
homenageando-o. Flores divinas da árvore de coral caíram do céu, sândalo divino
caiu do céu, dispersando-se e cobrindo o corpo do Tathagata, homenageando-o.
Música e canções divinas se ouviam do
céu, em homenagem ao Tathagata.
5.3. E o Abençoado disse: “Ananda, essas árvore sal brotaram flores em
abundância fora de época ... Música e
canções divinas se ouvem do céu, em
homenagem ao Tathagata. Nunca antes o Tathagata foi tão honrado,
reverenciado, estimado, cultuado e adorado. E no entanto, Ananda, qualquer
bhikkhu, bhikkhuni, discípulo leigo, discípula leiga, que permanecer praticando o Dhamma de modo
apropriado e com perfeição realizar o caminho do Dhamma, ele ou ela honram o
Tathagata, o reverenciam e estimam e prestam a ele a suprema homenagem.
Portanto, Ananda, ‘Nós permaneceremos praticando o Dhamma de modo apropriado e
com perfeição realizaremos o caminho do Dhamma’ - esse deve ser o seu lema.”
5.4. Naquele momento o venerável Upavana estava em frente ao Abençoado,
abanando-o. Então, o Abençoado disse para ele sair dali: “Saia para o lado,
bhikkhu, não fique na minha frente.” E o venerável Ananda pensou: “Esse venerável Upavana foi durante muito tempo o
acompanhante do Buda, estando sempre próximo, para ser chamado e comandado. E
agora na derradeira hora o Abençoado diz que ele se mova e não fique na sua
frente. Porque ele fez isso?”
5.5. E ele
perguntou ao Abençoado sobre isso. “Ananda, os devas de dez sistemas cósmicos
se reuniram para ver o Tathagata. Num raio de doze yojanas em volta do bosque
de árvores sal dos Mallas, perto de Kusinara, não há espaço que possa ser
ocupado por um fio de cabelo de tão densamente ocupado pelos poderosos devas, e
eles estão reclamando: ‘Nós viemos de tão longe para ver o Tathagata. É muito
raro ver um Tathagata, um Buda perfeitamente iluminado, surgir no mundo e hoje
na última vigília da noite o Tathagata realizará o parinibbana, e esse poderoso
bhikkhu está parado em frente ao Abençoado, impedindo-nos de ver o Tathagata
pela última vez.’”
5.6. “Mas,
venerável senhor, que tipo de devas o Abençoado está vendo?” “Ananda, há os
devas do céu cujas mentes estão atadas à terra, eles estão chorando e
arrancando os cabelos, levantando os braços, jogando-se no chão e
contorcendo-se, clamando: ‘Demasiado cedo o Abençoado está morrendo, demasiado
cedo o Iluminado está morrendo, demasiado cedo o Olho do Mundo está
desaparecendo!’ E há os devas da terra cujas mentes estão atadas à terra, que
se comportam da mesma forma. Mas aqueles devas que se libertaram do desejo,
suportam com paciência, dizendo: “Todas as coisas condicionadas são
impermanentes – qual o benefício disso tudo?’”
5.7. “Venerável senhor, antes os bhikkhus que haviam passado o retiro
das chuvas em diferentes lugares vinham para ver o Tathagata e nós costumávamos
dar-lhes as boas vindas para que bhikkhus bem treinados pudessem vê-lo e
homenageá-lo. Mas com o falecimento do Abençoado, não teremos mais a
oportunidade de fazer isso.”
5.8. “Ananda, há quatro lugares que ao serem vistos despertarão um senso
de urgência e emoção nos devotos.. Quais quatro? ‘Aqui o Tathagata nasceu’,
é o primeiro. ‘Aqui o Tathagata
realizou a perfeita iluminação’, é o
segundo. ‘Aqui o Tathagata colocou em movimento a insuperável roda do Dhamma’,
é o terceiro. ‘Aqui o Tathagata
realizou o parinibbana’, esse é o
quarto. E,
Ananda, os bhikkhus e bhikkhunis fiéis, os discípulos leigos e as discípulas leigas fiéis, visitarão esses
lugares. E qualquer um que morrer com um coração devoto enquanto estiver numa
peregrinação por esses santuários, irá, na dissolução do corpo, após a morte,
renascer num bom destino, no paraíso.”
5.9.
“Venerável senhor, como devemos nos comportar em relação às mulheres?” - “Não
olhem para elas, Ananda.” - “Mas se olharmos, como devemos nos comportar,
venerável senhor?” - “Não falem com elas, Ananda.” - “Mas se elas falarem conosco,
como devemos nos comportar?” - “Pratiquem a atenção plena, Ananda.”
5.10. “Venerável senhor, o que devemos fazer com os restos mortais do
Tathagata?” - “Não se preocupem com os preparativos para o funeral, Ananda. Vocês
devem se esforçar pelo objetivo supremo, dediquem-se ao objetivo supremo e
permaneçam com a suas mentes, incansavelmente, ardorosamente, dedicadas ao
objetivo supremo. Há Khattiyas, Brâmanes e chefes de família sábios que são
devotos do Tathagata: eles cuidarão do funeral.”
