Majjhima Nikaya 56
Upali Sutta
Para Upali
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1. Em certa
ocasião o Abençoado estava em Nalanda, no Manguezal de Pavarika.
2. Agora,
naquela ocasião o Nigantha Nataputta estava em Nalanda com um grande grupo de
Niganthas. Então, depois do Nigantha [chamado] Digha Tapassi haver esmolado em Nalanda e de haver retornado, após a refeição,
ele foi até o Manguezal de Pavarika para ver o Abençoado e ambos se
cumprimentaram. Quando a conversa amigável e cortês havia terminado, ele ficou
em pé a um lado e o Abençoado disse: “Há assentos, Tapassi, sente se assim
desejar.”
3. Quando
isso foi dito, Digha Tapassi tomou um assento mais baixo e sentou a um lado.
Então o Abençoado perguntou: “Tapassi, quantos tipos de ação o Nigantha
Nataputta descreve para a realização de uma ação prejudicial, para a
perpetração de uma ação prejudicial?”
“Amigo Gotama,
o Nigantha Nataputta não tem o costume de usar a descrição ‘ação, ação’; o
Nigantha Nataputta tem o costume de usar a descrição ‘vara, vara’.”
“Então, Tapassi, quantos tipos de varas o Nigantha Nataputta descreve
para a a realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de uma ação
prejudicial?”
“Amigo
Gotama, o Nigantha Nataputta descreve três tipos de varas para a a realização
de uma ação prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial; isto é, a
vara corporal, a vara verbal e a vara mental.”
“Como então, Tapassi, a vara corporal é uma, a vara verbal outra e a
vara mental uma outra mais?”
“A vara
corporal é uma, amigo Gotama, a vara verbal outra e a vara mental uma outra
mais.”
“Desses
três tipos de vara, Tapassi, assim analisadas e diferenciadas, qual tipo de
vara o Nigantha Nataputta descreve como sendo a mais repreensível para a
realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial:
a vara corporal, ou a vara verbal, ou a vara mental?”
“Desses
três tipos de vara, amigo Gotama, assim analisadas e diferenciadas, o Nigantha
Nataputta descreve a vara corporal como sendo a mais repreensível para a
realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial,
e não tanto a vara verbal e a vara mental.”
“Você disse
a vara corporal, Tapassi?”
“Eu disse a
vara corporal, amigo Gotama.”
“Você disse
a vara corporal, Tapassi?”
“Eu disse a
vara corporal, amigo Gotama.”
“Você disse
a vara corporal, Tapassi?”
“Eu disse a
vara corporal, amigo Gotama.”
Assim o
Abençoado fez com que o Nigantha Digha Tapassi mantivesse a sua afirmação pela
terceira vez.
4. Então o Nigantha Digha Tapassi perguntou ao Abençoado: “E você, amigo
Gotama, quantos tipos de vara descreve para a realização de uma ação
prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial?”
“Tapassi, o
Tathagata não tem o costume de usar a descrição ‘vara, vara’; o Tathagata tem o
costume de usar a descrição ‘ação, ação’.”
“Mas, amigo
Gotama, quantos tipos de ação você descreve para a realização de uma ação
prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial?”
“Tapassi,
eu descrevo três tipos de ação para a realização de uma ação prejudicial, para
a perpetração de uma ação prejudicial: isto é, a ação corporal, a ação verbal e
a ação mental.”
“Como
então, mestre Gotama, a ação corporal é uma, a ação verbal outra e a ação
mental uma outra mais?”
“A ação
corporal é uma, Tapassi, a ação verbal outra e a ação mental uma outra mais.”
“Desses
três tipos de ação, mestre Gotama, assim analisadas e diferenciadas, qual tipo
de ação o mestre Gotama descreve como sendo a mais repreensível para a
realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial:
a ação corporal, ou a ação verbal, ou a ação mental?”
“Desses
três tipos de ação, Tapassi, assim analisadas e diferenciadas, eu descrevo a
ação mental como sendo a mais repreensível para a realização de uma ação
prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial, e não tanto a ação
corporal e a ação verbal.”
“Você disse a ação mental, amigo Gotama?”
“Eu disse a
ação mental, Tapassi.”
“Você disse
a ação mental, amigo Gotama?”
“Eu disse a
ação mental, Tapassi.”
“Você disse
a ação mental, amigo Gotama?”
“Eu disse a
ação mental, Tapassi.”
Assim o
Nigantha Digha Tapassi fez com que o Abençoado mantivesse a sua afirmação pela
terceira vez, depois do que, ele se levantou do seu assento e foi até o
Nigantha Nataputta.
