3. Cittavagga

Mente

 


 

 

Esta mente agitada, vacilante,
difícil de vigiar e controlar,
o sábio endireitará,
tal como o flecheiro faz com as flechas.
                                                        Dhp 33

 

Tal como um peixe tirado da água
e jogado na terra,
esta mente se debate
enquanto está abandonando o reino de Mara.
                                                        Dhp 34

Para ouvir

 


 

[Nota Versos 33 e 34] Cittam (mente): este termo é comumente traduzido como mente ou consciência e é visto como a essência do assim chamado ser, que desempenha o papel mais importante no complexo "maquinário" do homem. Citta é mais apropriadamente traduzida como um "estado mental" ou, melhor ainda, um "estado emocional". É citta que é ou contaminada ou purificada, e este é o pior inimigo e o maior amigo que alguém tem. Citta parece ser o equivalente a "alma" no pensamento Ocidental. No Budismo, no entanto, uma "alma" como entidade permanente não é reconhecida. Citta, que toma o lugar da alma no pensamento Ocidental, se refere ao estado emocional de uma pessoa. Citta não é uma entidade fixa, mas sim, uma atividade instável tal como uma chama. Algumas vezes as emoções estão estimuladas e, outras vezes citta está calma (as emoções estão ausentes). Podemos até traduzi-la como "temperamento". Algumas pessoas que escrevem sobre o Budismo, erroneamente, consideram citta como equivalente a "mente" ou "consciência". Mas o que se entende por citta é o aspecto "emocional", e não os aspectos cognitivos do processo mental. Quando uma pessoa está dormindo e está em um estado sem sonhos, ela experimenta uma espécie de estado mental que é mais ou menos passivo do que ativo. É semelhante ao estado mental que se experimenta no momento da concepção e no momento da morte. O termo da filosofia Budista para este tipo de estado mental é bhavanga citta, que significa o estado mental natural que é a condição para a existência da pessoa. Surgindo e desaparecendo a cada momento, bhavanga flui como uma corrente d'água, não permanecendo a mesma por dois momentos consecutivos. Nós de fato experimentamos este tipo de estado mental, não só em um estado sem sonhos, mas também em nosso estado de vigília. No decorrer da nossa vida experimentamos estados mentais de bhavanga mais do que qualquer outro tipo de estado mental. Portanto bhavanga torna-se o estado natural da mente.

Alguns estudiosos consideram bhavanga como sendo o mesmo que subconsciência. De acordo com o Dicionário de Filosofia subconsciência é "um compartimento da mente suposto, por parte de certos psicólogos e filósofos, de existir abaixo do limiar da consciência". Na opinião de alguns psicólogos Ocidentais, a subconsciência e a consciência coexistem.

Mas bhavanga não é um sub-plano e também não corresponde à consciência subliminar de F. W. Myer.

Bhavanga é assim chamado porque é o estado de repouso da mente que é natural para o contínuo vital de um indivíduo. É por isso que o contínuo vital tem sido sugerido como o termo equivalente em português para bhavanga. Mas uma tradução melhor seria "estado de repouso mental".

Este estado mental de bhavanga, que a pessoa sempre experimenta enquanto não é interrompida por estímulos externos, vibra por um momento mental e desaparece quando um estímulo ativa os sentidos. Suponha, por exemplo, que o olho seja estimulado. Então, o fluxo de consciência bhavanga é bloqueado e a consciência da porta do sentido (cuja função é voltar a atenção para o objeto) surge e desaparece.  Imediatamente após isso, surge uma percepção visual que vê o objeto, mas que ainda não sabe exatamente do que se trata. Esta operação do sentido é seguida por um momento de recepção do objeto que é visto. Em seguida surge o momento mental de investigação que momentaneamente analisa o objeto visto. Isto é seguido por um momento mental de decisão. Disso depende javana, a importante fase psicológica subsequente. É nesta fase que uma ação é julgada, seja ela benéfica ou prejudicial, quando o discernimento é exercido e fará sua parte. Kamma é realizado nesta fase.

