10. Dandavagga

Punição

 


 

 

Todos tremem diante da punição,
a vida é preciosa para todos.
Colocando-se no lugar dos outros,
não mate, nem faça com que os outros matem.
                                                        Dhp 130

Para ouvir

 


 

[Nota Verso 130] Na haneyya, na ghataye (não mate, nem faça que os outros matem): nesse verso a qualidade que está sendo apontada é a compaixão, (karuna). Desentendimentos e disputas surgem devido à falta de compaixão. A compaixão universal surge apenas quando há a percepção da verdadeira realidade. A compaixão se expressa através de ações benéficas. Compaixão não consiste apenas de pensamentos compassivos. Ela tem que se mostrar através de ações compassivas. Compaixão é notar o sofrimento dos outros seres no mundo. Ela supera a indiferença insensível ao sofrimento dos seres, humanos ou não.

Similarmente, a compaixão deve se refletir na vida de uma pessoa através da boa vontade em fazer um esforço extra e dar auxílio onde for possível, ajudando as pessoas que estão aflitas. A compaixão tem a vantagem de reduzir o próprio egoísmo através da compreensão dos infortúnios dos outros. É o remédio do Buda para a crueldade, porque como pode alguém ferir os outros se ele já viu o quanto as pessoas já sofreram? A compaixão também tem dois “inimigos”: o “próximo” é a pena ou dó, enquanto o seu inimigo “distante” é a crueldade.

Metta: amor bondade. Metta é a primeira das quatro moradas divinas. Seu significado é aquilo que suaviza o coração de uma pessoa, ou a condição de um verdadeiro amigo. É definida como o desejo sincero pelo bem-estar e felicidade genuína de todos os seres vivos, sem exceção. Também é explicada como uma disposição amigável, pois um verdadeiro amigo deseja sinceramente o bem-estar de seu amigo.

“Tal qual uma mãe, colocando em risco a própria vida, ama e protege o seu filho, o seu único filho, da mesma forma, abraçando todos os seres, cultive um coração sem limites” é o conselho dado pelo Buda no Karaniya Metta Sutta. Não é o amor apaixonado da mãe pelo filho que está sendo enfatizado aqui, mas sim o seu desejo sincero pelo bem-estar genuíno de seu filho. Metta não é amor carnal, nem afeto pessoal, porque a tristeza surge inevitavelmente de ambos. Metta não é a mera boa-vizinhança, pois não faz distinção entre os vizinhos e os outros seres. Metta não é uma mera fraternidade universal, pois abrange todos os seres vivos, incluindo os animais, nossos “irmãos” e “irmãs” menores que necessitam de maior compaixão por serem indefesos. Metta também não é fraternidade religiosa. Devido às tristes limitações da chamada fraternidade religiosa humana, cabeças foram cortadas sem o menor escrúpulo, homens e mulheres sinceros foram assados e queimados vivos; muitas atrocidades de perplexa descrição foram cometidas; guerras cruéis que mancham as páginas da história mundial foram travadas. Mesmo neste supostamente iluminado século XXI, os seguidores de uma religião odeiam ou impiedosamente perseguem e até mesmo matam aqueles de outras religiões simplesmente porque não podem forçá-los a pensar como eles pensam, ou porque eles têm um “rótulo” diferente. Se, por conta de pontos de vista religiosos, pessoas de diferentes religiões não podem se reunir em uma plataforma comum como irmãos e irmãs, então certamente as missões de mestres compassivos mundiais lamentavelmente falhou. A doce metta transcende esses tipos limitados de fraternidade. Seu alcance e escopo é ilimitado. Não tem barreiras. Não faz discriminações. Metta permite que se considere o mundo inteiro como uma pátria e todos como seres companheiros. Assim como o sol lança seus raios de luz sobre todos, sem qualquer distinção, da mesma forma a sublime metta concede seus doces benefícios igualmente sobre o agradável e o desagradável, sobre o rico e o pobre, sobre o alto e o baixo, sobre o vicioso e o virtuoso, sobre o homem e a mulher, e sobre o homem e o animal.

Assim era a metta ilimitada do Buda que trabalhou pelo bem-estar e felicidade daqueles que o amavam, bem como daqueles que o odiavam e até mesmo tentaram feri-lo e matá-lo. O Buda tinha metta igualmente pelo seu próprio filho Rahula, pelo seu oponente Devadatta, pelo seu atendente Ananda, pelos seus admiradores e pelos seus oponentes. Esse amor bondade deve ser cultivado em igual medida para si mesmo, para amigos, para inimigos e para pessoas neutras. Suponha que um bandido abordasse uma pessoa que está viajando por uma floresta juntamente com um amigo íntimo, uma pessoa neutra e um inimigo, e suponha que fosse pedido que ela escolhesse um deles para ser a vítima. Se o viajante dissesse que ele deveria ser escolhido, então ele não teria metta por si mesmo. Se ele dissesse que qualquer uma das outras três pessoas devessem ser escolhidas, então ele não teria metta com relação a elas.

Essa é a característica da verdadeira metta. No exercício deste amor bondade ilimitado não se deve ignorar a si mesmo. Este ponto sutil não deve ser mal interpretado, pois o auto-sacrifício é uma doce virtude distinta e o desprendimento é outra virtude mais elevada. O cume de metta é a identificação de si mesmo com todos os seres, (sabbattata), não vendo diferença entre si mesmo e os outros. O assim chamado “eu” se dilui no “todo”. O separatismo se evapora. A unidade é realizada.

Não há um equivalente adequado em Português para o elegante termo em pali metta. Amor bondade, boa vontade, benevolência e amor universal são sugeridos como as melhores traduções. O oposto de metta é a raiva, má-vontade, ódio ou aversão. Metta não tem como coexistir com raiva ou conduta vingativa.

 

 

Revisado: 19 Janeiro 2013

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