5. Agora,
naquela ocasião o Nigantha Nataputta estava sentado junto com uma grande
assembléia de homens leigos de Balaka, sendo Upali o mais destacado dentre
eles. O Nigantha Nataputta viu o Nigantha Digha Tapassi vindo à distância e
perguntou: “De onde você vem agora, ao meio do dia, Tapassi?”
“Eu venho
da presença do contemplativo Gotama, venerável senhor.”
“Você teve
uma conversa com o contemplativo Gotama, Tapassi?”
“Eu tive
uma conversa com o contemplativo Gotama, venerável senhor.”
“Como foi a
sua conversa com ele, Tapassi?”
Então o
Nigantha Digha Tapassi relatou ao Nigantha Nataputta toda a conversa com o
Abençoado.
6. Quando
isso foi dito, o Nigantha Nataputta disse:
“Muito bem,
Tapassi! O Nigantha Digha Tapassi respondeu ao contemplativo Gotama como um
discípulo bem instruído que compreende corretamente os ensinamentos do seu
mestre. Qual a importância da trivial vara mental em comparação com a grosseira
vara corporal? Ao contrário, a vara corporal é a mais repreensível para a
realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial,
e não tanto a vara verbal e a vara mental.”
7. Quando
isso foi dito, o chefe de família Upali disse para o Nigantha Nataputta: “Muito bem, venerável
senhor, [por parte do] Digha Tapassi! O venerável Tapassi respondeu ao
contemplativo Gotama como um discípulo bem instruído que compreende
corretamente os ensinamentos do seu mestre. Qual a importância da trivial vara
mental em comparação com a grosseira
vara corporal? Ao contrário, a vara corporal é a mais repreensível para a
realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de uma ação prejudicial,
e não tanto a vara verbal e a vara mental. Agora, venerável senhor, devo ir e
refutar a doutrina do contemplativo Gotama com base nessa afirmação. Se o
contemplativo Gotama afirmar perante mim aquilo que o venerável Digha Tapassi
fez com que ele afirmasse, então da mesma forma como um homem forte é capaz de agarrar os pêlos de um carneiro
peludo e arrastá-lo para cá e para lá e arrastá-lo em círculos, assim em debate
eu irei arrastar o contemplativo Gotama para cá e para lá e em círculos. Da
mesma forma como um forte cervejeiro é capaz de arremessar uma peneira grande
num tanque de água profundo e agarrando-a pelos cantos é capaz de arrastá-la
para cá e para lá e em círculos, assim em debate eu irei arrastar o
contemplativo Gotama para cá e para lá e em círculos. Da mesma forma como um
forte cervejeiro é capaz de tomar um filtro pelos cantos e agitá-lo para cima e
para baixo e dar-lhe pancadas, assim em debate eu agitarei o contemplativo
Gotama para cima e para baixo e darei pancadas nele. E da mesma forma como um
elefante sexagenário é capaz de mergulhar num lago profundo e desfrutar o jogo
de lavar o cânhamo, assim eu desfrutarei o jogo de lavar o cânhamo com o
contemplativo Gotama. Venerável senhor, devo ir e refutar a doutrina do contemplativo Gotama com base
nessa afirmação.”
“Vá, chefe
de família e refute a doutrina do
contemplativo Gotama com base nessa afirmação. Pois, ou eu devo refutar a
doutrina do contemplativo Gotama, ou então o Nigantha Digha Tapassi, ou você
mesmo.”
8. Quando
isso foi dito, o Nigantha Digha Tapassi disse para o Nigantha Nataputta:
“Venerável senhor, eu não penso que o chefe de família Upali deveria [tentar]
refutar a doutrina do contemplativo Gotama. Pois o contemplativo Gotama é um
mágico que conhece uma mágica de conversão através da qual ele converte os
discípulos de outras seitas.”
“É impossível,
Tapassi, não pode acontecer que o chefe de família Upali se torne um discípulo
do contemplativo Gotama; mas é possível, pode acontecer que o contemplativo
Gotama se torne um discípulo do chefe de família Upali. Vá, chefe de família, e
refute a doutrina do contemplativo Gotama. Pois, ou eu devo refutar a doutrina
do contemplativo Gotama, ou então o Nigantha Digha Tapassi, ou você mesmo.
Pela
segunda vez ... Pela terceira vez o Nigantha Digha Tapassi disse para o
Nigantha Nataputta: “Venerável senhor, eu não penso que o chefe de família
Upali deveria [tentar] refutar a doutrina do contemplativo Gotama. Pois o
contemplativo Gotama é um mágico que conhece uma mágica de conversão através da
qual ele converte os discípulos de outras seitas.”