5.11. “Mas,
venerável senhor, o que faremos com os restos mortais do Tathagata?” - “Ananda,
eles devem ser tratados do mesmo modo que os restos mortais de um monarca que
gira a roda.” - “E como é isso, venerável senhor?” - “Ananda, os
restos mortais de um monarca que gira a roda são envoltos num pano de linho
novo. Este deve ser envolto com algodão penteado e este num tecido novo.
Tendo feito isso quinhentas vezes, o corpo do rei é colocado num caixão de
ferro, que é coberto com um outro recipiente de ferro. Depois, tendo feito uma
pira funerária com todos os tipos de perfumes, o corpo do rei é cremado e uma
estupa é construída numa encruzilhada. Isso, Ananda, é o que se faz com os
restos mortais de um monarca que gira a roda, e deve ser feito o mesmo com os
restos mortais do Tathagata. Uma estupa deve ser construída numa encruzilhada
para o Tathagata. E qualquer um, que, com o coração devoto, lá depositar coroas
de flores ou perfumes, doces e corantes, irá
colher benefícios e felicidade por muito tempo.
5.12.
“Ananda, há quatro pessoas dignas de uma estupa. Quais quatro? Um Tathagata,
um arahant, perfeitamente iluminado; um Paccekabuddha; um discípulo do Tathagata e
um monarca que gira a roda. E porque cada um desses é digno de uma estupa?
Porque, Ananda, com o pensamento: ‘Esta é uma estupa de um Tathagata, de um
Paccekabuddha, de um discípulo do Tathagata ou de um monarca que gira a roda’, os
corações das pessoas se pacificam e depois, na dissolução do corpo, após a
morte, elas renascem num destino feliz, no paraíso. Essa é a razão e essas são
as quatro pessoas dignas de uma estupa.”
5.13. E o venerável
Ananda foi para a sua habitação e lá ficou lamentando, encostado ao umbral da
porta: “Ai de mim, ainda sou um treinando com muito por fazer! E o Mestre que
tanta compaixão tinha por mim está morrendo!”
Então, o
Abençoado perguntou aos bhikkhus onde estava Ananda e eles lhe disseram. Então,
ele disse para um certo bhikkhu: “Vá, bhikkhu, e diga para Ananda em meu nome:
‘Amigo Ananda, o Mestre o chama.’” - “Sim, venerável senhor,” disse o bhikkhu e
assim fez. “Muito bem, amigo,” Ananda respondeu para aquele bhikkhu e foi até o
Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentou-se a um lado.
5.14. E o
Abençoado disse: “Já basta, Ananda, chega de chorar e lamentar! Eu já não lhe
disse que todas aquelas coisas que para nós são queridas, estimadas e
prazerosas estão sujeitas à mudança, separação e alteração? Então, como pode ser, Ananda – visto que o que quer que tenha nascido, que
veio a ser, que é condicionado, que está
sujeito à dissolução – como pode não falecer? Durante muito tempo, Ananda,
você esteve em companhia do Tathagata, demonstrando amor bondade através de
ações com o corpo, linguagem e mente, benéficas, abençoadas, com toda a
confiança e desinteressadas. Você realizou muito mérito, Ananda. Esforce-se e
em pouco tempo você se verá livre das impurezas.
5.15. Então, o Abençoado se dirigiu aos bhikkhus: “Bhikkhus, todos
aqueles que foram Budas, arahants, perfeitamente iluminados no passado, tiveram
um acompanhante como Ananda, e assim também será com os veneráveis Abençoados
que surjirem no futuro. Bhikkhus, Ananda é sábio. Ele sabe quando é o momento
apropriado para os bhikkhus verem o Tathagata, quando é o momento apropriado
para as bhikkhunis, para os discípulos leigos, para as discípulas leigas, para reis, para ministros reais,
para os líderes de outras seitas e para os pupilos destes.
5.16. “Ananda possui quatro qualidades extraordinárias e maravilhosas.
Quais são elas? Quando um grupo de bhikkhus vem ver Ananda, eles se alegram ao
vê-lo, e quando Ananda faz um discurso do Dhamma eles se alegram com isso, e
quando ele silencia eles ficam desapontados. E da mesma forma com relação às
bhikkunis, aos discípulos leigos e às discípulas leigas. E essas quatro qualidades se aplicam a um
monarca que gira a roda: se ele for visitado por um grupo de Khattiyas, de Brâmanes, de chefes de família
ou de contemplativos, eles se alegram ao vê-lo e ao ouvi-lo e quando ele
silencia eles ficam desapontados. E da mesma forma ocorre com Ananda.”
5.17. Depois disso o venerável Ananda disse: “Venerável senhor, que o Abençoado não morra nesta pequena cidade
miserável feita de paus-a-pique, cercada pela floresta no meio do nada!