Se decidida corretamente, torna-se benéfica; se de forma errônea, prejudicial. Independentemente da conveniência ou da inconveniência do objeto apresentado à mente, é possível que o indivíduo torne o processo de javana benéfico ou prejudicial. Se, por exemplo, encontra-se um inimigo, a raiva vai surgir automaticamente. Uma pessoa sábia pode, em vez disso, com autocontrole, irradiar pensamentos de amor bondade para ele. Esta é a razão pela qual o Buda declarou:

Por si mesmo o mal é feito,
Por si mesmo se é contaminado,
Por si mesmo nenhum mal é feito,
Por si mesmo se é purificado.
Ambas, impureza e pureza dependem de si mesmo.
Ninguém é purificado por outro.

É um fato aceito que o ambiente, as circunstâncias, as tendências habituais e assim por diante condicionam nossos pensamentos. Em tais ocasiões a volição é subordinada. Existe, no entanto, a possibilidade de nós superarmos as forças externas e produzir pensamentos benéficos ou prejudiciais exercendo nossa vontade própria. Um elemento exterior pode ser um fator causal, mas nós mesmos somos diretamente responsáveis pelas ações que se seguirão.

É extremamente difícil sugerir uma tradução adequada para javana.

Percepção é uma tradução sugerida por alguns. Impulso é sugerido como uma tradução alternativa, que parece ser menos adequado do que percepção. Aqui é mantido o termo em Pali.

Javana, literalmente, significa "correr velozmente". É assim chamado porque, no curso de um processo de pensamento, ela "corre velozmente" por sete momentos mentais, ou, no momento da morte, por cinco momentos mentais para um mesmo objeto. Os estados mentais que ocorrem em todos esses momentos mentais são semelhantes, mas a força potencial deles é diferente.

Todo este processo de pensamento que ocorre em um fragmento infinitesimal de tempo termina com a consciência de registro, com duração de dois momentos mentais. Assim, um processo de pensamento é completado após o término de dezessete momentos mentais. Esta é a análise de um processo de pensamento envolvido na experiência de um objeto.

No sistema Budista um elemento essencial na busca pela suprema realização espiritual é a contemplação sobre a verdadeira natureza da mente, cittanupassana.

"Cittanupassana" significa contemplação da mente. A mente é tão complexa e sutil que mesmo a ciência moderna não tem sido capaz de compreender sua real natureza. Mas o Buda foi capaz de compreender a verdadeira natureza da mente através do desenvolvimento de sua própria mente. O desenvolvimento da mente leva à concentração.

A mente assim desenvolvida pode ser facilmente dirigida para o conhecimento supremo. No entanto, tal estado não pode ser alcançado facilmente. A mente não sossega em um objeto, ela sempre se desvia. Quando se tenta controlar a mente, ela se contorce tal como um peixe retirado da água. Portanto, o controle da mente é para ser realizado com grande esforço.

De acordo com o Abhidhamma existem 121 tipos de mente. Nesta meditação (Cittanupassana) 16 aspectos da mente são descritos. Eles são: 1. Saraga (mente afetada pelo desejo), 2. Vitaraga (mente não afetada pelo desejo), 3. Sadosa (mente afetada pela raiva), 4. Vitadosa (mente não afetada pela raiva), 5. Samoha (mente afetada pela delusão), 6. Vitamoha (mente não afetada pela delusão), 7. Samkhitta (mente contraída), 8. Vikkhitta (mente distraída), 9. Mahaggata (mente transcendente), 10. Amahaggata (mente não transcendente), 11. Sauttara (mente superável), 12. Anuttara (mente insuperável), 13. Samahita (mente concentrada), 14. Asamahita (mente não concentrada), 15. Vimutta (mente libertada), 16. Avimutta (mente não libertada).

 

 

Revisado: 7 Janeiro 2012

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