“É
impossível, Tapassi, não pode acontecer que o chefe de família Upali se torne
um discípulo do contemplativo Gotama; mas é possível, pode acontecer que o
contemplativo Gotama se torne um discípulo do chefe de família Upali. Vá, chefe
de família, e refute a doutrina do contemplativo Gotama. Pois, ou eu devo
refutar a doutrina do contemplativo Gotama, ou então o Nigantha Digha Tapassi,
ou você mesmo.”
9. “Sim,
venerável senhor, o chefe de família Upali respondeu e levantando-se do seu
assento, depois de homenagear o Nigantha Nataputta, mantendo-o à sua direita,
ele partiu para ir até o Abençoado no Manguezal de Pavarika. Lá, depois de
cumprimentar o Abençoado, ele sentou a um lado e perguntou: “Venerável senhor,
o Nigantha Digha Tapassi esteve aqui?”
“O Nigantha
Digha Tapassi esteve aqui, chefe de família.”
“Venerável
senhor, você teve uma conversa com ele?”
“Eu tive
uma conversa com ele, chefe de família.”
“Como foi a
sua conversa com ele, venerável senhor?”
Então o
Abençoado relatou ao chefe de família Upali toda a conversa com o Nigantha
Digha Tapassi.
10. Quando
isso foi dito, o chefe de família Upali disse para o Abençoado: “Muito bem,
venerável senhor, por parte do Digha Tapassi! O Nigantha Digha Tapassi
respondeu ao contemplativo Gotama como um discípulo bem instruído que
compreende corretamente os ensinamentos do seu mestre. Qual a importância da
trivial vara mental em comparação com a
grosseira vara corporal? Ao contrário, a vara corporal é a mais
repreensível para a realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de
uma ação prejudicial, e não tanto a vara verbal e a vara mental.”
“Chefe de
família, se você quiser debater com base na verdade, poderemos ter uma conversa
sobre isso.”
“Eu
debaterei com base na verdade, venerável senhor, então conversemos sobre isso.”
11. “O que
você pensa, chefe de família? Aqui, algum Nigantha pode estar aflito, sofrendo
e gravemente enfermo, [com uma enfermidade que requer o tratamento com água
fria, o que é proibido pelos votos que ele tomou], e pode ser que ele recuse a
água fria, [embora mentalmente a deseje], e use apenas a água quente, [que é
permitida, mantendo assim os seus votos através do corpo e da linguagem]. Poque
ele não obtém a água fria pode ser que ele morra. Agora, chefe de família, em
que lugar o Nigantha Nataputta descreveria a ocorrência do renascimento dele?”
“Venerável
senhor, existem devas chamados ‘atados pela mente’; ele renasceria dentre eles.
Por que isso? Porque ao morrer ele ainda estava preso, [pelo apego], à mente.”
“Chefe de família, chefe de família, preste atenção à sua reposta! O que
você disse antes não está de acordo com o que disse depois, nem aquilo que você
disse depois está de acordo com o que disse antes. No entanto você fez esta
afirmação: ‘Eu debaterei com base na
verdade, venerável senhor, então conversemos sobre isso’.”
“Venerável
senhor, embora o Abençoado tenha dito isso, a vara corporal no entanto é a mais
repreensível para a realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de
uma ação prejudicial, e não tanto a vara verbal e a vara mental.”
12. “O que você pensa, chefe de família? Aqui, algum Nigantha pode estar
contido com quatro controles - coibido por
todas as coibições, sujeitado por todas as coibições, purificado por todas as
coibições e demandado por todas as coibições –
e no entanto ao caminhar para frente e regressar ele realiza a destruição de
muitas criaturas minúsculas. Que conseqüência o
Nigantha Nataputta descreve para ele?”
“Venerável
senhor, o Nigantha Nataputta não descreve aquilo que não é um ato da vontade
como sendo muito censurável.”
“Mas se
alguém tem volição, chefe de família?”
“Então é
muito censurável, venerável senhor.”
“Mas sob
qual [das três varas] o Nigantha Nataputta descreve a volição, chefe de
família?”
“Sob a vara
mental, venerável senhor.”
“Chefe de família, chefe de família, preste atenção à sua reposta! O que
você disse antes não está de acordo com o que disse depois, nem aquilo que você
disse depois está de acordo com o que disse antes. No entanto você fez esta
afirmação: ‘Eu debaterei com base na
verdade, venerável senhor, então conversemos sobre isso’.”