Venerável senhor, há outras grandes cidades tais como Campa, Rajagaha,
Savatthi, Saketa, Kosambi ou Benares. Nesses lugares há Khattiyas, Brâmanes e
chefes de família prósperos que são devotos do Tathagata e proverão um funeral
adequado para o Tathagata.” - “Ananda, não diga que aqui é uma pequena cidade
miserável feita de paus-a-pique, cercada pela floresta no meio do nada!”
5.18. Certa
vez, Ananda, houve um rei chamado Mahasudassana que girou a roda, um monarca
justo de acordo com o Dhamma, conquistador dos quatro pontos cardeais,
inconquistável, que havia estabelecido a segurança no seu reino. E esse Rei
Mahasudassana tinha nesta mesma Kusinara, sob o nome Kusavati, a sua capital. E
essa cidade tinha doze yojanas de extensão de leste a oeste e sete yojanas de
extensão de norte a sul. Kusavati era rica, próspera e populosa, repleta de
gente e bem suprida. Como a cidade dos devas Alakamanda é rica, próspera e populosa, repleta de yakkhas
e bem suprida, assim também era a capital real Kusavati. E Kusavati nunca se
via livre de dez tipos de sons durante o dia ou noite: o som de elefantes,
cavalos, carruagens, tambores, caixas, alaúdes, canto, címbalos, gongos e
exclamações ‘coma, beba e divirta-se’ como décimo.
5.19. “E
agora, Ananda, vá até Kusinara e anuncie para os Mallas de Kusinara: “Esta
noite, Vasetthas, na última vigília, o Tathagata realizará o parinibbana.
Venham vê-lo, Vasetthas, venham vê-lo para que vocês não se arrependam depois
dizendo: ‘O Tathagata morreu na nossa comunidade e nós não aproveitamos a
oportunidade para vê-lo pela última vez!’” - “Muito bem, venerável senhor,” disse
Ananda, e tomando o manto externo e a tigela foi com um acompanhante até
Kusinara.
5.20. Exatamente naquela ocasião os
Mallas de Kusinara haviam se reunido para tratar de negócios no seu
salão de assembléias. O Ven. Ananda foi até o salão de assembléias e chegando
anunciou: “Esta noite, Vasetthas, na última vigília, o Tathagata realizará o
parinibbana. Venham vê-lo, Vasetthas, venham vê-lo para que vocês não se
arrependam depois dizendo: ‘O Tathagata morreu na nossa comunidade e nós não
aproveitamos a oportunidade para vê-lo pela última vez!”
5.21. Ao
ouvirem o venerável Ananda, os Mallas, com os seus filhos, filhas e esposas
foram abatidos pela tristeza e angústia, com a mente subjugada pelo pesar, o
que fez com que eles chorassem e arrancassem os cabelos. Então, todos foram
para o bosque de árvores sal onde estava o venerável Ananda.
5.22. E
Ananda pensou: “Se eu permitir que os Mallas de Kusinara saúdem o Abençoado um
por um, a noite terá passado antes que todos o tenham saudado. Melhor fazer com
que eles prestem a sua homenagem família por família, dizendo: ‘Venerável
senhor, o Malla fulano de tal com os seus filhos, esposa, criados e amigos
homenageiam o Abençoado aos seus pés.’” E assim ele os apresentou dessa forma,
permitindo que todos os Mallas de Kusinara prestassem a homenagem ao Abençoado
na primeira vigília.
5.23. E naquela ocasião, um errante chamado Subhadda estava em Kusinara,
e ele ouviu que o contemplativo Gotama iria realizar o parinibbana na última
vigília da noite. Ele pensou: ‘Eu ouvi dos veneráveis errantes, com idade avançada,
mestres dos mestres, que um Tathagata, um Buda perfeitamente iluminado, surge
muito raramente no mundo. E esta noite, na última vigília, o contemplativo
Gotama irá realizar o parinibbana. Agora uma dúvida surgiu na minha mente e eu
tenho certeza que o contemplativo Gotama poderá me dar um ensinamento para
dissipar essa dúvida.’
5.24.
Assim, Subhadda foi até o bosque de árvores sal dos Mallas, onde estava o
venerável Ananda e contou- lhe o que ele havia pensado: “Venerável Ananda,
poderei ver o contemplativo Gotama?” Mas Ananda respondeu: “Já basta, amigo
Subhadda, não perturbe o Tathagata, o Abençoado está cansado.” E Subhadda fez o
mesmo pedido uma segunda e uma terceira vez, mas mesmo assim Ananda recusou.
5.25. Mas o
Abençoado ouviu a conversa entre Ananda e Subhadda, e ele disse para Ananda:
“Já basta, Ananda, não impeça Subhadda, deixe que ele veja o Tathagata. Pois
qualquer coisa que Subhadda me perguntar ele assim fará em busca da iluminação
e não para me aborrecer e aquilo que eu responder ele compreenderá com
presteza.” Então, Ananda disse: “Entre, amigo Subhadda, o Abençoado lhe deu
permissão.”