“Venerável
senhor, embora o Abençoado tenha dito isso, a vara corporal no entanto é a mais
repreensível para a realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de
uma ação prejudicial, e não tanto a vara verbal e a vara mental.”
13. “O que
você pensa, chefe de família? Esta cidade Nalanda é rica, próspera e populosa,
repleta de gente e bem suprida?”
“Sim,
venerável senhor, ela é.”
“O que você
pensa, chefe de família? Suponha que um homem aqui viesse brandindo uma espada
e dissesse o seguinte: ‘Num momento, num instante converterei todos os seres
vivos desta cidade, Nalanda, numa massa de carne, num amontoado de carne.’ O
que você pensa, chefe de família, aquele homem seria capaz de fazer isso?”
“Venerável
senhor, dez, vinte, trinta, quarenta ou mesmo cinqüenta homens não seriam
capazes de converter todos os seres vivos desta cidade de Nalanda numa massa de
carne, num amontoado de carne, num momento, num instante, de que vale apenas um
homem sem importância?”
“O que você
pensa, chefe de família? Suponha que algum contemplativo ou brâmane aqui viesse
possuindo poderes supra-humanos, com maestria da mente, e ele dissesse o
seguinte: ‘Eu reduzirei esta cidade, Nalanda, a cinzas com uma ação mental de
raiva.’ O que você pensa, chefe de
família, um tal contemplativo ou brâmane seria capaz de fazer isso?”
“Venerável
senhor, um tal contemplativo ou brâmane possuindo poderes supra-humanos, com
maestria da mente, seria capaz de reduzir dez, vinte, trinta, quarenta ou mesmo
cinqüenta Nalandas a cinzas com uma ação mental de raiva, de que vale apenas
uma Nalanda sem importância?”
“Chefe de
família, chefe de família, preste atenção à sua reposta! O que você disse antes
não está de acordo com o que disse depois, nem aquilo que você disse depois
está de acordo com o que disse antes. No entanto você fez esta afirmação:
‘Eu debaterei com base na verdade,
venerável senhor, então conversemos sobre isso’.”
“Venerável
senhor, embora o Abençoado tenha dito isso, a vara corporal no entanto é a mais
repreensível para a realização de uma ação prejudicial, para a perpetração de
uma ação prejudicial, e não tanto a vara verbal e a vara mental.”
14. “O que
você pensa, chefe de família? Você ouviu como as florestas de Dandaka, Kalinga,
Mejjha e Matanga se tornaram florestas?” –
“Sim, venerável senhor.” – “Como você ouviu que elas se tornaram florestas?” –
“Venerável senhor, eu ouvi que elas se tornaram florestas através de um ato de
raiva por parte dos videntes.”
“Chefe de
família, chefe de família, preste atenção à sua reposta! O que você disse antes
não está de acordo com o que disse depois, nem aquilo que você disse depois
está de acordo com o que disse antes. No entanto você fez esta afirmação: ‘Eu
debaterei com base na verdade, venerável senhor, então conversemos sobre
isso’.”
15.
“Venerável senhor, eu estava satisfeito e contente com o primeiro símile do
Abençoado. Apesar disso, eu pensei que me deveria opor ao Abençoado deste modo,
pois desejava ouvir as várias soluções do Abençoado para o problema. Magnífico,
venerável senhor! Magnífico, venerável senhor! O Abençoado esclareceu o Dhamma
de várias formas, como se tivesse colocado em pé o que estava de cabeça para
baixo, revelasse o que estava escondido, mostrasse o caminho para alguém que estivesse
perdido ou segurasse uma lâmpada no escuro para aqueles que possuem visão
pudessem ver as formas. Venerável senhor, eu busco refúgio no Abençoado, no
Dhamma e na Sangha dos bhikkhus. Que o Abençoado me aceite como discípulo leigo
que buscou refúgio para o resto da vida.”
16.
“Investigue a fundo, chefe de família. É bom que pessoas tão bem conhecidas
como você investiguem a fundo.”
“Venerável
senhor, eu estou ainda mais satisfeito e contente com o Abençoado por me dizer
isso. Pois outros líderes de seitas, ao me obterem como seu discípulo,
conduziriam uma bandeira por toda Nalanda anunciando: ‘O chefe de família Upali
se tornou meu discípulo.’ Mas, ao contrário, o Abençoado me diz: ‘Investigue a
fundo, chefe de família. É bom que pessoas tão bem conhecidas como você
investiguem a fundo.’ Então pela segunda vez, venerável senhor, eu busco
refúgio no Abençoado, no Dhamma e na Sangha dos bhikkhus. Que o Abençoado me
aceite como discípulo leigo que nele buscou refúgio para o resto da sua vida.”
17. “Chefe
de família, a sua família por muito tempo tem sustentado os Niganthas, e você
deveria considerar que as esmolas devem ser dadas a eles sempre que eles
vierem.”
“Venerável
senhor, eu estou ainda mais satisfeito e contente com o Abençoado por me dizer
isso. Venerável senhor, eu ouvi que o contemplativo Gotama diz o seguinte: ‘As
dádivas devem ser dadas apenas para mim; as dádivas não devem ser dadas aos
discípulos dos outros. As dádivas devem ser dadas apenas para os meus
discípulos; as dádivas não devem ser dadas aos discípulos dos outros. Apenas
aquilo que é dado para mim produz muitos frutos, e não aquilo que é dado aos
discípulos dos outros. Apenas aquilo que é dado para os meus discípulos produz
muitos frutos, e não aquilo que é dado aos discípulos dos outros.’ Mas ao
contrário, o Abençoado me encoraja a dar dádivas aos Niganthas. De todo modo,
saberemos o momento adequado para isso, venerável senhor. Então pela terceira
vez, venerável senhor, eu busco refúgio no Abençoado, no Dhamma e na Sangha dos
bhikkhus. Que o Abençoado me aceite como discípulo leigo que nele buscou
refúgio para o resto da sua vida.”
18. Então o Abençoado transmitiu o ensino gradual ao chefe de família
Upali, isto é, ele falou sobre a generosidade, sobre a virtude, sobre o
paraíso; ele explicou o perigo, a degradação e as contaminações dos prazeres
sensuais e as vantagens da renúncia. Quando ele percebeu que a mente do chefe
de família Upali estava pronta, receptiva, livre de obstáculos e confiante, ele
explicou o ensinamento particular dos Budas: o sofrimento, a sua origem, a sua
cessação e o caminho. Tal como um pano limpo, com todas as manchas removidas,
irá absorver um corante de modo adequado, assim também, enquanto o chefe de
família Upali estava ali sentado, a visão imaculada do Dhamma surgiu nele:
“Tudo que está sujeito ao surgimento está sujeito à cessação.” O chefe de família Upali viu o Dhamma, alcançou o Dhamma,
compreendeu o Dhamma, examinou a fundo o Dhamma; ele superou a dúvida, se libertou
da perplexidade, conquistou a intrepidez, e se tornou independente dos outros
na Revelação do Mestre. Então ele disse
para o Abençoado: “Agora, venerável senhor, preciso ir. Estou ocupado e tenho
muito que fazer.” “Agora é o momento, chefe de família, faça como julgar
adequado.”
19. Então,
o chefe de família Upali, estando satisfeito e contente com as palavras
do Abençoado, levantou do seu
assento e depois de homenageá-lo, mantendo-o à sua direita, partiu para
retornar à sua casa. Lá ele se dirigiu ao porteiro da seguinte forma: “Bom
porteiro, a partir de hoje eu fecho a minha porta aos Niganthas e às Niganthis,
e abro a minha porta para os bhikkhus, bhikkhunis e discípulos leigos do
Abençoado. Se algum Nigantha vier, diga-lhe o seguinte: ‘Espere, venerável
senhor, não entre. A partir de hoje o chefe de família Upali passou a ser um
discípulo do contemplativo Gotama. Ele fechou a sua porta aos Niganthas e às
Niganthis, e abriu a porta para os bhikkhus, bhikkhunis e discípulos leigos do
Abençoado. Venerável senhor, se você carece de esmolas, espere aqui, eles
trarão para você aqui’.” – “Sim, venerável senhor,” o porteiro respondeu.
20. O
Nigantha Digha Tapassi ouviu: “O chefe de família Upali se tornou um discípulo
do contemplativo Gotama.” Então ele foi até o Nigantha Nataputta e disse:
“Venerável senhor, eu ouvi o seguinte: ‘O chefe de família Upali se tornou um
discípulo do contemplativo Gotama’.”
“É
impossível, Tapassi, não pode acontecer que o chefe de família Upali tenha se
tornado um discípulo do contemplativo Gotama; mas é possível, pode acontecer
que o contemplativo Gotama tenha se tornado um discípulo do chefe de família
Upali.”
Pela
segunda vez ... pela terceira vez o Nigantha Digha Tapassi disse para o Nigantha
Nataputta: “Venerável senhor, eu ouvi o seguinte: ‘O chefe de família Upali se
tornou um discípulo do contemplativo Gotama’.”