5.26. Então, Subhadda foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo
sentou a um lado e disse: “Venerável Gotama, esses
contemplativos e brâmanes, líderes de ordens, líderes de grupos, mestres de
grupos, conhecidos e famosos fundadores de seitas religiosas, considerados como
santos por muitos, como Purana Kassapa, Makkhali Gosala, Ajita Kesakambali,
Pakudha Kaccayana, Sanjaya Belatthaputta e o Nigantha Nataputta – todos eles
realizaram a verdade como cada um deles crê ou nenhum deles a realizou, ou
alguns realizaram e outros não?” - “Já basta, Subhadda, não importa se
todos ou nenhum, ou alguns realizaram a verdade. Vou ensinar para você o
Dhamma, Subhadda. Ouça e preste muita atenção àquilo que eu vou dizer.” – “Sim,
venerável senhor,” Subhadda respondeu. O Abençoado disse o seguinte
5.27. “Em qualquer doutrina e disciplina em que o nobre caminho óctuplo não
seja encontrado, nenhum contemplativo da primeira ... segunda ... terceira ...
quarta ordem [que entrou na correnteza,
retorna uma vez, não retorna, ou Arahant] é encontrado. Agora, Subhadda, neste
Dhamma e Disciplina o nobre caminho óctuplo é encontrado, contemplativos da primeira … segunda … terceira …
quarta ordem são encontrados.
O nobre caminho óctuplo é encontrado nesta doutrina e disciplina e exatamente
aqui existem contemplativos da primeira … segunda … terceira … quarta ordem.
Essas outras seitas estão desprovidas de verdadeiros contemplativos; mas se
nesta, os bhikkhus viverem a vida com perfeição, o mundo não ficará vazio
de Arahants.”
Vinte nove anos eu tinha
quando saí em busca do Bem.
Agora mais de cinqüenta anos se passaram
desde o dia em que segui a vida santa
para perambular no domínio do Dhamma
fora do qual não há contemplativos
[da primeira, segunda, terceira e quarta ordem].
Outras seitas estão vazias,
mas se os bhikkhus viverem com perfeição,
no mundo não faltarão Arahants.
5.28. Em
vista disso, o errante Subhadda disse: “Magnífico, Mestre Gotama! Magnífico,
Mestre Gotama! Mestre Gotama esclareceu o Dhamma de várias formas, como se
tivesse colocado em pé o que estava de cabeça para baixo, revelasse o que
estava escondido, mostrasse o caminho para alguém que estivesse perdido ou
segurasse uma lâmpada no escuro para aqueles que possuem visão pudessem ver as
formas. Eu busco refúgio no Abençoado, no Dhamma e na Sangha dos bhikkhus. Eu
receberia a admissão na vida santa sob o Abençoado e a admissão completa.
5.29. “Subhadda, que pertencia
anteriormente a uma outra seita e que quer ser admitido na vida santa e a
admissão completa neste Dhamma e Disciplina, terá um período de noviciado de
quatro meses. Ao final dos quatro meses se os bhikkhus estiverem satisfeitos
com ele, eles lhe darão a admissão na vida santa e também a admissão completa
como bhikkhu. Eu reconheço diferenças entre indivíduos neste assunto.”
“Venerável senhor, se aqueles que pertenceram anteriormente a uma outra seita,
e querem a admissão na vida santa e a admissão completa nesse Dhamma e
Disciplina, vivem como noviços durante quatro meses e ao final dos quatro meses
os bhikkhus que estiverem satisfeitos com ele lhe dão admissão na vida santa e
também a admissão completa como bhikkhu, eu viverei como noviço durante quatro
anos. Ao final dos quatro anos, se os bhikkhus estiverem satisfeitos, que
me dêem a admissão na vida santa e a admissão completa como bhikkhu.” Mas o
Abençoado disse para Ananda: “Que Subhadda receba a admissão completa!” - “Muito
bem, venerável senhor,” Ananda respondeu.
5.30. E
Subhadda disse para o venerável Ananda: “Amigo Ananda, é um grande ganho para
todos vocês e um grande benefício para aqueles que tenham obtido a admissão
completa na presença do Mestre.”
Então,
Subhadda recebeu a admissão na vida santa na presença do Mestre e também a
admissão completa. E a partir do momento da sua ordenação, permanecendo só,
isolado, diligente, ardente e decidido, em pouco tempo, o venerável Subhadda
alcançou e permaneceu no objetivo supremo da vida santa pelo qual membros de um
clã deixam a vida em família pela vida santa, tendo conhecido e realizado por
si mesmo no aqui e agora. Ele soube: “O nascimento foi destruído, a vida santa
foi vivida, o que deveria ser feito foi feito, não há mais vir a ser a nenhum
estado.” E assim o venerável Subhadda tornou-se mais um dos Arahants. Ele foi o
último discípulo pessoal do Abençoado.
6.1. E o Abençoado disse para Ananda: “Ananda, pode ser que você pense:
‘As instruções do Mestre cessaram, agora não temos mais mestre!’ Você não deve
pensar dessa forma, Ananda, pois aquilo que ensinei e expliquei como o Dhamma e
a Disciplina, irá, com o meu falecimento, ser o seu mestre.”
6.2. “E quanto aos bhikkhus que têm o hábito de se dirigirem uns aos
outros como ‘amigo’, esse hábito deve ser abolido depois do meu falecimento.
Os bhikkhus seniores devem se dirigir aos mais júniores pelo seu nome, nome de
clã ou como ‘amigo’, enquanto que os
bhikkhus júniores devem se dirigir aos seniores como ‘Senhor’ ou ‘Venerável’ .
6.3. “Se desejarem, a Sangha poderá abolir as regras
menores depois do meu falecimento.
6.4. “Depois do meu falecimento o bhikkhu
Channa deve receber a punição de Brahma.” “Mas,
venerável senhor, o que é a punição de Brahma?” - “Qualquer coisa que o bhikkhu
Channa quiser ou disser, nenhum bhikkhu deve falar com ele ou admoestá-lo, ou
ensiná-lo.”
6.5. Então,
o Abençoado disse para os bhikkhus: “Pode ser, bhikkhus, que algum bhikkhu
tenha dúvidas ou incertezas com relação ao Buda, o Dhamma, a Sangha ou com relação
ao caminho de prática. Perguntem, bhikkhus! Não sintam remorso mais tarde,
pensando: ‘O Mestre estava conosco e nós perdemos a oportunidade de esclarecer
nossa dúvida!’ Em vista dessas palavras, os bhikkhus ficaram em silêncio. O
Abençoado repetiu as suas palavras uma segunda e uma terceira vez e ainda assim
os bhikkhus ficaram em silêncio. Então, o Abençoado disse: “Talvez, bhikkhus,
vocês não perguntem por respeito ao mestre. Então, bhikkhus, que cada um diga
ao seu amigo.” Mas ainda assim eles ficaram em silêncio.
6.6. E o
venerável Ananda disse: “É maravilhoso é admirável venerável senhor! Eu posso
ver que nesta assembléia não há nenhum bhikkhu que tenha dúvidas ou
incertezas ...” - “Você, Ananda, fala com base na fé. Mas o Tathagata sabe que
nesta assembléia não há nenhum bhikkhu que tenha dúvidas ou incertezas com
relação ao Buda, o Dhamma, a Sangha, ou com relação ao caminho de prática.
Ananda, entre esse quinhentos discípulos não há nenhum que pelo menos não tenha
entrado na correnteza, não mais destinado aos mundos inferiores, com o destino
fixo, tendo a iluminação como destino.”
6.8. Então, o Abençoado entrou no primeiro
jhana. Emergindo dele ele entrou no segundo jhana ... no terceiro ... no quarto
jhana ... na esfera do espaço infinito ... na esfera da consciência infinita ... na
esfera do nada ... na esfera da nem percepção, nem não percepção. Emergindo
dela, ele entrou na cessação da percepção e sensação.
Então, o
venerável Ananda disse para o venerável Anuruddha: “'Venerável Anuruddha, o
Abençoado faleceu.” “Não, amigo, Ananda, o
Abençoado não faleceu, ele está na cessação da sensação e percepção.”
6.9. Então,
o Abençoado, emergindo da cessação da percepção e sensação, entrou na esfera da
nem percepção, nem não percepção. Emergindo dela, ele entrou na esfera do nada…
na esfera da consciência infinita... na esfera do espaço infinito... no quarto
jhana... no terceiro... no segundo... no primeiro jhana. Emergindo do primeiro
jhana ele entrou no segundo... no terceiro... no quarto jhana. No quarto jhana,
ele faleceu.
6.10. E
quando o Abençoado realizou o parinibbana, ocorreu um grande terremoto,
assustador e aterrorizador e o estrondo de trovões sacudiram o céu. E o Brahma Sahampati recitou
estes versos:
“Todos os seres no mundo, todos os corpos estão sujeitos à dissolução:
até mesmo o Mestre, sem igual no mundo,
o Senhor poderoso e Buda perfeito faleceu.”
E Sakka, o
senhor dos devas, recitou estes versos:
“Impermanentes são as coisas condicionadas
sujeitas à origem
e cessação,
tendo surgido, elas são destruídas,
a sua cessação é a verdadeira
bem-aventurança.”
E o
venerável Anuruddha recitou estes versos:
“Sem inspirar e expirar – só com
a mente firme
o Sábio liberto da cobiça faleceu para a paz.
Com a mente inabalável ele suportou todas as dores:
em nibbana a mente iluminada está liberta.”