“É
impossível, Tapassi, não pode acontecer ...”
“Venerável
senhor, devo ir e tentar descobrir se o chefe de família Upali se tornou um
discípulo do contemplativo Gotama?”
“Vá,
Tapassi, e descubra se ele se tornou um discípulo do contemplativo Gotama.”
21. Então o
Nigantha Digha Tapassi foi até a casa do chefe de família Upali. O porteiro o
viu vindo à distância e disse: “Espere, venerável senhor, não entre. A partir
de hoje o chefe de família Upali passou a ser um discípulo do contemplativo
Gotama. Ele fechou a sua porta aos Niganthas e às Niganthis, e abriu a porta para
os bhikkhus, bhikkhunis e discípulos leigos do Abençoado. Venerável senhor, se
você carece de esmolas, espere aqui, eles trarão as esmolas aqui para você.”
“Eu não
careço de esmolas, amigo,” ele disse, dando meia volta e indo até o Nigantha
Nataputta, dizendo: “Venerável senhor, pois é muitíssimo verdade que o chefe de
família Upali se tornou um discípulo do contemplativo Gotama. Venerável senhor,
eu não obtive a sua aprovação quando disse: ‘Venerável senhor, eu não penso que
o chefe de família Upali deveria [tentar] refutar a doutrina do contemplativo
Gotama. Pois o contemplativo Gotama é um mágico que conhece uma mágica de
conversão através da qual ele converte os discípulos de outras seitas.’ E
agora, venerável senhor, o seu chefe de família Upali foi convertido pelo
contemplativo Gotama através da sua mágica de conversão!”
“É
impossível, Tapassi, não pode acontecer que o chefe de família Upali tenha se
tornado um discípulo do contemplativo Gotama; mas é possível, pode acontecer
que o contemplativo Gotama tenha se tornado um discípulo do chefe de família
Upali.”
Pela
segunda vez ... pela terceira vez o Nigantha Digha Tapassi disse para o
Nigantha Nataputta: “Venerável senhor, pois é muitíssimo verdade que o chefe de
família Upali se tornou um discípulo do contemplativo Gotama ... através da sua
mágica de conversão!”
“É
impossível, Tapassi, não pode acontecer ... pode acontecer que o contemplativo
Gotama tenha se tornado um discípulo do chefe de família Upali. Agora, eu mesmo
irei descobrir se ele se tornou um discípulo do contemplativo Gotama.”
22. Então o
Nigantha Nataputta foi com um grande grupo de Niganthas até a casa do chefe de
família Upali. O porteiro o viu vindo à distância e disse: “Espere, venerável
senhor, não entre. A partir de hoje o chefe de família Upali passou a ser um
discípulo do contemplativo Gotama. Ele fechou a sua porta aos Niganthas e às
Niganthis, e abriu a porta para os bhikkhus, bhikkhunis e discípulos leigos do
Abençoado. Venerável senhor, se você carece de esmolas, espere aqui, eles
trarão as esmolas aqui para você.”
“Bom,
porteiro, vá até o chefe de família Upali e diga: ‘Venerável senhor, o Nigantha
Nataputta está esperando no portão externo com um grande grupo de Niganthas;
ele deseja vê-lo’.”
“Sim,
venerável senhor,” ele respondeu e foi até o chefe de família Upali e disse:
“Venerável senhor, o Nigantha Nataputta está esperando no portão externo com um
grande grupo de Niganthas; ele deseja vê-lo.”
“Nesse
caso, bom porteiro, prepare assentos no salão central.”
“Sim,
venerável senhor,” ele respondeu, e depois de preparar os assentos no salão
central regressou até o chefe de família Upali e disse: “Venerável senhor, os
assentos estão preparados no salão central. Agora é o momento de fazer o que
você julgar adequado.”
23. Então o
chefe de família Upali foi até o salão central e sentou no assento mais
elevado, no melhor, no assento principal, o mais excelente que ali havia. Então
ele disse para o porteiro: “Agora, bom porteiro, vá até o Nigantha Nataputta e diga: ‘Venerável senhor, o chefe de família
Upali diz: “Entre, venerável senhor, se assim desejar”’.”
“Sim,
venerável senhor,” ele respondeu e foi até o Nigantha Nataputta e disse:
“Venerável senhor, o chefe de família Upali diz: ‘Entre, venerável senhor, se
assim desejar’.”
Então, o
Nigantha Nataputta foi com o grande grupo de Niganthas para o salão central.
24.