E o
venerável Ananda recitou estes versos:
“Assustador foi o terremoto,
todos os pelos ficaram em pé,
quando o Buda consumado faleceu.”
E aqueles
bhikkhus que ainda não haviam superado o desejo estavam chorando e arrancando
os cabelos, levantando os braços, jogando-se ao chão e contorcendo-se,
clamando: “Demasiado cedo o Abençoado está morrendo, demasiado cedo o Iluminado
está morrendo, demasiado cedo o Olho do Mundo está desaparecendo!” Mas aqueles
bhikkhus que se libertaram do desejo, suportaram com paciência, dizendo: “Todas
as coisas condicionadas são impermanentes – qual o benefício disso tudo?”
6.11.
Então, o venerável Anuruddha disse: “Amigos, já basta dessa choradeira e
lamentação! O Abençoado já não lhes disse que todas aquelas coisas que para nós
são queridas, estimadas e prazerosas estão sujeitas à mudança, separação e
alteração? Então porque tudo isso? Como poderia ser possível que tudo aquilo
que nasce, veio a ser, condicionado, que
está sujeito à dissolução, não desapareça – isso é impossível. Os devas,
amigos, estão resmungando.”
“Venerável
Anuruddha, que tipo de devas você pode perceber?” - “Amigo Ananda, há os devas do
céu cujas mentes estão atadas à terra, eles estão chorando e arrancando os
cabelos ... E há os devas da terra cujas
mentes estão atadas à terra, que se comportam da mesma forma. Mas aqueles devas
que se libertaram do desejo, suportam com paciência, dizendo: ‘Todas as coisas
condicionadas são impermanentes – qual o benefício disso tudo?’”
6.12.
Então, o venerável Anuruddha e o venerável Ananda passaram o resto da noite
conversando sobre o Dhamma. E o venerável Anuruddha disse: “Agora, amigo
Ananda, vá para Kusinara e anuncie para os Mallas: ‘Vasetthas, o Abençoado
faleceu. Agora é o momento de vocês fazerem como julgarem adequado.’” - “Sim,
venerável senhor,” disse Ananda; ele então se vestiu e tomando a sua tigela e o
manto externo foi com um acompanhante para Kusinara. Naquela ocasião, os Mallas
de Kusinara estavam reunidos no seu salão de assembléias tratando de negócios.
E o venerável Ananda foi até eles e comunicou a mensagem do venerável
Anuruddha. Ao ouvirem as palavras do venerável Ananda, os Mallas … foram
abatidos pela tristeza e angústia, com a mente subjugada pelo pesar o que fez
com que eles chorassem e arrancassem os seus cabelos.
6.13.
Então, os Mallas ordenaram que alguns homens trouxessem perfumes e coroas de
flores e reuniram todos os músicos. E com os perfumes e coroas de flores e
todos os músicos e com quinhentos jogos de tecidos eles foram para o bosque de
árvores sal onde se encontrava o corpo do Abençoado. E lá eles honraram,
demonstraram o seu apreço, veneraram e adoraram o corpo do Abençoado com
danças, canções e música, com grinaldas e perfumes, erigindo coberturas e
tendas circulares para passar o dia ali. E eles pensaram: “É muito tarde para
cremar o corpo do Abençoado hoje. Faremos isso amanhã.” E assim, homenageando-o
dessa maneira, eles esperaram pelo segundo, terceiro, quarto, quinto e sexto
dia.
6.14. E no
sétimo dia os Mallas de Kusinara pensaram: “Nós honramos o suficiente o corpo
do Abençoado com danças, canções ..., agora devemos cremar o seu corpo depois de carregá-lo
através do portão do sul.” Então oito chefes Malla, tendo lavado a cabeça e
vestido roupas novas, declararam: “Agora levantaremos o corpo do Abençoado,”
mas não conseguiram fazer isso. Em vista disso eles foram até o venerável
Anuruddha e relataram o que havia acontecido: “Porque não conseguimos levantar
o corpo do Abençoado?” - “Vasetthas, a sua vontade é uma coisa, mas a vontade dos
devas é outra.”
6.15.
“Venerável senhor, qual é a vontade dos devas?” - “Vasetthas, a sua vontade é,
tendo honrado o suficiente o corpo do Abençoado com danças e canções ...,
cremar o seu corpo depois de carregá-lo através do portão sul. Mas a vontade
dos devas é depois de ter honrado os corpo do Abençoado com danças e canções
divinas ..., carregá-lo através do portão norte da cidade, passando pelo meio da
cidade e saindo pelo portão leste para o santuário dos Mallas Makuta-Bandhana e
lá cremar o corpo.” - “Venerável senhor, se essa é a vontade dos devas, que assim
seja.”