Anteriormente, quando o chefe de família Upali via o Nigantha Nataputta vindo à
distância, ele costumava sair para encontrá-lo, para, com um manto, tirar o pó
do assento mais elevado, do melhor, do assento principal, o mais excelente que
ali havia, e depois de arrumar tudo à volta deste, faria com que ele ali
sentasse. Mas agora, estando ele mesmo sentado no assento mais elevado, no
melhor, no assento principal, o mais excelente que ali havia, ele disse para o
Nigantha Nataputta: “Venerável senhor, há assentos, sente se assim desejar.”
25. Quando
isso foi dito, o Nigantha Nataputta disse: “Chefe de família, você é um louco,
você é um estúpido. Você saiu dizendo: ‘Venerável senhor, eu irei refutar a
doutrina do contemplativo Gotama,’ e retornou aprisionado na ampla rede de uma
doutrina. Como se um homem fosse castrar alguém e retornasse castrado de ambos
os lados, como se um homem fosse extinguir a visão de alguém e retornasse com a
própria visão extinta; da mesma forma você, chefe de família, saiu
dizendo: ‘Venerável senhor, eu irei
refutar a doutrina do contemplativo Gotama,’ e retornou aprisionado na ampla
rede de uma doutrina. Chefe de família, você foi convertido pelo contemplativo
Gotama através da sua mágica de conversão!”
26.
“Auspiciosa é essa mágica de conversão, venerável senhor, boa é essa mágica de
conversão! Venerável senhor, se os meus
amados pares e parentes fossem convertidos por esta conversão, isso seria para o bem-estar e felicidade dos meus amados
pares e parentes por muito tempo. Se todos os nobres fossem convertidos por
esta conversão, isso seria para o bem-estar e felicidade dos nobres por muito
tempo. Se todos os brâmanes ... todos os comerciantes ... todos os
trabalhadores fossem convertidos por esta conversão, isso seria para o
bem-estar e felicidade dos trabalhadores por muito tempo. Se o mundo com os
seus devas, Maras e Brahmas, esta
população com os seus contemplativos e brâmanes, seus príncipes e o povo fossem
convertidos por esta conversão, isso seria para o bem-estar e felicidade do
mundo por muito tempo. Quanto a isso, venerável senhor, eu explicarei com um
símile pois alguns sábios compreendem o significado de um enunciado através de
um símile.
27.
“Venerável senhor, certa vez havia um brâmane que era velho, idoso,
sobrecarregado pela idade avançada e ele tinha como esposa uma jovem brâmane
que estava grávida e próxima do parto. Então ela disse para ele: ‘Vá, brâmane,
compre um macaco jovem no mercado e traga-o para mim para que seja um
companheiro de brincadeiras para o meu bebê.’ Ele respondeu: ‘Espere, senhora,
até que o bebê tenha nascido. Se você der à luz a um menino, eu irei ao mercado
e comprarei um jovem macaco e trarei para que seja um companheiro de
brincadeiras para o seu menino; mas se você der à luz a uma menina então irei
ao mercado e comprarei uma jovem macaca e trarei para que seja uma companheira
de brincadeiras para a sua menina.’ Pela segunda vez ela fez o mesmo pedido e
recebeu a mesma resposta. Pela terceira vez ela fez o mesmo pedido e recebeu a
mesma resposta. Então, visto que a mente dele estava atada a ela através do
amor, ele foi até o mercado, comprou um jovem macaco e o trouxe para ela
dizendo: ‘Eu comprei este jovem macaco no mercado e o trouxe para que seja um
companheiro de brincadeiras para o seu bebê.’ Então ela disse: ‘Vá, brâmane,
leve este jovem macaco para Rattapani o filho do tintureiro e diga-lhe: “Bom
Rattapani, eu quero que este macaco seja tingido com a cor amarela, golpeado e
re-golpeado e alisado em ambos os lados”.’ Então, visto que a mente dele estava
atada a ela através do amor, ele levou o jovem macaco até Rattapani o filho do tintureiro e lhe disse:
‘Bom Rattapani, eu quero que este macaco seja tingido com a cor amarela,
golpeado e re-golpeado e alisado em ambos os lados.’ Rattapani o filho do
tintureiro disse: ‘Venerável senhor, este jovem macaco aceitará ser tingido mas
não irá aceitar ser golpeado e alisado.’ Da mesma forma, venerável senhor, a
doutrina do tolo Nigantha irá deliciar os tolos mas não os sábios e ela não
resistirá ser golpeada e alisada.
“Então,
venerável senhor, numa outra ocasião aquele brâmane levou algumas peças novas
de vestuário para Rattapani o filho do tintureiro e disse: ‘Bom Rattapani, eu
quero que estas peças novas de vestuário sejam tingidas com a cor amarela,
golpeadas e re-golpeadas e alisadas em ambos os lados.’ Rattapani o filho do
tintureiro lhe disse: ‘Venerável senhor, estas peças novas de vestuário
aceitarão serem tingidas, golpeadas e alisadas.’ Da mesma forma, venerável senhor, a doutrina
do Abençoado, um arahant, perfeitamente iluminado, irá proporcionar deleite aos
sábios mas não aos tolos e ela resistirá ser golpeada e alisada.”
28. “Chefe
de família, a assembléia do rei o conhece assim: ‘O chefe de família Upali é um
discípulo do Nigantha Nataputta.’ Discípulo de quem deveríamos considerá-lo?”
Quando isso
foi dito, o chefe de família Upali levantou do seu assento e arrumando o manto
externo sobre o ombro, juntou as mãos em respeitosa saudação na direção do
Abençoado e disse para o Nigantha Nataputta:
29. “Nesse
caso, venerável senhor, ouça de quem eu sou discípulo:
ele é o Sábio que deixou de lado a delusão,
abandonou as obstruções na mente, vitorioso
em batalha;
ele desconhece a angústia, a mente perfeitamente equilibrada,
a virtude amadurecida, excelente sabedoria;
superou todas as tentações, ele é
imaculado:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
Livre da perplexidade, ele permanece satisfeito,
desdenhando os ganhos mundanos, um receptáculo de felicidade;
um ser humano que realizou a tarefa de um contemplativo,
um homem que padece o seu último corpo;
ele é totalmente inigualável e completamente imaculado:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
Ele está livre da dúvida e tem habilidade,
o disciplinador e líder extraordinário.
ninguém é capaz de exceder as suas esplendorosas qualidades;
sem hesitação, ele é o iluminador;
tendo decepado a presunção, ele é o herói:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
O líder do rebanho, ele não pode ser medido,
a sua profundidade é insondável, ele alcançou o silêncio;
provedor de segurança, possuidor do
conhecimento,
ele permanece no Dhamma, no íntimo contido;
tendo superado todos os grilhões, ele está libertado:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
O imaculado elefante macho, vivendo em isolamento,
com os grilhões estilhaçados, totalmente libertado;
habilidoso nas discussões, imbuído de sabedoria, a sua bandeira
abaixada, ele não tem mais cobiça;
tendo domesticado a si mesmo, ele não mais prolifera:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
O melhor dos videntes, sem
tramas enganosas,
obteve o conhecimento tríplice, alcançou a santidade;
com o coração purificado, um mestre nos discursos,
ele vive sempre tranqüilo, o descobridor do conhecimento;
o primeiro dentre os doadores, ele é sempre capaz:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
Ele é Nobre, com a mente desenvolvida,
que realizou o objetivo e expôs a verdade;
dotado com a atenção plena e o insight penetrante,
ele não se inclina nem para frente nem para trás,
livre de perturbações, com completa maestria:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
Caminhou corretamente e permanece em meditação,
não contaminado no íntimo, perfeito na pureza;
ele é independente e completamente destemido,
vivendo afastado, o ápice conquistado;
tendo ele mesmo atravessado, ele nos guia para a outra margem:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
Com suprema serenidade, com extensa sabedoria,
um homem com grande sabedoria, desprovido de qualquer cobiça:
ele é o Tathagata, ele é o Sublime,
a pessoa incomparável, aquele que não tem igual;
ele é intrépido, proficiente em tudo:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.
Ele decepou o desejo e se tornou o Iluminado,
limpo de todas as nuvens, completamente imaculado;
o mais digno de dádivas, o mais poderoso dos espíritos,
o mais perfeito dentre as pessoas, que está além dos julgamentos;
o maior em grandeza, conquistou o cume da glória:
o Abençoado é ele, e eu sou o seu discípulo.”
30. “Quando
você compôs essa poesia de louvor para o contemplativo Gotama, chefe de
família?”
“Venerável
senhor, suponha que houvesse uma grande pilha com muitos tipos de flores e
então um destro artesão de grinaldas ou o seu aprendiz as amarrassem formando uma grinalda
multicolorida; da mesma forma, venerável senhor, o Abençoado possui muitas
qualidades louváveis, muitas centenas de qualidades louváveis. Quem, venerável
senhor, não louvaria o louvável?”
31. Então, visto que o Nigantha Nataputta foi incapaz de suportar essa
honra feita para o Abençoado, ali mesmo o sangue jorrou da sua boca.
Revisado: 28 Março 2009
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