6.16. Nessa
ocasião, até mesmo os esgotos e amontoados de lixo em Kusinara estavam cobertos
até a altura dos joelhos com flores da árvore coral. E os devas, bem como os
Mallas de Kusinara, honraram o corpo do Abençoado com danças e canções divinas
e humanas ...; e eles carregaram o corpo para o norte da cidade, atravessaram o
portão norte, cruzaram pelo meio da cidade e saíram pelo portão leste para o santuário dos Mallas Makuta-Bandhana,
onde deitaram o corpo.
6.17.
Então, eles perguntaram ao venerável Ananda: “Venerável senhor, como devemos
tratar o corpo de um Tathagata?” - “Vasetthas, vocês devem tratá-lo do mesmo modo
que os restos mortais de um monarca que gira a roda.” - “E como é isso, venerável
senhor?” - “Vasetthas, os restos mortais de um monarca que gira a roda são
envoltos num pano de linho novo. Este deve ser envolto com algodão penteado ...
Depois, tendo feito uma pira funerária com todos os tipos de perfumes, o corpo
do rei é cremado e uma estupa é construída numa encruzilhada ...”
6.18.
Então, os Mallas ordenaram que fossem trazidos os tecidos e cuidaram do corpo
do Abençoado da forma apropriada ...
6.19. Agora, exatamente nessa ocasião o venerável Mahakassapa estava caminhando pela estrada principal de
Pava a Kusinara com uma grande comitiva, com uns quinhentos bhikkhus. E saindo
da estrada o venerável Mahakassapa sentou-se à sombra de uma árvore. E
aconteceu que um certo Ajivika vinha caminhando pela estrada principal em
direção a Pava e ele havia pego uma flor da árvore coral em Kusinara. O
venerável Mahakassapa o viu vindo à distância e disse: “Amigo, você conhece o
nosso Mestre?” - “Sim, amigo, eu conheço. O contemplativo Gotama faleceu faz uma
semana. Foi lá que eu peguei esta flor da árvore coral.” E aqueles bhikkhus que
ainda não haviam superado o desejo estavam chorando e arrancando os cabelos ...
Mas aqueles bhikkhus que se libertaram do desejo, suportaram com paciência,
dizendo: “Todas as coisas condicionadas são impermanentes – qual o benefício
disso tudo?”
6.20. E sentado
junto com o grupo estava um certo Subhadda, que havia seguido a vida santa já com a
idade avançada e ele disse para aqueles bhikkhus: “Já basta, amigos, não
chorem, não se lamentem! Ainda bem que nos livramos do Grande Contemplativo.
Sempre fomos importunados com as observações dele: ‘Não é apropriado que você
faça isso, não é apropriado que você faça aquilo!’ Agora podemos fazer o que
quisermos!”
Mas o
venerável Mahakassapa disse para os bhikkhus: “Amigos, já basta desse choro e
lamentação! O Abençoado já não lhes
disse que todas aquelas coisas que para nós são queridas e estimadas e
prazerosas estão sujeitas à mudança, separação e alteração? Então porque tudo
isso? Como poderia ser possível que tudo aquilo que nasce, veio a ser, condicionado, que está sujeito à dissolução,
não desapareça – isso é impossível.”
6.21.
Enquanto isso, quatro chefes Mallas, tendo lavado as suas cabeças e vestido
roupas novas, disseram: “Nós iremos acender a pira funerária do Abençoado,” mas
eles foram incapazes de fazer isso. Eles foram até o venerável Anuruddha e
perguntaram porque estava acontecendo aquilo. “Vasetthas, a sua vontade é uma
coisa, mas a vontade dos devas é outra.” - “Bem, venerável senhor, qual é a
vontade dos devas?” - “Vasetthas, a vontade dos devas é a seguinte: ‘O venerável
Mahakassapa está caminhando pela estrada principal de Pava para Kusinara com
uma grande comitiva de uns quinhentos bhikkhus. A pira funerária do Abençoado
não se acenderá até que o venerável Mahakassapa homenageie o Abençoado com a
sua cabeça aos pés dele.’” - “Venerável senhor, se essa é a vontade dos devas, que
assim seja.”
6.22.
Então, o venerável Mahakassapa foi até o santuário dos Mallas em
Makuta-Bandhana para a pira funerária e cobrindo o ombro com o manto, juntou
as palmas das mãos em saudação e circundou a pira três vezes, depois ele
descobriu os pés do Abençoado e o homenageou com a sua cabeça aos pés dele, e
os quinhentos bhikkhus fizeram o mesmo. E quando eles terminaram, a pira
funerária do Abençoado pegou fogo por si mesma.
6.23. E
quando o corpo do Abençoado foi cremado, o que tinha sido pele, músculos,
tendões, líquido sinovial, tudo isso desapareceu e nem mesmo cinzas ou pó
restaram, só relíquias restaram. Como
quando a manteiga líquida é queimada, não restam cinzas nem pó, assim também
com o corpo do Abençoado ..., só relíquias restaram. E
todos os quinhentos jogos de tecidos, mesmo o tecido interno e o externo,
também queimaram. E quando o corpo do Abençoado estava cremado, uma chuva caiu
do céu e uma outra jorrou das árvores sal extinguindo a pira funerária. E os
Mallas de Kusinara derramaram água perfumada sobre a pira com o mesmo
propósito. Então, os Mallas no seu salão de assembléias, reverenciaram as
relíquias durante uma semana com danças, canções, grinaldas e música, depois de
fazer uma gelosia com lanças circundada por uma parede feita com arcos.
6.24. E o
Rei Ajatasattu Vedehiputta de Magadha ouviu que o Abençoado havia falecido em
Kusinara. Ele enviou uma mensagem para os Mallas de Kusinara: “O Abençoado era
um Khattiya e eu sou um Khattiya. Eu sou digno de receber uma parte dos restos
mortais do Abençoado. Construirei uma grande estupa para guardá-las.” Os
Licchavis de Vesali ouviram e mandaram uma mensagem: “O Abençoado era um
Khattiya e nós somos Khattiyas. Nós somos dignos de receber uma parte dos
restos mortais do Abençoado. Nós construiremos uma grande estupa para
guardá-las.” Os Sakyas de Kapilavatthu
ouviram e mandaram uma mensagem: “O
Abençoado era o líder do nosso clã. Nós somos dignos de receber uma parte dos
restos mortais do Abençoado. Nós construiremos uma grande estupa para
guardá-las.” Os Bulayas de Allakappa e os Koliyas de Ramagama responderam de
modo semelhante. O Brâmane de Vethadipa ouviu e mandou uma mensagem: “O
Abençoado era um Khattiya e eu sou um Brâmane ...”, e os Mallas de Pava
enviaram uma mensagem: “O Abençoado era um Khattiya e nós somos Khattiyas. Nós
somos dignos de receber uma parte dos restos mortais do Abençoado. Nós
construiremos uma grande estupa para guardá-las.”
6.25. Ao
ouvirem isso, os Mallas de Kusinara se dirigiram à multidão, dizendo: “O
Abençoado morreu na nossa comunidade. Nós não daremos nenhuma parte dos restos
mortais do Abençoado. Em vista disso o Brâmane Dona se dirigiu à multidão com
estes versos:
“Ouçam, senhores, a minha proposta:
moderação é o ensinamento do Buda.
Não é correto que o conflito surja
ao compartir os restos do melhor dentre os homens.
Vamos nos unir em harmonia e paz,
com amizade dividir em oito porções:
que as estupas sejam construídas em todas as direções,
que todos possam vê-los e crescer na fé!”
“Muito bem,
Brâmane, você então divida os restos do Abençoado do melhor modo e da forma
mais justa!” - “Muito bem, amigos,” disse Dona. E ele dividiu os restos do melhor
modo e da forma mais justa, em oito porções e depois disse para a assembléia:
“Senhores, por favor dêem uma urna para mim, eu construirei uma grande estupa
para guardá-la.” E assim a urna foi dada para Dona.
6.26.
Agora, os Moriyas de Pipphalavana ouviram que o Abençoado havia falecido e
enviaram uma mensagem: “O Abençoado era um Khattiya e nós somos Khattiyas. Nós
somos dignos de receber uma parte dos restos mortais do Abençoado. Nós construiremos
uma grande estupa para guardá-las.”
“Não sobrou
nenhuma porção dos restos do Abençoado, tudo já foi repartido. Então, vocês
devem levar os carvões.” E assim eles levaram os carvões.
6.27.
Então, o Rei Ajatasattu de Magadha construiu uma grande estupa para as relíquias
do Abençoado em Rajagaha. Os Licchavis de Vesali construíram um em Vesali, os
Sakyas de Kapilavatthu construíram um em Kapilavatthu, os Bulayas de Allakappa
construíram um em Allakappa, os Koliyas de Ramagama construíram um em Ramagama,
o Brâmane de Vethadipa construiu um em Vethadipa, os Mallas de Pava construíram
um em Pava, os Mallas de Kusinara construíram uma grande estupa em Kusinara, o
Brâmane Dona construiu uma grande estupa para a urna, e os Moriyas de
Pipphalavana construíram uma grande estupa para os carvões em Pipphalavana.
Assim, oito estupas foram construídos para as relíquias, uma nona para a urna e
uma décima para os carvões. Assim era antigamente.
6.28. Oito
porções de relíquias restaram dele,
aquele que tudo via. Destas, sete ficaram
em Jambudipa com honras, a oitava
em Ramagama guardada pelos reis naga.
Um dente foi guardado pelos devas do Trinta e três,
os reis de Kalinga têm um, os nagas também.
Eles derramam a sua glória sobre a terra fértil.
Assim o Sábio é honrado pelos honrados.
Devas e nagas, reis, os homens mais nobres
juntam as mãos em respeito, pois é difícil
encontrar outro igual por incontáveis eons.
Revisado: 14 Maio 2011
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